Jorge Cardoso Teixeira, da ADA - Atelier de Arquitetura, explica ao idealista/news como serão as casas do condomínio Quintinhas, em Vilamoura.

O condomínio Quintinhas, que vai nascer em Vilamoura – 17 dos 24 lotes/terrenos do empreendimento já têm dono, tendo a maioria sido comprados por investidores portugueses –, vai permitir aos futuros proprietários viver em casas passivas (PassivHaus), na sequência de uma parceria entre a Vilamoura World (VW) e a ADA - Atelier de Arquitetura.

Em entrevista ao idealista/news, Jorge Cardoso Teixeira, da ADA, explica ao detalhe que características terão estes imóveis, que “assentam num conceito base de construção ‘eco friendly’”.

Segundo o arquiteto, estão em causa casas sustentáveis e que permitirão reduzir a pegada ecológica.

“Serão as primeiras a ser construídas em escala (ou em série) em Portugal, com um padrão de qualidade construtiva, ambiental e de conforto do mais elevado que existe”, adianta, acrescentando que “o paradigma está a mudar” no país, “com a vaga de consciencialização ambiental das novas gerações”.

“Mas tem sido penoso a implementação deste sistema”, comenta.

“A mensagem das vantagens económicas e ambientais é difícil de passar, pois a falta de exemplos vivos torna difícil em fazer acreditar”, lamenta Jorge Cardoso Teixeira.

“O condomínio Quintinhas vai permitir que os proprietários dos terrenos possam construir as suas casas de sonho”, disse-nos recentemente Rob Jenner, CEO da VW. Como serão estas casas de sonho, do ponto de vista arquitetónico?

Mesmo quando se trata de uma segunda casa o construir uma habitação é sempre um momento que condensa uma série de intenções e aspirações, no fundo se quisermos, de sonhos.

Uma segunda oportunidade para construir uma habitação pode ser a oportunidade para resgatar e ampliar sonhos e projetos de vida que não foram realizados na nossa primeira habitação, do ponto de vista do arquiteto.

Normalmente um cliente quando decide construir a segunda habitação está mais livre de uma série de idiossincrasias, vontades e necessidades, muitas das quais já empenhou na primeira casa, o que permite uma atitude mais experiente, um espaço mais livre, de maior criatividade e de aceitação das propostas arquitetónicas.

O que para nós, arquitetos, nos possibilita uma maior liberdade, pois encaramos normalmente o programa da casa de férias com conceitos e gestos mais arrojados. 

Estas habitações para as Quintinhas de Vilamoura assentam num conceito base de construção ‘eco friendly’, com materiais o mais  sustentáveis possíveis, sendo todo o projeto pensado para minimizar, desde o impacto ambiental do ato da construção, com a redução significativa de desperdícios e produção de lixo de obra, que tanto afeta as nossas construções, à utilização de sistemas modulares de construção seca onde todo o sistema é modelar integrado de madeira. Procurando a minimização das horas de trabalho, está feita a aposta o mais possível no conceito de pré-fabricação ou pré-preparação de obra, integrando o projeto, a gestão e a construção através da norma BIM, evitando-se o mais possível os erros de projeto e falhas de comunicação com a obra. 

Uma última preocupação ambiental será o durante e o pós-vida da construção. Isto é, no momento da sua demolição ou renovação em que os materiais retirados ou demolidos sejam facilmente recicláveis com baixo nível de CO2, conseguindo assim a maior garantia da redução da pegada ecológica de cada um destes edifícios.

Será sempre importante ressalvar que a introdução do procedimento de pré-fabricação ou pré-preparação de obra tem neste caso padrões de elevada qualidade construtiva e de acabamento adequadas a este nível de setor de mercado imobiliário.

Permitindo ainda a edificação da habitação num curto espaço de tempo, seis meses.

Falamos de casas que serão sustentáveis e que permitirão reduzir a pegada ecológica, certo? Fale-nos um pouco sobre este conceito (PassivHaus)?

Sim, sem dúvida, e serão as primeiras a ser construídas em escala (ou em série) em Portugal, com um padrão de qualidade construtiva, ambiental e de conforto do mais elevado que existe. O peso estimado de emissões de CO2 para a construção de uma casa tradicional de 400 metros quadrados (m2) é de 90T, estas terão uma redução aproximada de 50% deste valor. 

O conceito PassivHaus surge no fim da década de 80, início dos anos 90 na Alemanha, em Darmstadt, com o professor universitário Wolfgang Feist, que fundou o Passive House Institute e é cofundador da “International Passive House Association (iPHA)”.

O conceito PassivHaus pode ser resumidamente descrito em três princípios:

O isolamento interior ou (e) exterior da construção de forma a que se permita um completo bloqueio térmico (energético) entre o interior habitável do edifício e a sua envolvente;

Estanquicidade periférica da construção e o tratamento do ar interior, renovando-o a uma velocidade lenta entre 30 a 60m3/h, garantindo a recuperação térmica do mesmo durante as estações frias;

Utilização da estabilidade térmica da terra a mais de dois metros de profundidade como suporte do sistema de geração térmica do edifício, permitindo uma vantagem económica na inversão sazonal da temperatura ambiente.

Podendo, assim, dispensar na totalidade os tradicionais sistemas de aquecimento e arrefecimento dos nossos edifícios.

O primeiro edifício PassivHaus foi feito em Darmstad, em 91/92, e ainda hoje apresenta elevados índices de conforto na qualidade do ar interior e na conservação térmica dos espaços habitáveis.

Existem hoje centenas de edifícios construídos sob as normas PassivHaus, garantindo uma economia efetiva de 70% de energia, quando comparada com uma construção tradicional.

O que equivale a dizer que a fatura energética mensal (gás e eletricidade) de uma família ou de uma empresa é reduzida em 70%.

A acrescentar a isto o facto da qualidade ambiental do ar interior de um edifício PassivHaus ser muito superior à grande maioria dos edifícios existentes.

Em cidades com o ar muito poluído, o ar interior apresenta melhor qualidade que o ar exterior, o que do ponto de vista da saúde publica é determinante na redução das patologias respiratórias e alérgicas.

 

O que distingue, em concreto, estas casas das ditas “tradicionais”?

O sistema construtivo tem normas e procedimentos muito diferentes dos tradicionais.

Do ponto de vista da habitabilidade, como já referido, estas casas oferecem uma economia real de 70% na fatura energética e um conforto interior únicos, pela estabilidade térmica em todo o espaço interior e pela qualidade do ar. 

As temperaturas interiores entre verão e inverno podem oscilar sem ajuda suplementar ao sistema entre 22 ºC a 25ºC e 21 ºC a 23 ºC, respetivamente, para esta zona climática do Algarve. 

Os proprietários podem e/ou têm autonomia para decidir sobre determinados aspetos relacionados com a construção da casa? 

Sim.

O programa funcional e vivencial em nada interfere com o sistema Passivhaus e as futuras certificações ambientais que se preveem para estas construções, pelo que os proprietários podem e devem dialogar com os arquitetos sobre os seus sonhos e desejos, sobre a forma e modos de habitar da futura casa. 

Um cliente que procura este tipo de habitação deverá estar à partida sensibilizado para as questões ambientais e comungar desta consciência ecológica global, pelo que não faz sentido pretender o uso de materiais não renováveis, ou com elevado índice de CO2, na construção da casa. 

Terão sempre autonomia na definição conjunta com a equipa de arquitetos no vastíssimo uso de materiais e soluções espaciais que se enquadrem dentro dos parâmetros ambientais e da conservação térmica do edifício.

Que desafios arquitetónicos existem na construção de uma casa passiva num condomínio de luxo como será o Quintinhas?

O maior desafio arquitetónico é, sem dúvida, formar e alterar todos os procedimentos e métodos construtivos dos intervenientes na construção da habitação, ou do edifício em causa. A metodologia de construção de uma PassivHaus é significativamente diferente na aplicação dos sistemas construtivos comparativamente com a construção tradicional.

É possível afirmar que as casas que vão nascer no condomínio Quintinhas serão únicas/exclusivas a nível nacional?

Sim, é possível afirmar essa singularidade pelo simples facto de serem construídas num sistema misto de betão armado (ao nível da laje térrea) e num sistema modular integrado de madeira.

Pelo facto de terem a certificação PassivHaus e as duas outras certificações Ambientais, a Europeia BREAM e a Americana LEED. 

São ainda únicas porque ao economizarem 70% de energia disponibilizam um conforto interior único pela qualidade do ar interior que se respira, algo que só se entende verdadeiramente quando se tem a possibilidade de habitar por algum tempo uma casa destas. Únicas são, também, pelo ‘Genius Loci’ (espírito do lugar) em que se encontram: Vilamoura.

Quanto pode custar a um proprietário construir uma casa passiva no condomínio Quintinhas?

Esta é uma pergunta para o promotor do empreendimento, como arquiteto não tenho meios de aferir um valor certo, mas o que posso dizer é que uma casa PassivHaus tem em média um agravamento de custos de 5% a 7% comparativamente com a construção corrente atual. Poderei ainda dizer que uma construção em sistema modular de madeira com uma longevidade garantida de excelente qualidade de 60 anos e com as certificações ambientais referidas é atualmente mais cara/despendiosa que a construção tradicional.

Neste caso estamos a falar de habitações de luxo que terão seguramente valores acima da média das habitações tradicionais.

O facto de ser uma PassivHaus e economizar 70% da energia necessária e permitir um conforto ímpar de habitabilidade possibilita uma amortização direta do investimento inicial ao longo da vida útil da habitação.

Uma habitação tradicional com 400 m2 consome em média em despesas de conforto térmico cerca de 2.500 a 3.000 euros por ano, em gás e electricidade.

Com uma PassivHaus pode poupar-se cerca de 1.750 euros a 2.100 euros por ano, possibilitando amortizar em 10 anos o investimento suplementar no sistema PassivHaus.

Como tem evoluído a construção de casas passivas em Portugal?

É um modelo que tem tido muita adesão? Porquê?

Em Portugal o paradigma está a mudar com esta vaga de consciencialização ambiental das novas gerações, mas tem sido penoso a implementação deste sistema.

Por vários motivos, muitas vezes as pessoas têm medo de arriscar em algo que é novidade, muito mais quando se trata das suas próprias casas, pois são o investimento de uma vida.

A mensagem das vantagens económicas e ambientais é difícil de passar, pois a falta de exemplos vivos torna difícil em fazer acreditar, e aqui tento que os meus clientes novos visitem as casas dos meus clientes PassivHaus, mas mesmo assim é por vezes difícil convencer.

E depois há também clientes que tem muita dificuldade financeira no investimento que vão fazer, por isso tentam economizar logo de início em tudo.

Como não existem incentivos fiscais para a implementação deste sistema e financiamento bonificado, tudo se torna mais difícil.

Se as entidades públicas apostassem, como se passa na Alemanha, Áustria e outros países europeus, em construir edifícios públicos com este sistema criando referenciação e credibilidade do mercado da construção do sistema PassivHaus, a realidade provavelmente seria outra. 

As últimas remodelações feitas pela Parque Escolar nas nossas escolas, se tivessem seguido esta norma, teriam ficado mais económicas e mais eficientes, pois este sistema aplicado em escala consegue ser mais económico do que na pequena habitação, mais eficiente e muito mais económico na manutenção dos sistemas de renovação de ar. 

Agora, com a pandemia, seria dispensável as crianças estarem com as janelas abertas das salas para ventilarem, com todo o desconforto térmico que daqui advém.

Falando da minha experiência profissional, fiz a primeira formação sobre PassivHaus em Namur, na Bélgica, em 2006, com a equipa do professor Wolfgang Feist.

Desde então tenho tentado seduzir os meus clientes para construírem as suas casas com este processo, mas apesar de empenhado num espírito de missão consegui apenas nos últimos 14 anos projetar 20 habitações, das quais unicamente quatro foram construídas dentro do conceito PassivHaus.

O que considero uma taxa muito baixa para a contrapartida ambiental e económica deste sistema. 

Na verdade, o pequeno aumento de custo a que obriga este novo processo construtivo tem sido o grande obstáculo, mesmo quando se está posicionado numa faixa de mercado de clientes de classe média, média alta.

Contudo esta realidade está a mudar, pois tenho em fase de projeto três novos clientes no norte do país já a pedirem o sistema PassivHaus.

Noutros setores de mercado temos um hotel em fase de projeto, que será o primeiro PassivHaus Hotel do mundo, e uma escola primária.

Em termos internacionais, onde há boas experiências que servem de inspiração para este conceito?

Sobretudo na Alemanha e Áustria, com edifícios de apartamentos, um hospital em Frankfurt, edifícios de escritórios em Viena.

Em Espanha, França e Itália com vários edifícios, desde de serviços, escolas, habitação coletiva e unifamiliar.

A implementação deste sistema é uma inevitabilidade e a Áustria e a Alemanha preparam-se para alterar a sua legislação que regulamenta a conservação térmica dos edifícios, pela introdução deste sistema.

Não tardará que as normas europeias se encaminhem no mesmo sentido, espero que nos próximos dez anos esta realidade seja possível.

Por: Idealista