A sustentabilidade da construção já não é apenas bandeira, mas sim uma necessidade e uma condição para se fazerem mais e melhores negócios.

Numa altura em que as questões ambientais e a pegada ecológica estão cada vez mais presentes na vida das pessoas e das empresas, a sustentabilidade assume-se como fator decisivo, também, na construção e imobiliário.

 Querem-se projetos energeticamente mais eficientes e construções de melhor qualidade – e em alguns casos estes requisitos já não são apenas uma necessidade, mas uma condição para o negócio.

 A pandemia veio acelerar estes desafios, com evidência na procura de casas com áreas exteriores e interiores maiores, e numa nova realidade em que os espaços verdes e ao ar livre se tornaram no “santo graal” dos tempos de confinamento.

Como é que as empresas estão a responder a estes desafios?

Qual a importância da sustentabilidade nos projetos imobiliários? E como é que o setor se está a adaptar às mudanças?

 O terceiro webinar TEKSIL 2020, promovido pela Tektónica – Feira Internacional de Construção e Obras Públicas e pelo Salão Imobiliário de Portugal (SIL), realizado esta terça-feira, dia 30 de junho de 2020, e dedicado ao tema “A Construção e Imobiliário Verde e Sustentável”, juntou vários players do setor para discutir estas e outras questões, contando com o apoio do idealista/news.pt.

Para João Madeira, diretor de ativos imobiliários da Sonae Capital, o setor imobiliário “já tem dentro do seu ADN o vetor sustentabilidade” que, relembra, é mais do que a perceção do ambiente, mas que comporta dois pilares igualmente importantes: o social e o económico. Garante que os clientes procuram, cada vez mais, projetos com estas características – isto é, com garantias de responsabilidade ambiental  -, tendo-as, de resto, como um dado adquirido.

Na península de Tróia, na margem do sul do Tejo, por exemplo, onde a Sonae tem um vasto conjunto de projetos imobiliários, já se sentem os efeitos da pandemia - e neste caso de "forma positiva", segundo o responsável.

João Madeira adianta que, durante os tempos de confinamento, descobriram-se “novas formas de viver” e muitas famílias decidiram mudar-se para as casas que têm naquela zona e que só eram utilizadas para férias, frisando o generalizado aumento da procura de moradias e valorização de espaços exteriores.

 “No nosso caso não fomos penalizados ao contrário de outros destinos, até porque Tróia tem uma característica importante, que é o facto dos clientes serem portugueses”, refere.

Este novo padrão de procura deve ser visto, segundo o próprio, como uma oportunidade para a própria banca, nomeadamente ao nível de ferramentas e produtos financeiros associados à sustentabilidade, e que podem ser canalizados para o financiamento de segunda habitação nestas zonas.

Considera, porém, que em termos de sustentabilidade da construção ainda é preciso “ir mais além”, nomeadamente ao nível dos regulamentos municipais e licenciamentos, que “têm também de olhar para essas mudanças”.

Não faz sentido, na sua opinião, que os licenciamentos obrigem, desde há anos, a um mesmo número de lugares de estacionamento em determinado projeto, quando “a sociedade está a mudar, as pessoas têm menos carros e se impões as novas questões de mobilidade”.

Sustentabilidade desde o momento “zero”

Mas como é que, na prática, se pode garantir que um projeto é sustentável?

O gestor volta a dar o exemplo de Tróia em que, por exemplo, aquando da demolição das duas torres, no início do projeto, 95% dos materiais foram aproveitados na nova construção.

Na prática, o vetor sustentabilidade tem de estar presente desde o início da promoção imobiliária, “através das certificações atribuídas, dos materiais e equipamentos utilizados”, tal como explica também Sandro Oliveira, CEO da InvestCo - que tem em desenvolvimento, no Porto, o Jardins da Efanor, um dos maiores projetos atualmente em curso no país.

Segundo o responsável, o “passo” da sustentabilidade tem de ser dado num momento muito embrionário do projeto, na fase de arquitetura, projetista, e que “esse pensamento tem de ser transveral, numa vertente estética, de mobilidade, custo, e construção”, de formas a dar garantias aos clientes sobre o produto habitacional que estão a comprar.

E qual é a disponibilidade das pessoas para pagarem este extra?

“A sustentabilidade parece-me um dado adquirido.

A lei exige essa sustentabilidade e os projetos nao sairão mais caros por isso, mas por algo mais que garanta essa sustentabilidade, nomeadamente, por exemplo, pelos recursos de inovação que, em si, poderão ser fatores diferenciadores” refere Sandro Oliveira.

“Neste momento não é um fator de preço, mas uma condição de negócio”, garante o responsável, adiantando que a sustentabilidade e certificações já são pressupostos fundamentais para o investimento em determinado projeto.

 Saber o impacto final na “carteira” de quem compra – nas faturas da água, da luz ou do gás – é igualmente importante: “isso é um ponto crítico e uma mensagem que deve ser passada, numa perspetiva de longo prazo”, indica.

Uma opinião partilhada por Alda Filipe, diretora de marketing da Kronos Homes, para quem a certificação e requisitos de sustentabilidade são, de facto, determinantes.

“O tema da sustentabilidade tem de ser pensado logo no momento zero.

Na Kronos isso já é um ponto de partida, uma filosofia, uma vez que para muitos clientes essa relação com a natureza é fundamental nas suas decisões de investimento. 

Um projeto é pensado desde o início até na escolha do arquiteto”, garante.

Dá o exemplo do projeto de Palmares, no Algarve, junto ao mar, e com uma baixa densidade de construção, que conta com a certificação BREEAM®, na qual a escolha da equipa de arquitetos – neste caso, o estúdio RCR, vencedores do prémio Pritzker de arquitetura em 2017 - foi muito importante, dada a integração na natureza.

“Quando o cliente percebe que há essa preocupação, ele próprio se sente envolvido. É muito importante desde o início, na arquitetura, no projeto, na própria construção, em obra, e depois no final, no desempenho dos próprios edifícios”, salienta.

A responsável salienta a ideia de que “não basta dizer que somos sutentáveis” e que é “necessário comprová-lo”.

O público estrangeiro, garante, foi desde sempre muito sensível a esta temática, e adianta que os portugueses caminham, cada vez mais, nesse sentido.

A construção e o desafio da sustentabilidade

Este setor foi um dos que não parou a sua atividade durante a pandemia, e desempenha um papel fundamental na resposta aos desafios da sustentabilidade - além da importância que tem para a economia nacional.

Para Luca Sacripanti, diretor de marketing e comunicação da MAPEI Portugal, os materiais são uma “parte extremamente importante para se conseguir uma construção sustentável”.

“São os produtos que permitem que a própria construção seja amiga do ambiente.

Soluções como isolamento térmico, coberturas ajardinadas, a utilização de produtos com emissões baixas ou nulas de compostos orgânicos voláteis”, refere, adiantando que há produtos aplicados que podem libertar substâncias nocivas durante anos.  

Acredita que a indústria portuguesa tem, de resto, condições para apresentar uma construção mais sustentável.

“Construir de forma sustentável pode ser mais caro à partida, mas é um investimento a longo prazo, gerando poupanças no futuro.

É uma questão conceptual e não tanto de dinheiro”, refere Luca Sacripanti.

Coberturas verdes: o futuro dos edifícios e cidades?

Os tempos de confinamento colocaram em evidência as necessidades de mais espaços verdes e ao livre, sobretudo nas zonas urbanas, na maioria das quais ainda há falta de locais como estes.

Uma oportunidade, por exemplo, para o universo das coberturas verdes, uma solução que não é nova, mas que ainda pode ser mais explorada.

Para Ana Mesquita, da Associação Nacional de Coberturas Verdes (ANCV), “o futuro das cidades e dos edifícios deve passar pela incorporação da vegetação nos seus projetos”.

Dá como exemplos emblemáticos, em Portugal, os jardins da Gulbenkian, na capital, e a Praça de Lisboa, no Porto - esta última mudou radicalmente toda aquela zona, antes degradada, e que agora reabilitada “está sempre cheia de gente”, acabando por funcionar como zona de fruição e lazer.

A ANCV lançou já este ano um Guia Técnico que define linhas orientadoras para a implementação destas estruturas que, segundo Ana Mesquita, podem e devem ser potencializadas, seguindo as regras, para que estas sejam implementadas em segurança.

“Eu não acredito que a sociedade vai ter uma epifania e ser toda sustentável.

Mas acredito que as pessoas tiveram oportunidade [durante a pandemia] de olhar para as suas casas de forma diferente e perceber que têm necessidade de mais espaços verdes e ao livre nas suas vidas”, frisa Ana Mesquita, reconhecendo, apesar disso, que esta nova realidade veio acelerar o processo, até ao nível da valorização das coberturas e deste tipo de espaços, abrindo caminho a mais oportunidades ao setor imobiliário, ao mesmo tempo, que se garante um mundo mais sustentável.

Por: Idealista