Por Dr. Tiago Santos, Advogado | tiago.santos@martinezechevarria.com

O ano de 2018, ficou, à semelhança dos últimos, marcado por mais uma série de processos judiciais mediáticos e com grande impacto na Sociedade Portuguesa. Foram centenas de chamadas à capa de jornais, abertura de telejornais, incontáveis horas de debate nas televisões e diretos.

Ao contrário da perceção, maioritária, existente na Sociedade Portuguesa, o Processo Penal é, sob pena de nulidade, público. A fundamentação doutrinária para tal é, sucintamente, a da necessidade de existência de garantias – dos intervenientes processuais, do próprio tribunal e da comunidade. Pretende-se que, com um processo público, qualquer julgamento ou decisão seja justa, imparcial, equitativa e clara aos olhos de todos.

Disto isto, vezes há que, ou por determinação do Tribunal ou a requerimento de um dos intervenientes processuais, o processo seja, durante a sua fase de inquérito, sujeito, ao famoso, segredo de justiça. Na motivação doutrinária do segredo de justiça estão i) a necessidades inerentes à investigação; ii) a proteção da magistratura – que em processos com grande impacto mediático pode sofrer pressão da opinião pública; iii) garantir a reserva da vida privada dos arguidos que, até transito em julgado de decisão condenatória proferida pelo tribunal, se presumem inocentes. Conforme o nº 8 do artigo 86º do C.P.P. “O segredo de justiça vincula todos os sujeitos e participantes processuais, bem como as pessoas que, por qualquer título, tiverem tomado contacto com o processo ou conhecimento de elementos a ele pertencentes, e implica as proibições de a) assistência à prática ou tomada de conhecimento do conteúdo de acto processual a que não tenham o direito ou o dever de assistir; b) Divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus termos, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação.”

Ao arrepio da lei, temos vindo a assistir, nos últimos anos, a uma constante e reiterada violação do segredo de justiça. E ninguém parece importar-se com tal fenómeno.

Porém, estou em crer, assistimos nas últimas semanas ao ultrapassar de todos os limites com a divulgação, em horário nobre, de excertos de gravações (!!) de interrogatórios realizados no âmbito de processos judiciais. A par de processos judiciais, pendentes nos Tribunais, têm sido realizados verdadeiros julgamentos em praça pública. Sem qualquer defesa, garantia ou proteção dos visados. A informação é servida a “conta-gotas”, ao longo dos dias, criteriosamente selecionada consoante os interesses. E com total desprezo pelos direitos, liberdades e garantias, em especial, dos arguidos.

Um verdadeiro Estado de Direito Democrático não pode permitir que tais julgamentos continuem a acontecer com a violação de direitos fundamentais dos seus cidadãos.