Entrevista | Telmo Pinto, Presidente da Junta de Freguesia de Quarteira

14:23 - 11/07/2020 ENTREVISTAS
Telmo Pinto, Presidente da Junta de Freguesia de Quarteira, conta-nos como tem sido este tempo de pandemia vivido na Cidade de Quarteira e pelas gentes que nela residem. Mostra-se positivo e com esperança para um futuro que está para vir, mas pede cautela e respeito por parte de todos os cidadãos.

A Voz do Algarve: Como Presidente da Junta de Freguesia, qual o balanço que faz dos efeitos que o COVID-19 provocou na Cidade de Quarteira?

Telmo Pinto: Eu acho que correu bem. No entanto, temos de perceber qual é a diferença entre a capacidade de uma Junta de Freguesia e de uma Câmara Municipal, que não tem comparação. 

Dentro daquilo que foi o trabalho que nós fazemos localmente, correu muito bem. Isto é, falando do trabalho que fizemos, o apoio que demos e a articulação que criamos com pessoas que quiseram ajudar, bem como, o trabalho que fizemos com a Fundação António Aleixo que não trabalhou apenas nesta época do Covid-19, mas trabalha o ano inteiro.

O trabalho conjunto que fizemos com o Centro Paroquial. Tudo isso foi muito importante para nós, que nunca parámos. O meu executivo e eu, trabalhamos por grupos, uma semana vinha um grupo e na seguinte outro. Relativamente à alimentação, fizemos protocolos com o Banco Alimentar. Houve um trabalho de proximidade, quer seja a entregar comida que ainda hoje fazemos, bem como, a tratar de documentos, por exemplo as reformas, atestados de vida, entre outros. Nunca fechamos a porta, apesar de não ter sido um atendimento presencial. Conseguimos articular com todos, para que os serviços não parassem e para que pudéssemos ajudar as pessoas de risco, para que essas, ainda mais que as outras, se mantivessem em casa, em confinamento.

Muitas pessoas que cá veem e mesmo governantes do nosso país, conhecem o Algarve em agosto e por isso é difícil preverem o que vamos passar no inverno.

VA: Qual o impacto económico e quais as previsões para o próximo ano?

TP: Nós queremos ser positivos, mas a verdade é que o impacto foi bastante grande, estamos a falar do início de uma época balnear, de turismo e da sazonalidade. Sazonalidade essa que sentimos aqui no Algarve com forte impacto. Muitas pessoas que cá veem e mesmo governantes do nosso país, conhecem o Algarve em agosto e por isso é difícil preverem o que vamos passar no inverno. O que vai acontecer é que vamos viver três invernos seguidos, o inverno que é sinónimo de um Algarve deserto, depois um verão que vai “ter sabor” a inverno e mais um inverno propriamente dito. Por isso vamos ter consequências muito graves, mesmo nas famílias, apesar de já as termos tido até agora, penso que ainda se vai acentuar. Para além disso, faltou ao nosso País um bom projeto de comunicação lá fora. Eu não acredito que nós passámos de ser uma referência a nível mundial, para sermos agora os “os maus da fita”. Claro que o meu objetivo com isto não é que se falsifiquem dados, mas sim o facto de existir muita desinformação vinda do exterior. Penso que o principal deveria ter sido antecipar as situações, reagir às situações todos reagimos, mas antecipar esta comunicação, devia ter sido prevista e não foi. Compreendo que outras zonas do país não vivem dos estrangeiros como o Algarve vive, mas perdemos o “timing” para a comunicação.

VA: Qual o impacto no comercio local e como estão a reagir os comerciantes a esta situação?

TP: O impacto é péssimo. As pessoas falam dos números em comparação aos anos passados e os valores são devastadores. Contudo, acho que o mais importante agora, será esperar até ao final do verão para fazer um novo balanço. Só em setembro é que o Algarve vai conseguir dizer quais foram as repercussões do Covid, naquela que é a época de trabalho forte do Algarve. Relativamente aos comerciantes, tem sido muito difícil, os pequenos e médios comerciantes, não tem capacidade financeira, nem liquidez que lhes dê suporte para aguentar estes meses, mais os meses que aí vem de inverno. Eu não quero fazer previsões e os dados que temos mostram-nos um futuro muito pouco risonho, mas eu quero ser otimista e acreditar que ainda durante este mês de julho e agosto, não recuperando aquilo que tivemos noutros anos, mas que consigamos colmatar algumas dificuldades que estamos a passar.

VA: Que medidas foram tomadas para combater a pandemia até hoje? E quais as medidas que irão tomar no futuro?

TP: As medidas, como já disse, foram de apoios familiares. Nós comunicámos e fomos positivos nessa comunicação, todavia, somos uma autarquia muito pequena e com pouca capacidade de ação. O que nós queremos é dar respostas de proximidade às famílias e promover a segurança e higiene através de sensibilizações. Infelizmente os exemplos daquilo que se passou em Lagos e em Lisboa, não abonam a nosso favor e dá-se um aproveitamento dessas situações para que aconteça a desinformação como falei há pouco.

Outro exemplo relativamente às medidas, foi o facto de já termos ido ao mercado da fruta para responsabilizar as pessoas para algumas ações da nossa competência e outras que não são, tentando arranjar meios para as corrigir. Para além disso, temos de os respeitar. A nossa liberdade vai até ao limite da liberdade de outras pessoas e temos de ter uma responsabilidade nesta fase do Covid.

Com o tempo, as pessoas vão conseguir fazer a sua própria higienização, vão tendo a sua máscara e vão-se habituar a utiliza-la. Em relação a medidas futuras, temos tentado manter as que já existem e dar respostas a novas situações que vão surgindo. Estamos também a acompanhar a Câmara Municipal de Loulé em medidas que vão tomando, naquilo que são as nossas capacidades. Por exemplo, já recebi chamadas a propósito de esplanadas, reduzindo o número de utilizadores no interior, sentiu-se a necessidade de arranjar alternativas no exterior, para combater essas necessidades.

O que vai acontecer é que vamos viver três invernos seguidos, o inverno que é sinónimo de um Algarve deserto, depois um verão que vai “ter sabor” a inverno e mais um inverno propriamente dito.

VA: Sabemos que a Junta de Freguesia de Quarteira, com o objetivo de combater o Covid-19, criou a ação “Quarteira Presente”, falo-nos um pouco sobre esse projeto.

TP: O “Quarteira Presente” é o conjunto de todas estas iniciativas que tomamos, bem como o apoio de pessoas que nos ajudaram nesse projeto. Os funcionários da Junta de Freguesia e os serviços que temos foram muito importantes, porque nunca “voltaram a cara” e estiveram sempre presentes, assim como, um conjunto de voluntários que trabalham connosco, noutros projetos e que abraçaram esta causa e fizeram máscaras para distribuir.

Não conseguimos responder a todos os pedidos, mas fizemos mais de 6.000 máscaras. Foram um enorme número de pessoas a trabalhar para que as coisas acontecessem. O “Quarteira Presente” foi tudo isto, no fundo foi a presença destes grupos, em que nós criamos a rede, não só a Junta de Freguesia, mas todos aqueles que a apoiam, bem como a sociedade.

Várias famílias fizeram viseiras, mas não sabiam como as distribuir, então falaram com a Junta, que é a entidade em quem tem mais confiança, e nós distribuímos pelas entidades, como a GNR, o Centro Paroquial, o Lar de Repouso e Infantários. Houve um trabalho em rede para a comunidade que foi muito importante, e até grupos particulares a contribuir, como é o caso das Mãozinhas Solidárias que não é constituída como uma instituição registada, mas fazem um trabalho excelente perto das famílias e comunidade.

VA: Este ano, Quarteira não teve as habituais marchas. Como sentiu a recetividade por parte da população relativamente a essa decisão?

TP: As marchas, são o maior evento cultural de Quarteira, eram os 50 anos das marchas e foi com muita pena que não se realizou. O que estamos a fazer, é pensar já no que vai haver para o ano. Contudo, acho que as pessoas estão focadas em ultrapassar este problema, sentindo este dissabor de não ter marchas este ano, mas pensando no futuro. Fizemos online, as pessoas puderam contribuir e participar através das plataformas virtuais recordando memórias. Agora é o foco no futuro e no ano que aí vem.

VA: Como se sabe uma funcionária da Fundação António Aleixo, testou positivo para a Covid-19, quais foram as medidas tomadas a seguir?

TP: Sabemos sim que a funcionária estava infetada, mas também sei que ninguém da fundação ficou contaminado, nem a família da própria pessoa. Quarteira e o Concelho de Loulé tem estado mais ou menos controlados. Tivemos o foco do Lar de Boliqueime mas há um trabalho que tem sido feito pelas autoridades, quer seja de fiscalização como de acompanhamento das pessoas que estão infetadas. Quarteira e o Concelho, tem estado de parabéns até ao momento. 

VA: Tendo em conta casos pontuais de incumprimentos das medidas para o combate ao COVID-19 nos mercados, que medidas tomou ou tenciona tomar para evitar essa situação?

TP: Nós tivemos logo no início medidas de sensibilização e utilização do próprio espaço. No mercado do peixe e da fruta, fizemos uma entrada e uma saída para não haver cruzamento de pessoas nos corredores, higienização às entradas, obrigando a todos os vendedores e compradores ao uso de máscara. Portanto, não é fácil as pessoas cumprirem. Já tomamos mais medidas, neste momento só podem entrar quinze pessoas nos recintos, pedimos que façam encomendas, que não vão com as suas famílias, que fiquem à espera cá fora. Depois disso, tivemos de tomar medidas mais drásticas de higiene, e após várias queixas relativamente a vendedores que não cumpriam com as instruções, ou seja nenhum vendedor pode vender produtos a alguém que não tenha máscara ou viseira que é o que diz a lei, tivemos de sancionar, três vendedores não cumpriram e que foram apanhados em “flagrante delito”. O que fizemos foi suspender a sua venda no mercado, na semana seguinte. Isto tudo para que, mesmo aqueles que se dirigem ao mercado e não cumprem, serão obrigados pela própria venda a cumprir. A higiene e segurança, são muito importantes, isto para combater os ajuntamentos.

VA: Relativamente ao Mercado que acontece todos os anos no verão, já estão a montar as bancadas, quais as medidas que pensam tomar?

TP: As medidas são mais ou menos as mesmas que nos mercados e sei que a Câmara de Loulé tem falado com a Delegada de Saúde, aliás, como tem feito em todos os outros projetos. O importante é perceber quais são os conselhos da Delegada de Saúde, que se cumpram afastamentos e que se sensibilizem os vendedores da mesma forma. Isto tudo para que a economia não pare, não podemos ter duas mortes, é uma palavra pesada, mas as pessoas têm de ter isto em mente, não podemos ter a morte da doença e a morte da economia em simultâneo, ou seja, deve haver um equilíbrio. O facto de existirem locais com mais dinâmica pode fazer com que as pessoas dispersem um pouco. O básico claro, será as máscaras, afastamento e higienização que estará presente nesta iniciativa também. Neste ano não vai haver música como se fosse um concerto, mas vamos tentar que haja música para apoiar a cultura, isto, porque os artistas não têm contratos anuais com entidades, tem os seus recibos verdes e os hotéis por exemplo cortaram com esses “contratos de verão”.

Penso que o principal deveria ter sido antecipar as situações, reagir às situações todos reagimos, mas antecipar esta comunicação, devia ter sido prevista e não foi.

VA: Que mensagem quer deixar à Comunidade quarteirense nestes tempos difíceis de luta contra o Covid?

TP: O principal que gostava de pedir é para terem muita responsabilidade. Não quero assustar as pessoas, mas há uma grande parte da população que não tem sintomas, ou seja, que são assintomáticos e por isso devemos ter cuidados. É importante referir que existem dois tipos de responsabilidades, as pessoas, tanto jovens como a população mais fragilizada e a economia. Isto terá de ser um equilíbrio e esse equilíbrio existe na vida em tudo aquilo que fazemos. Portanto, dizer que somos responsáveis em todos este processo e temos como exemplos a forma negligente que muitos tem tratado esta pandemia. Nós precisamos de tudo equilibrado e a funcionar, não é só uma responsabilidade da PSP, da GNR, da Direção Geral de Saúde, das Autarquias, é uma responsabilidade de todos.

 

Por: Carolina Figueiras