Entrevista | João Fernandes - Presidente da Região de Turismo do Algarve

09:28 - 12/09/2020 ENTREVISTAS
«Somos um destino preparado para acolher todos os visitantes em segurança»

O Governo Britânico incluiu Portugal nos corredores aéreos no passado dia 20 de agosto. Tendo em conta estes dados, a Voz do Algarve entrevistou João Fernandes, Presidente da Região de Turismo do Algarve.

«A Voz do Algarve» - Com a abertura do corredor no dia 20 de agosto, que impacto é que o acréscimo no número de visitantes terá ao nível sanitário? O aumento do número de turistas poderá originar mais casos na região?

João Fernandes - Após uma presença ainda assim expressiva de turistas nos últimos meses, o Algarve apenas registou 1,9% dos casos de Covid-19 e os surtos ocorridos, não foram resultantes de atividades turísticas, tendo sido debelados de forma exemplar. O Algarve é um destino seguro. Recordo que o Turismo do Algarve desenvolveu um “Manual de Boas Práticas”, pioneiro a nível nacional, criado para orientar a atuação dos diferentes agentes de turismo na região, englobando rent-a-car, golfes, parques de campismo, marinas, praias, surf, parques aquáticos e restaurantes, além do alojamento turístico, agências de viagens e empresas de animação turística. Estivemos também na linha da frente, na implementação de planos de contingência e de protocolos sanitários nas empresas e fomos ainda das primeiras regiões europeias a abrir a época balnear, com todas as condições de segurança.

Foi um trabalho conjunto e necessário, para reforçar a segurança do destino e a confiança de turistas, trabalhadores do setor e residentes. Nesta medida, devo ainda acrescentar que neste momento, existem mais de 4700 empresas na região aderentes ao selo Clean&Safe.

Por tudo isto, somos um destino preparado para acolher todos os visitantes em segurança, e perante um contexto que ainda é incerto continuamos a adaptar-nos e a reajustar os procedimentos face à evolução da pandemia e às medidas e recomendações do Governo, da Direção-Geral de Saúde e das demais entidades competentes.

Contudo, é também fundamental que cada pessoa, residente ou turista, cumpra com as medidas excecionais para evitar a propagação do vírus e ajude a garantir a segurança e o bem-estar de todos.

 

VA -  Que campanhas foram e estão a ser desenvolvidas na região para afirmar o Algarve como destino seguro?

JF - Antes de mais, trabalhámos para garantir que o Algarve é, de facto, um destino onde se pode gozar férias com tranquilidade e no estrito cumprimento das normas de proteção de saúde pública. Uma vez assegurada esta condição, o Turismo do Algarve desenvolveu uma estratégia de comunicação integrada, institucional e promocional, assente num conjunto de dinâmicas de comunicação online e offline dirigidas aos turistas nacionais e estrangeiros, mas também aos profissionais do setor turístico.

Para o mercado interno, implementámos campanhas específicas para promoção da região. A primeira, “Lembra-te de mim. Algarve” foi lançada no final de março nas redes sociais. Estávamos em plena época de confinamento e o objetivo foi manter o destino no top of mind dos turistas portugueses, apelando ao regresso ao seu destino de férias predileto, assim que estivessem reunidas todas as condições de segurança.

Já em junho lançámos a segunda campanha, “O Algarve fica-te bem”, numa altura em que muitos portugueses entravam em época de férias de verão e em que o Algarve é, por norma, a escolha para uns dias de descanso.

Em paralelo, promovemos eventos de transmissão exclusiva online, permitindo que todos pudessem acompanhar e viver a animação cultural do Algarve nas mais diversas plataformas streaming, a partir de qualquer parte do mundo. Tal foi o caso do “Sagres Sunset Shots”, organizado em parceria com o Município de Vila do Bispo de 14 a 16 de agosto e do “Albufeira Summer Live”, uma série de quatro atuações online em julho e agosto, em parceria com o Município de Albufeira.

Já com foco nos mercados externos, intensificámos a criação de parcerias com algumas das principais companhias aéreas europeias, que voam para a região. British Airways, Eurowings, Ryanair, EasyJet, AirFrance e Edelweiss são algumas companhias que estão a colaborar com o Turismo do Algarve na criação de campanhas de marketing conjuntas para potenciar reservas de estadas na região ainda durante 2020. Assentes numa estratégia de divulgação multiplataforma, que combina canais digitais e impressos criteriosamente selecionados em alguns dos principais mercados (Reino Unido, Irlanda, Alemanha, França, Itália e Suíça), estas ações visam promover o Algarve como destino seguro e colocam em destaque a diversidade de experiências que a região tem para oferecer.

Avançámos também com uma forte ação de comunicação junto do Reino Unido, através de uma parceria com o canal de televisão Channel 5, que vai transmitir até ao final de outubro um vídeo promocional da região que resultará numa exposição de 175 mil visualizações semanais. Este vídeo promove a notoriedade do Algarve, enquanto destino seguro e possibilita aos espectadores participarem num sorteio para ganharem uma estada de 7 noites, na região para duas pessoas, num hotel de cinco estrelas.

 

VA -  Que eventos estão programados a partir de setembro?

JF - Destaco desde logo os três eventos de grande dimensão desportiva que vão marcar os próximos meses. Em setembro, realiza-se o Portugal Masters, que será o expoente máximo para os apreciadores de golfe, uma modalidade que encontra neste período do ano a sua época alta na região. Em outubro decorre o MotoGP e em novembro a Fórmula 1, ambas as provas no Autódromo Internacional do Algarve. Em novembro, a Taça das Nações em hipismo (Hipódromo de Vilamoura), uma prova que culmina um calendário de sucessivas provas desta modalidade e que fará passar pelo Algarve mais de 1500 cavalos e respetivas equipas.

O facto de a etapa final do MotoGP acontecer na região, num circuito que poderá ditar o futuro campeão e onde estará presente o Miguel Oliveira, será um fator acrescido de emoção para os portugueses e amantes do motociclismo. Estão já milhares de bilhetes vendidos para ambas as provas no circuito do AIA, o que se traduz no aumento das visitas ao Algarve e na retoma da atividade turística na região, pela notoriedade que os eventos de escala mundial conferem ao destino.

Durante os próximos meses mantemos também o programa cultural “365 Algarve” que este ano, excecionalmente devido à pandemia, se prolongou um pouco mais no tempo, com um vasto conjunto de iniciativas que vão desde o cinema e a literatura, ao teatro, às artes visuais e aos piqueniques de charme, em formatos que respeitam as normas de segurança impostas pela Direção-geral de Saúde e que privilegiam os espaços ao ar livre. Aconselho a que consultem o site, em www.365algarve.pt, para acompanharem todos os eventos calendarizados.

 

VA -  Considera que estes quatro meses até ao final do ano serão suficientes para recuperar a economia algarvia?

JF - Como nunca baixámos os braços, continuamos a dispor de uma oferta diversificada de experiências e de um forte calendário de eventos internacionais a decorrer até ao final do ano na região. Em setembro inicia-se a época alta do golfe, do turismo de natureza e do turismo náutico e na agenda desportiva da região surgem três eventos de grandes dimensões (o Portugal Masters, o MotoGP e a Fórmula 1, que já aqui referi), pelo que a nossa expectativa é a de que possamos contar também para os quatro meses finais do ano com o nosso maior mercado emissor – o Reino Unido –, bem como com os mercados de habitual procura, como a Alemanha, Espanha, Irlanda e Holanda.

No fundo, estes quatro meses finais devem ser aproveitados ao máximo para ajudar a reverter o forte decréscimo dos últimos meses, embora saibamos que não será naturalmente suficiente para a recuperação da economia e do turismo na região. Continuamos por isso a promover o destino, estando a programar com o Turismo de Portugal um reforço das nossas campanhas, em especial no Reino Unido. O foco está nos atributos que nos são reconhecidos, nomeadamente o facto de sermos o melhor destino de golfe do mundo, onde se pratica turismo de natureza durante o inverno, em boas condições climatéricas.

VA - Que impacto é previsível com esta segunda saída de Portugal do roteiro aéreo entre Inglaterra e Portugal?

A restrição anunciada na passada quinta-feira pelo Governo do Reino Unido, mesmo que temporária, será sempre negativa para o Algarve, sendo previsíveis a redução das novas reservas e o cancelamento de reservas em carteira, como aliás já estamos a assistir, nomeadamente, para o golfe. Esta decisão acontece num momento de especial sensibilidade, por setembro ser habitualmente o mês com maior número de dormidas em hotelaria na região para este mercado.

Embora expectável, na medida em que, na última semana, o indicador utilizado como referência pelo Reino Unido para a definição dos corredores aéreos (n.º novos casos/100 mil hab) se agravou, em Portugal, consideramos, ainda assim, o anúncio injusto, por resultar de uma avaliação que não considera o n.º de testes realizados em cada país, nem as medidas de prevenção e controlo implementadas e respetiva eficácia.

Importa salientar que o Algarve é um destino seguro, assim o atestam os próprios visitantes e residentes britânicos, que continuam a dispor de ligações aéreas a partir de Faro para todas as regiões do Reino Unido. Tudo faremos para, num futuro tão próximo quanto possível, retomarmos os corredores aéreos para este grande mercado. Naturalmente continuaremos o esforço de estímulo ao mercado nacional e aos mercados externos, aproveitando o facto de o Algarve nos meses que se avizinham dispor de excelentes condições climatéricas para a praia, golfe, náutica ou turismo de natureza.

 

VA -  Como vê a adaptação das empresas à Covid-19 no setor do turismo?

JF - As empresas têm estado empenhadas em adaptar-se e em responder adequadamente a esta nova realidade, mas não passam imunes à atual conjuntura e algumas infelizmente não vão conseguir evitar a falência, o que terá efeitos sociais e económicos negativos.

Para tentar minimizar esta situação, o Turismo do Algarve tem feito tudo, para responder às necessidades dos empresários e dos trabalhadores de um setor essencial para a economia da região e com grande representatividade no PIB nacional.

Como mencionei, lançámos o “Manual de Boas Práticas” para sensibilizar e apresentar os procedimentos a adotar pelos diferentes agentes de turismo na região, mas também ativámos uma campanha de informação e de esclarecimento junto dos empresários sobre o pacote de medidas anunciadas para mitigar as consequências económicas do novo coronavírus em Portugal. Para a época baixa, apresentámos propostas à tutela para a criação de medidas específicas para a região e para o setor. De salientar igualmente o esforço das autarquias para a implementação de medidas (redução e isenção de taxas, investimento na requalificação de espaços públicos e no apoio a empresas e trabalhadores).

O nosso tecido empresarial já demonstrou por diversas vezes estar preparado para se reinventar – nesta crise isso também vai acontecer. Temos de ver a oportunidade de sairmos melhor de um cenário tão inusitado como este.

 

VA -  O Primeiro Ministro quer os desempregados do turismo reconvertidos para o setor social. Acha que esta medida poderá beneficiar o Algarve? Porquê?

JF - Tratando-se de uma medida temporária e excecional, que permita aos desempregados que habitualmente trabalham no setor do turismo, uma oportunidade de emprego em época baixa, com a possibilidade de a prazo regressarem ao seu espaço natural de atuação, como o previsto no programa “Mares”, penso que será uma boa medida. De salientar, que os residentes no Algarve, foram fortemente afetados na sua condição socioeconómica e de bem-estar e que importa reforçar a capacidade da região em respostas sociais e de saúde. Não obstante, é importante garantir que estes profissionais possam regressar a um setor para o qual a sua experiência e qualificação são determinantes, à medida que a atividade turística vá recuperando para níveis mais próximos da normalidade.

 

VA -  O ano turístico no Algarve, antes da COVID-19, era considerado como o melhor do ano turístico. Que balanço se pode fazer agora, relativamente ao setor do turismo, nomeadamente, ao nível das dormidas, receitas e emprego?

JF - Os dados relativos ao primeiro semestre do ano, traduzem uma queda significativa da atividade turística, especialmente nos meses do confinamento, como seria previsível, dada a conjuntura que vivemos.

Nesse período, houve um decréscimo de 78,6%, que se traduz em cerca de 1 milhão a menos de hóspedes estrangeiros no Algarve, quando comparado com o período homólogo de 2019. No caso dos portugueses, a queda é menos acentuada, com 58,1%, que se traduz em cerca de menos 344 mil hóspedes portugueses alojados em hotéis no Algarve, em relação ao ano passado. O turista nacional sempre teve uma presença mais expressiva no verão algarvio e este ano, embora atípico, foi marcado por uma adesão clara dos nossos compatriotas.

Perante estes resultados, o gasto médio por visitante sofreu igualmente uma queda, nomeadamente a partir de março, quando o confinamento se instalou em todo o país. Em junho, os valores que temos do gasto médio por visitante já são mais animadores, mas ainda um pouco abaixo dos números do mesmo período de 2019. Junho e julho, de acordo com a AHETA, são meses que registam sinais de retoma, com 11,3% e 32,6% de taxa de ocupação/quarto, respetivamente.

Este cenário tem fortes efeitos socioeconómicos. Somos uma das regiões mais afetadas pelo desemprego, embora os indicadores de julho divulgados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) revelem que a região registou o maior crescimento do País no número de desempregados inscritos, face ao mês anterior.

Para o segundo semestre do ano, estamos um pouco mais otimistas, embora o cenário seja ainda muito incerto.

 

Stefanie Palma