As seis organizações ambientais da Coligação C6 pediram hoje ao parlamento que legisle sobre as centrais solares fotovoltaicas no país, alertando que faltam regras e planeamento que previnam a sua instalação em áreas críticas.
As centrais solares fotovoltaicas estão a surgir “sem regras”, “sem uma estratégia de localização”, colocando em causa o património natural, os solos férteis e ecossistemas, alertaram hoje no parlamento representantes da Coligação C6, que junta a Quercus, a Associação Natureza Portugal/World Wide Fund For Nature (ANP/WWF), a Liga para a Proteção da Natureza (LPN), o Grupo de Estudos de Estudos de Ordenamento do território e Ambiente (GEOTA), a FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade e Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA).
Convidados pelo grupo parlamentar do PSD para falar sobre os impactos ambientais e sociais da expansão das centrais fotovoltaicas, os ambientalistas alertaram para a proliferação de projetos e pediram aos deputados ação.
“Para esta dimensão que estamos a atingir é necessária uma iniciativa legislativa própria que o parlamento regulamente”, disse Rosário Rodrigues, da Quercus, alertando para o facto de se estar “a substituir árvores por painéis solares”.
“Para nós é muito importante que existam soluções de energia renováveis e energia fotovoltaica, mas é necessário que exista também regulamentação”, resumiu, explicando que é “necessário haver legislação que antecipe a localização destes parques e que previna a localização em áreas críticas”.
A Coligação C6 voltou a chamar a atenção para a multiplicação de centrais fotovoltaicas e alertou para a ocupação e degradação de áreas de elevado valor ecológico e agrícola.
As centrais estão a surgir de “forma desordenada”, disse Domingos Leitão, da SPEA, defendendo a necessidade de estudar as necessidades energéticas e de planear.
“Todos concordamos que estamos a tentar construir uma casa começando pelo telhado. Primeiro precisávamos saber o que realmente precisamos para cobrir as necessidades energéticas locais e depois quantas megacentrais precisamos para colmatar as restantes necessidades”, afirmou o representante da SPEA.
Jorge Palmeirim, da LPN, acrescentou o facto de se estar a instalar centrais em “áreas protegidas importantíssimas, como a Reserva Ecológica Nacional ou a Rede Natura 2020”.
A legislação atual não impede a ocupação da Reserva Ecológica Nacional (REN) o que explica a existência de centrais solares sobrepostas à REN, lamentou.
Jorge Palmeirim reconheceu que o Sul do país tem sido “especialmente vitimizado, porque é uma área com boa radiação e porque os terrenos são mais baratos”, mas sublinhou que este é um problema nacional.
Segundo a coligação C6, só este ano já foram a consulta pública mais de uma dezena de projetos de instalação de centrais solares de norte a sul do país: Lamego, Tarouca, Vila Nova de Paiva, Viseu, Moimenta da Beira, Fundão, Armamar, Alenquer, Azambuja, Elvas, Nisa, Santiago do Cacém e Albufeira.
Também Domingos Leitão criticou a “falta de planeamento” e lamentou que não se saiba “quais os critérios para implementação das centrais no território”. “Quais os critérios para Santiago do Cacém? Quais os critérios para a instalação no Vale do Rio Ota?”, deu como exemplos.
Além disso, acrescentou, torna-se difícil “saber quantos projetos estão a surgir e onde”, assim como é complicado conseguir “acompanhar todos os projetos de impacto ambiental”.
“O público não consegue acompanhar os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e as consultas públicas. Falta planeamento, promoção e divulgação dos vários estudos. Os processos individuais de EIA vão aparecendo. A sociedade civil e as ONG não conseguem acompanhar todos os processos”, lamentou Domingos Leitão.
Segundo um levantamento feito pela Coligação C6, nos primeiros meses deste ano, os projetos “correspondem a cerca de dois mil hectares de superfície coberta por quase cinco milhões de módulos solares fotovoltaicos. Alguns destes projetos surgem como resultado dos leilões de licenças para produção de energia solar realizados pelo Estado Português em 2019 e 2020, nos quais se registaram os preços de energia solar mais baixos do mundo”.
Outra das críticas dos ambientalistas é a opção por mega centrais fotovoltaicas, que dizem ser mais difícil conseguir minimizar os impactos, defendendo, em alternativa, centrais mais pequenas que respondam às necessidades locais.
Rosário Rodrigues, da Quercus, explicou que se deve apostar em centrais de média dimensão, uma “produção descentralizada destinada ao autoconsumo, ou seja, uma produção que vai satisfazer as necessidades de consumo das produções, vez de grandes fotovoltaicas no espaço rural”.
A opção por uma produção descentralizada é também importante em termos ambientais. Rosário Rodrigues lembrou que as megascentrais são sinónimo de “impermeabilização dos solos” uma vez que os painéis são fixados ao solo.
Além disso, “não é compatível com rebanhos ou espécies animais selvagens, porque os painéis estão praticamente rentes ao solo”, alertou, sublinhando que “não há salvaguarda de vida animal”.
Também Miguel Sequeira, do GEOTA, defendeu a opção por áreas mais pequenas: “O descentralizado oferece tantos benefícios que não faz sentido seguir esta estratégia de centralizado”, disse.
Além disso, acrescentou, é preciso incentivar os painéis solares junto das famílias.
Recordando um estudo que diz que, “na Europa, 89% da energia das habitações pode ser gerada pelos próprios edifícios”, Miguel Sequeira defendeu mais apoios e menos burocracias para a instalação de painéis em edifícios.
“Deve ser mais fácil conseguir instalar painéis fotovoltaicos nas casas e em prédios, assim como devem ser melhoradas as condições de venda à rede”, disse.
“Também é importante o papel das autoridades locais, dos municípios, em disseminar esta tecnologia junto dos seus moradores”, acrescentou, defendendo a importância de existirem campanhas para a instalação de painéis fotovoltaicos nas casas e nos bairros.
Os ambientalistas hoje presentes na Comissão de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território garantiram ser defensores da energia solar fotovoltaica, face às não-renováveis ou a mais barragens, mas exigem que seja feito com regras, estudos e planeamento.
As associações insistiram que os parques solares ocupam grandes áreas o que acaba por ter impacto no solo, nas linhas de água, aumentar a erosão e reduzir a biodiversidade.