O «privilegiado» Alejandro Marque está a despedir-se, sem arrependimentos, da Volta a Portugal e de uma carreira «maior» do que sonhou, admitindo tristeza por deixar o ciclismo, a modalidade que lhe proporcionou «muitos» momentos inesquecíveis.
“Está mais do que pensado. No ano passado, já tinha na mente que podia ser esse o último, mas como a Volta a Portugal correu muito bem, quis adiar um ano. Mas esta é uma opção que já tenho meditada. Em parte, fico um bocado triste por abandonar a modalidade, mas são etapas da vida que acabam”, revelou, em entrevista à agência Lusa, durante a 83.ª edição da prova, que cumpre hoje o dia de descanso.
A decisão está tomada e o ciclista da Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel já pensa nas saudades que vai ter das pessoas que conheceu “ao longo dos anos” e que promete visitar, quando o seu projeto de futuro – uma loja de bicicletas ainda em construção – assim o permitir.
“Levo muitos anos a fazer o mesmo e, apesar de obrigar a muitos sacrifícios, é algo de que gosto. Realmente, penso que somos uns privilegiados por poder viver desta modalidade. Penso que fui um privilegiado durante estes anos”, assumiu.
Quase a completar 41 anos (nasceu em 23 de outubro de 1981), ‘Alex’ olha para trás, para aquilo que foi a sua carreira, sem arrependimentos.
“Não me arrependo de nada. Comecei como trabalhador, como ‘équipier’. Aprendi muito nesse labor. Acho que também todos devemos passar por esse trabalho. Depois, fui agarrando as oportunidades que foram surgindo até poder chegar ao escalão em que estou agora. Quer queiras, quer não, são fases que o atleta tem de passar para ir aprendendo”, defendeu.
Vencedor da Volta a Portugal em 2013 e terceiro em 2015 e 2021, o galego de A Estrada sente que “sempre” deu o seu melhor e tentou ser “o mais profissional possível”.
“Quando comecei, não imaginei que ia conseguir tão bons resultados. Aquilo que me pode deixar um bocado ‘tal’ foi não ter agarrado aquela oportunidade que houve naquele momento”, admitiu, sem mencionar efetivamente o contrato com a Movistar, assinado depois de ter conquistado a Volta2013 e perdido devido a um controlo antidoping positivo por betametasona, do qual foi ilibado por a substância ter sido usada para fins terapêuticos.
No entanto, o sonho ‘desaparecido’ do WorldTour não atormenta Marque: “Não, de todo. Naquela altura doeu-me, mas não vivo a pensar sempre nisso. Fechei uma porta e continuei a focar-me naquilo que estava a fazer, no clube que estava a representar”.
‘Alex’ admite, ainda assim, que quando olhava para “aquelas corridas”, do escalão principal do ciclismo mundial, questionava-se sobre “o que teria acontecido” se lá andasse ou se poderia destacar-se.
“Mas, por outro lado, também fui feliz aqui. O ciclismo em Portugal é um ciclismo familiar, conheces praticamente todo o pelotão. Os colegas, se não conviveste numa equipa, conviveste noutra. Creio que é mais familiar. Ao serem grupos tão reduzidos, coincides sempre com os mesmos. Numa equipa do WorldTour, são 20 e tal ciclistas e se calhar coincides com alguns cinco dias por ano. É diferente o ambiente”, notou.
Foi nessa ‘família’ que viveu os seus momentos mais felizes, e “foram muitos”, uma vez que todas as vitórias conquistadas ao longo dos quase 20 anos de carreira “significam algo”.
“A minha vitória em 2013 foi incrível. Foi espetacular. Os momentos do ano passado também afloraram os sentimentos do passado, de 2013. É que foram muitos… em 2012, foi a primeira vitória que tive na Volta a Portugal, no contrarrelógio. Foi algo especial. E a Volta à China também foi outro dos momentos, porque foi além-fronteiras. Era uma cultura diferente e foi um dos triunfos que me deu mais prestígio a nível internacional”, enumerou.
Profissional desde 2004, o ciclista que nunca deixa de sorrir, nem nos piores momentos, passou por quase todas as equipas portuguesas, deixando um ‘rasto’ de carinho no pelotão nacional – é mesmo uma das figuras mais queridas por colegas, rivais e os outros elementos da caravana.
“Espero que toda a gente goste de mim, isso seria um bom sinal. Sempre há alguém que não gosta, mas mostra que tentei respeitar sempre, na medida do possível, os meus rivais e os meus companheiros. Isso ganha-se no dia-a-dia. No final, o ciclismo é uma roda, vais passando de uma equipa a outra, e encontrando antigos colegas”, comparou.
Apesar de ter sido muito bem tratado em todas as formações nacionais que representou e de não guardar “más recordações de nenhuma, antes pelo contrário”, foi nas diferentes ‘eras’ do Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel que viveu “os melhores anos”.
“Talvez, quanto aos resultados, não foi a equipa em que tive melhores. No ano passado, era essa dívida que tinha na Volta a Portugal […] Eu queria retribuir e, no ano passado, correu bem. Foi espetacular, tantos dias de amarelo, com um lugar no pódio”, recordou.