Regulador europeu vai subir as taxas de juro diretoras, pelo menos, duas vezes em 0,5% em 2023 e vĂ¡rias de 0,25%.
Um novo ano começa cheio de desafios macroeconómicos. A inflação na Zona Euro fixou-se nos 10,1% em novembro, uma das taxas mais elevadas nas últimas décadas. E a política monetária está mais apertada, depois do Banco Central Europeu (BCE) ter subido os juros diretores em 250 pontos base na segunda metade de 2022. E assim vai continuar em 2023: a presidente do regulador europeu admite continuar a subir os juros ao longo do ano para conter a inflação que, além de ser impulsionada pelos choques económicos gerados pela guerra na Ucrânia, também é alimentada pelas políticas orçamentais e dinâmicas salariais dos países do espaço europeu. Se assim não fosse, “seria pior para todos”, frisou Christine Lagarde. Mas, este ano, as subidas dos juros deverão ser mais contidas, antecipam analistas.
O ano de 2022 foi marcado pela subida a pique da inflação nos vários países que compõem a Zona Euro – Portugal incluído (inflação foi de 9,9% em dezembro). E este ciclo inflacionista foi, sobretudo, empurrado pelos cortes no abastecimento de energia e de alimentos gerados guerra da Ucrânia. Mas, agora, há também decisões políticas dos vários países que estão a alimentar o clico inflacionista.
“No início, [a inflação] era predominantemente provocada pelo lado da oferta. (…) Mas, agora, temos de ter cuidado com as causas de inflação que são geradas internamente, que são provocadas sobretudo por medidas orçamentais e dinâmicas salariais”, explicou Christine Lagarde ao jornal croata Jutarnji List, citado pelo Observador.
Ou seja, o combate à inflação não é exclusivo dos bancos centrais cabendo também às empresas e aos Estados moderar margens de lucro e políticas orçamentais. Sobre este tema a líder do BCE já alertou que todos os apoios públicos para minimizar os impactos da inflação devem ser temporários e destinados apenas aos cidadãos mais vulneráveis. O próprio Fundo Monetário Internacional (FMI) também alertou em novembro que a política monetária dos bancos centrais e a política orçamental dos governos têm de “demonstrar alinhamento” na redução da inflação. E Mário Centeno, governador do Banco de Portugal (BdP), sublinhou no início de novembro que caso não haja cooperação de bancos e Estados, “as subidas das taxas de juro terão de ser ainda maiores”.
O que é certo é que o regulador europeu está comprometido em fazer a sua parte e a voltar a subir as taxas de juro diretoras ao longo de 2023 para travar a inflação na área euro, uma taxa que já está, aliás, a dar sinais de descida passando de 10,6% em outubro para 10,0% em novembro. “Neste momento, as taxas de juro têm de continuar a subir para dominar a inflação e trazê-la novamente para o nosso objetivo de 2%”, afirmou Christine Lagarde ao mesmo jornal.
“Agora estamos a combater a inflação, como devemos, e vamos continuar a fazê-lo, mas o que é importante é que somos os guardiões do Euro, que é a divisa que nos une, que nos junta. E como presidente do BCE, posso assegurar-vos que vamos continuar a trabalhar arduamente como guardiões do Euro para garantir que temos estabilidades dos preços e financeira, apesar dos choques e das dificuldades que estamos a enfrentar", defendeu a presidente do BCE.
Taxas de juro do BCE vão subir em 2023, mas menos
A subida a pique das taxas de juro pelo BCE e por outros bancos centrais, para tentar conter a escalada da inflação, colocou um ponto final à era do dinheiro barato e à política expansionista. E tudo indica que a política monetária continuará a ser restritiva no próximo ano, apontam os analistas consultados pela Lusa.
“Espera-se que os principais bancos centrais – Reserva Federal norte-americana (Fed), Banco Central Europeu (BCE), Banco de Inglaterra (BoE) e até o Banco Central do Japão (BoJ) continuem a adotar uma política monetária mais restritiva, seja com subida das taxas de juro, seja através da retirada de estímulos como seja a venda das obrigações de compraram nos últimos anos, reduzindo assim o seu balanço”, considera Pedro Lino, presidente executivo (CEO) da Optimize Investment Partners.
O BCE já avisou que, devido à revisão em alta substancial das perspetivas quanto à inflação, espera continuar a aumentar as taxas de juro de forma “significativa”. No entanto, os aumentos ‘jumbo’ de 75 pontos base ficaram em 2022, segundo os analistas. Mário Centeno também acredita que o ciclo de subida dos juros “jumbo” também terá terminado.
“O BCE terminou com as subidas de juros de 0,75%, e indicou que iria subir, pelo menos, duas vezes em 0,5% e várias de 0,25%. É um discurso muito agressivo, que não creio que possa ser exequível, e por isso penso que o BCE irá a partir de junho dar prioridade à redução do seu balanço”, considera Pedro Lino.
Também para Filipe Garcia, presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, será “improvável” haver “subidas da mesma magnitude em 2023” das que se assistiram em 2022.
Assim, Pedro Lino prevê que a taxa terminal na Zona Euro se fixe nos 3%, considerando que com uma taxa superior o BCE “arrisca a ter um problema sério, dadas as pressões a que a economia europeia está sujeita”.
Miguel Faria e Castro, economista na Federal Reserve Bank of St. Louis, realça que a Europa tende a seguir “com atraso em termos macroeconómicos os Estados Unidos”, pelo que acredita que “em breve” far-se-ão sentir “os primeiros efeitos das alterações das taxas de juros do BCE”.
Também o banco central norte-americano já começou a abrandar a subida dos juros diretores. “Se, de facto, os indicadores começarem a melhorar não ficaria surpreendido se [as subidas] começassem a acalmar e até parassem”, porque, diz Miguel Faria e Castro, o principal desafio é: “como é que conseguimos contrair a economia o suficiente, sem causar uma recessão”.
Neste contexto, Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, acredita que o Fed procederá a dois aumentos dos juros de 25 pontos base em cada uma das suas primeiras duas reuniões do próximo ano, a 01 de fevereiro e a 22 de março, fixando a taxa no final no intervalo 4,75% a 5%.
Mas a narrativa da política de inflação deverá mudar em breve, aponta a BlackRock. “O ciclo de subidas das taxas de juro irá parar sem que a inflação esteja de novo nos níveis pretendidos. À medida que os prejuízos económicos se tornam evidentes, a política de recessão assumirá o seu lugar”, antecipa a gestora de ativos BlackRock.
Novo ano traz redução dos balanços dos bancos centrais
É precisamente aliado a um abrandamento no aumento das taxas de juro que também Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, espera, quer por parte do BCE, quer da Fed, “uma aceleração" dos Quantitative Tightening (QT), isto é, o aperto do balanço – uma ferramenta de política monetária restritiva para diminuir a quantidade de liquidez na economia –, de forma a "mitigar ou mesmo reverter a atual inclinação negativa das curvas de rendimento que, além de indiciarem uma tendência económica recessiva, têm penalizado sobretudo os tomadores de empréstimos indexados a taxas de juro de curto prazo”.
O QT surge como resposta ao aumento significativo do balanço acumulado dos bancos centrais, acentuado pela compra de dívida durante a pandemia para estimular a economia.
O BCE já anunciou que em março a carteira do APP (‘asset purchase programme’) diminuirá “a um ritmo comedido e previsível, dado que o Eurosistema não reinvestirá todos os pagamentos de capital de títulos vincendos”, sendo a diminuição, em média, de 15 mil milhões de euros por mês até ao final do segundo trimestre de 2023 e o ritmo subsequente "determinado com o tempo”.
A alteração irá afetar, assim, a partir do próximo ano vários países da zona euro, cujo principal comprador de dívida é o banco central, depois de pela primeira vez em 11 anos, em julho, o BCE ter subido as taxas de juro, dando início a uma série de mais três aumentos que no final do ano totalizaram 250 pontos base.
Por: Idealista