Euribor desceu para baixo dos 4%, depois da pausa na subida dos juros do BCE em outubro. Como reagirá à nova manutenção dos juros?
Suportar a forte subida das prestações da casa e o aumento do custo de vida, devido à inflação, foi o grande desafio das famílias ao longo de 2023. Embora estejam longe de voltar aos tempos da vida barata, os portugueses começam agora a sentir um alívio na carteira: a inflação nacional recuou para 1,5% em novembro, os juros diretores do Banco Central Europeu (BCE) vão manter-se inalterados no patamar dos 4%, pelo menos, até janeiro de 2024. E as taxas Euribor a 6 e 12 meses estão a descer ligeiramente desde novembro, estando agora abaixo dos 4%, refletindo-se nas prestações da casa.
No entanto, e apesar da suavização das prestações da casa em novembro, os analistas acreditam que as taxas Euribor não deverão descer muito mais no imediato, verificando-se antes uma estabilização dos atuais níveis - isto tendo em conta que o regulador europeu liderado por Christine Lagarde deixou as taxas de juro inalteradas pela segunda vez consecutiva na reunião de política monetária que decorreu esta quinta-feira, dia 14 de dezembro. Quanto a 2024, o futuro ainda é incerto, dependendo do comportamento da inflação e da economia, que vai condicionar as decisões futuras do guardião do euro, isto é, se avança ou não com cortes.
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BCE decide voltar a manter juros inalterados: porquê?
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Euribor a descer devido à pausa na subida de juros do BCE
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Como vai reagir a Euribor aos juros do BCE inalterados em dezembro?
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BCE continua prudente e não discute descida dos juros
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Quando é que o BCE vai descer os juros diretores?
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Alívios na Euribor e nas prestações da casa são esperadas para 2024
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As próximas reuniões do BCE
BCE decide voltar a manter juros inalterados: porquê?
As expectativas do mercado europeu apontavam a favor de uma manutenção das taxas de juro diretoras do BCE. E assim foi: o regulador europeu liderado por Christine Lagarde decidiu voltar a manter as três taxas de juro diretoras inalteradas na reunião de política monetária de dezembro. E esta é mesmo a segunda vez que o BCE decide não mexer nos juros, depois de ter optado na reunião de outubro por interromper o ciclo de dez subidas consecutivas iniciado em julho de 2022. Assim, as taxas de juro diretoras vão ficar entre 4% e 4,75%, pelo menos, até à próxima reunião que se vai realizar no dia 25 de janeiro de 2024. Em concreto, a taxa de refinanciamento, que influencia os créditos habitação, continuará nos 4,5%, ainda bem superior face há um ano (2,5%).
Foi precisamente a descida da inflação na Zona Euro nos últimos meses que motivou o BCE a manter os juros nos atuais patamares, além da revisão em baixa das perspetivas da inflação para 2023 e 2024. Recorde-se o Eurostat indicou, na sua estimativa rápida, que a inflação anual deverá fixar-se em 2,4% em novembro de 2023 (inferior aos 2,9% em outubro e 10,1% registados em novembro do ano passado). E a inflação subjacente - que não inclui os componentes mais voláteis, como a energia e alimentação - deverá situar-se nos 3,6% em novembro (4,2% de outubro). Esta nova descida da taxa de inflação em novembro foi uma "surpresa agradável" para Isabel Schnabel, membro da Comissão Executiva do BCE.
Quanto às perspetivas de inflação na Zona Euro, os especialistas do Eurosistema apontam que a taxa anual se fixe em 5,4% em 2023, em 2,7% em 2024 e ainda nos 2,1% em 2025 (a meta do BCE). Por seu turno, a inflação subjacente – que deverá fixar-se em 5,4% em 2023 - também deverá descer para valores entre 2,1% e 2,7% nos próximos três anos. Por outro lado, os mesmos analistas estão ligeiramente mais pessimistas sobre o crescimento económico europeu, prevendo um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de, em média, 0,6% em 2023 para 0,8% em 2024 e 1,5% em 2025 e 2026.
É neste contexto que o Conselho do BCE continua a considerar que “as taxas de juro diretoras estão em níveis que, se forem mantidos por um período suficientemente longo, darão um contributo substancial" para que a inflação regresse ao objetivo de médio prazo de 2%, apesar de continuar a enfraquecer a economia da Zona Euro no curto prazo, lê-se no comunicado publicado esta quinta-feira. Já os cortes dos juros em 2024 estão, para já, longe de vista.
A decisão do regulador europeu vai, assim, ao encontro da estratégia adotada por outros bancos centrais. A Reserva Federal norte-americana (Fed) decidiu voltar a manter os juros de referência entre os 5,25% e 5,5% esta quarta-feira, admitindo avançar com cortes nos juros já em 2024, deixando as taxas entre os 4,5% e 4,75%. E, das 40 reuniões de política monetária realizadas em novembro, 25 bancos centrais optaram também por não mexer nas taxas diretoras, como o Banco de Inglaterra, o Banco Popular da China e o Banco do México, escreve o Expresso.
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Euribor a descer devido à pausa na subida de juros do BCE
Depois de BCE ter decidido avançar com aquela que foi a primeira pausa na subida das taxas de juro diretoras em outubro - deixando a taxa de refinanciamento o atual patamar dos 4,5% -, as taxas Euribor mensais logo reagiram em novembro, refletindo-se numa descida para o prazo de 6 e 12 meses e numa ligeira subida para o prazo de 3 meses:
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Euribor a 12 meses: a média mensal desceu para 4,022% em novembro, menos 0,138 pontos percentuais (p.p.) face a outubro (4,160%). Esta foi a segunda vez que esta Euribor desceu no atual ciclo de subidas depois de ter recuado em agosto. Há um ano estava nos 2,828%;
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Euribor a 6 meses: esta taxa desceu 0,050 pontos para 4,065% em novembro (contra 4,115% em outubro). A descida da média da Euribor a seis meses em novembro foi a primeira mensal no atual ciclo de alta. Em novembro de 2022, fixou-se nos 2,321%;
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Euribor a 3 meses: subiu ligeiramente em novembro para 3,972%, mais 0,004 pontos do que em outubro (3,968%) e mais 2,147 pontos face a novembro do ano passado.
Apesar das ligeiras descidas das taxas Euribor a 6 e 12 meses em novembro face ao mês anterior, salta à vista que tanto os juros como as prestações da casa em dezembro ainda são bem superiores face às registadas há um ano (dezembro de 2022), segundo mostram as simulações do idealista/créditohabitação, tendo por base um novo empréstimo habitação de 150.000 euros, com spread de 1% e prazo de 30 anos:
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a Euribor a 12 meses estava nos 2,828% em novembro do ano passado, estando em novembro de 2023 em 4,022%. Portanto, a prestação da casa deu o salto de 701 euros para 807 euros em apenas um ano;
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a Euribor a 6 meses estava os 2,231% há um ano, estando agora nos 4,065%. De acordo com as simulações, a prestação da casa subiu de 658 euros para 811 euros entre estes dois momentos.
A verdade é que a tendência de ajustamento em baixa da Euribor continua a seguir caminho nos primeiros 14 dias de dezembro, com as taxas Euribor a 6 e 12 meses – que representam a maioria dos créditos habitação a taxa variável em Portugal - a registarem as maiores descidas das taxas diárias, mantendo-se agora baixo dos 4%. Em concreto, esta quinta-feira (antes de ser anunciada a decisão do BCE), a Euribor a 12 meses registou uma taxa diária de 3,719%, a mais baixa desde o passado dia 13 de abril. E a taxa mensal provisória da Euribor a 12 meses está agora próxima dos 3,76%, regressando também aos níveis de abril.
Como vai reagir a Euribor aos juros do BCE inalterados em dezembro?
Agora, resta saber se a nova manutenção dos juros do BCE continuará a refletir-se na descida das taxas Euribor. Miguel cabrita, responsável pelo idealista/crédito habitação em Portugal, acredita que não haverá muitas alterações, apontando para uma estabilização da Euribor nos atuais patamares entre os 3,5% e os 4%. “Veremos certamente como a Euribor, que caiu ligeiramente nos últimos dias, não terá muito mais margem para descer, embora não se espere que cresça acima dos níveis observados no início do outono. Esta é, sem dúvida, uma má notícia para as famílias que têm crédito habitação a taxa variável [ou taxa mista em período variável], porque vão continuar a sentir que as revisões das prestações da casa vão resultar em pagamentos muito superiores face aos que usufruíram há 12 meses”.
Já Henrique Tomé, analista da corretora XTB, diz que, num cenário em que os juros não deverão subir mais e manter-se-ão aos níveis atuais durante alguns meses, “as taxas de juro de referência no crédito habitação, as Euribor, podem recuar ligeiramente numa primeira fase, tal como se regista atualmente”. Para Filipe Garcia, presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, “o topo das taxas de juro está visto. Aliás, basta observar as Euribor para perceber isso mesmo, com a referência a 12 meses a ser a mais baixa já há algumas semanas”, segundo disse à Lusa.
"A Euribor, que caiu ligeiramente nos últimos dias, não terá muito mais margem para descer", diz Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/crédito habitação em Portugal
Isto quer dizer que, apesar das taxas Euribor estarem a dar sinais de descida, não são esperadas quedas significativas no próximo mês. Assim, as prestações da casa que vão ser atualizadas em dezembro de 2023 ou janeiro de 2024 poderão, sim, descer ligeiramente, mas continuarão ainda elevadas e a pressionar os orçamentos familiares. E as condições de financiamento oferecidas pelos bancos também deverão manter-se. Por outro lado, o custo de vida em Portugal tem vindo a ser aliviado pela queda da inflação, que se fixou em 1,5% em novembro, uma taxa bem inferior à registada há um ano, de 9,9%. E a expectativa do Ministério das Finanças é que a inflação nacional passe de 8,1% em 2022 para 5,3% em 2023, refletindo sobretudo a descida dos preços na energia.
O que também é esperado é que se continuem a sentir os efeitos dos juros elevados no universo do crédito habitação em Portugal, que se traduzem num aumento das amortizações antecipadas, das transferências de créditos habitação, bem como das renegociações dos empréstimos. Até porque o Governo português avançou com medidas de ajuda às famílias que têm crédito habitação de taxa variável e indexada à Euribor, que impulsionaram parte destas tendências, como a suspensão da comissão de amortização antecipada, o resgate dos Planos de Poupança Reforma (PPR) sem penalizações e ainda novas regras para renegociar os créditos da casa. Além destas, destacam-se ainda a bonificação dos juros e a fixação da prestação da casa durante dois anos, que deverão continuar a ter adesão por parte das famílias para atenuar o peso dos juros elevados nos seus orçamentos.
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BCE continua prudente e não discute descida dos juros
Para já, as expectativas do mercado é que o BCE continue a manter as taxas de juro diretoras nos atuais patamares nas reuniões agendadas para o início de 2024. E isto quer dizer que o período de subida das taxas de juro deverá mesmo ter chegado ao fim. A própria Isabel Schnabel, da Comissão Executiva do BCE, já avançou mesmo que, tendo em conta o atual nível da inflação, “uma nova subida de taxas de juro é bastante improvável”.
Mas o BCE continua prudente quanto ao rumo da política monetária em 2024, garantindo apenas que as taxas diretoras devem permanecer em “níveis suficientemente restritivos durante o tempo necessário” para trazer a inflação de volta ao patamar dos 2%, considerando esta última fase de descida da taxa a “mais difícil”. E o mesmo diz Miguel Cabrita alertando que “embora a inflação se encontre em níveis muito inferiores aos observados há apenas um ano, esta reta final de ajustamento poderá durar mais tempo do que o esperado”.
“Não devemos absolutamente baixar a guarda”, disse Christine Lagarde
Questionada sobre se o BCE vai descer os juros em 2024, Christine Lagarde afirmou que “não estamos a discutir cortes dos juros”, lembrando que o BCE continua dependente dos dados da inflação, da inflação subjacente e da transmissão da política monetária às economias, pelo que vão tomar decisões reunião a reunião, tendo por base esses dados. Além disso, o regulador europeu continua atento aos fatores de risco que podem mudar o rumo da economia e da inflação na Zona Euro, como é o caso da subida dos salários, resistência na descida de preços pelas empresas e ainda o escalar dos conflitos armados na Ucrânia e em Israel.
“As incertezas geopolíticas, o custo da energia e o seu impacto tanto a nível industrial como de consumo, bem como o elevado nível de pressões laborais e salariais, não parecem dar sinais que nos ajudem a vislumbrar o fim desta fase de juros elevados", indica ainda Miguel Cabrita.
Quando é que o BCE vai descer os juros diretores?
Apesar do discurso cauteloso do BCE e de vários membros considerarem “prematuro” falar em descida das taxas de juro diretoras, os analistas de mercado já começam a fazer as suas apostas para o próximo ano, antecipando que o pico dos juros diretores já foi atingido e que haverá cortes ao longo de 2024 e também em 2025:
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o Deutsche Bank prevê que o primeiro corte nas taxas diretoras ocorra em abril de 2024, apontando ainda um “risco significativo de corte” em março. No total, antecipa uma flexibilização das taxas de juro de 150 pontos base até ao final do ano, com a taxa de refinanciamento bancário a cair para os 3% no final de 2024 (hoje está em 4,5%);
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o Bankinter diz que vai haver os primeiros cortes das taxas de juro na segunda metade do próximo ano e não antes, sem adiantar a dimensão das descidas;
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a Goldman Sachs acredita que 2024 será um “ano de transição” para os bancos da área do euro, para um ambiente de “taxas mais baixas, com margens financeiras mais estáveis e comissões elevadas”;
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o Bank of America acredita que o primeiro corte dos juros diretores vai acontecer na reunião de política monetária agendada para 6 de junho, o que significa que as taxas ficariam inalteradas nas reuniões de janeiro, março e abril. Só em 2025 é que antecipam que haverá descidas dos juros “mais rápidas”;
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desde a Generali Investments espera-se que o BCE inicie “o seu ciclo de cortes trimestrais de 25 pontos base já em junho”. E consideram “provável” que as taxas caiam 75 pontos base ao longo de 2024;
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o Barclays refere que a primeira descida dos juros poderá acontecer em julho, apontando para uma redução das taxas em 100 pontos base em 2024 e mais 75 pontos em 2025. Se a sua previsão se confirmar, no final de 2025 o preço do dinheiro situar-se-à em 2,75%, face aos atuais 4,5%.
As expectativas do mercado passam, assim, pelos cortes dos juros do BCE em 2024. E os indicadores apontam, nas vésperas da reunião desta quinta-feira, que a expectativa dos investidores é de uma descida das taxas de juro de 1,33 pontos percentuais ao longo de 2024, com o primeiro movimento, de 0,25 pontos, a acontecer logo nas reuniões de março ou abril, resume o Público. Estando hoje as taxas no patamar de 4%, um corte desta dimensão significaria que os juros diretores estariam mais próximos do intervalo entre os 2% e 2,5%, a meta que Mário Centeno, governador do Banco de Portugal (BdP) admite ser desejável para estar em harmonia com a inflação dos 2%. O que se antecipa é que as taxas diretoras não voltem a zero.
Ainda assim, Filipe Garcia, presidente da IMF acredita que "os bancos centrais em geral, incluindo o BCE, serão algo renitentes em baixar tanto e tão depressa quanto as previsões dos mercados, pois quererão ver os efeitos quer das subidas que foram efetuadas, quer dos primeiros cortes e terão receio de uma segunda vaga inflacionista”.
Alívios na Euribor e nas prestações da casa são esperadas para 2024
Portanto, resta agora saber quando é que o BCE vai avançar com a descida das taxas de juro diretoras e em que dimensão o fará. Se as previsões dos analistas estiveram certas e o regulador europeu avançar mesmo com o corte de juros em 2024, significa que as famílias podem esperar mais alívios na Euribor e, por conseguinte, nas prestações da casa, ainda que ligeiros.
“Se este corte das taxas de juro de referência do BCE se concretizar, as taxas Euribor também deverão começar a aliviar, o que se traduzirá numa redução das prestações a pagar pelo crédito da taxa variável, como por exemplo o das hipotecas para a compra de casa”, refere Ricardo Evangelista, diretor executivo da corretora ActivTrades Europe, em declarações à Lusa.
Neste cenário de cortes dos juros no próximo ano, o economista do Banco Carregosa, Paulo Rosa, acredita que “a partir da primavera do próximo ano, à medida que os créditos habitação indexados à Euribor são atualizados a taxas de juro mais baixas, o peso da prestação mensal vai aliviando os orçamentos das famílias”.
Por exemplo, um crédito habitação indexado à Euribor a 12 meses que renovou em novembro passado, à volta dos 4%, “terá que esperar por novembro do próximo para beneficiar destas potenciais quedas das taxas de juro”. “Atualmente, e de acordo com as perspetivas do mercado monetário, esse crédito habitação pode ter uma queda da taxa de juro indexada para quase 2,5%”, aponta.
Também o BdP também prevê que a subida das prestações da casa poderá estar a chegar ao fim, uma vez que os especialistas de mercado esperam que as taxas Euribor caiam ao longo de 2024, mas “de forma gradual”. A descida prevista no final de novembro será entre 0,7 p.p. e 1 p.p. (dependendo do prazo), face ao valor máximo observado, para valores um pouco acima de 3% em dezembro de 2024”, destaca o supervisor bancário.
Por seu turno o CaixaBank Research aponta que a média anual da Euribor a 12 meses irá oscilar em torno dos 3,6% em 2024, embora no final do próximo ano possa moderar-se até se aproximar dos 3%. Já para os analistas do Bankinter, o cenário base é que a Euribor se mantenha acima dos 3% até 2025.
As próximas reuniões do BCE
O Conselho do BCE reúne-se aproximadamente de seis em seis semanas. Este é o calendário das próximas reuniões de política monetária do guardião do euro, nas quais vai anunciar as suas decisões sobre as taxas de juro diretoras:
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25 de janeiro de 2024
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7 de março de 2024
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11 de abril de 2024
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6 de junho de 2024
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18 de julho de 2024
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12 de setembro de 2024
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17 de outubro de 2024
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12 de dezembro de 2024