Durante a crise financeira de 2012, Mário Draghi, então presidente do Banco Central Europeu (BCE), proferiu uma frase, numa conferência em Londres, que se tornou icónica: "dentro do nosso mandato, o BCE está pronto para fazer o que for necessário para preservar o Euro. E acreditem, será suficiente.”
Foi o bastante para acalmar os mercados e reforçar a confiança na capacidade do BCE para proteger o Euro. Mais recentemente, no início de setembro, Draghi apresentou um documento (conhecido por Relatório Draghi), intitulado “O futuro da competitividade europeia”, cuja primeira parte apresenta uma estratégia geral para a competitividade da União Europeia; e, a segunda, faz uma análise profunda, incluindo recomendações da maior relevância, propondo uma mudança de rumo na UE, para evitar a decadência sem retorno.
Com a atual trajetória, a Europa caminha para a estagnação e assistirá a uma forte erosão da sua competitividade e do seu peso relativo no cenário internacional.
Poderá o “Relatório Draghi” servir de guia para uma nova estratégia de crescimento e competitividade? Esta é a questão-chave, que não tem uma resposta fácil. Depende da vontade política dos órgãos de decisão da UE e dos seus Estados-membros, que não raramente têm dificuldade em consensualizar decisões estratégicas. Draghi enfatiza o excesso de burocracia, aversão ao risco, a energia cara, a baixa produtividade, o défice tecnológico e de inovação, como problemas críticos que demonstram a decadência da Europa em comparação com os Estados Unidos e a China.
Elenca os principais desafios e faz importantes recomendações, designadamente: a nível do investimento necessário, estima que a Europa precisa mobilizar entre 750 a 800 mil milhões de euros por ano para acompanhar os concorrentes globais, nomeadamente EUA e China; em relação ao crescimento do PIB, refere que desde 2002, o crescimento do PIB da União Europeia tem sido consistentemente mais lento do que o dos Estados Unidos.
Em 2023, a diferença no nível do PIB a preços de 2015 aumentou de pouco mais de 17% em 2002 para 30%; quanto à produtividade, destaca um significativo enfraquecimento na Europa, o que compromete a sua capacidade para alcançar metas como a neutralidade carbónica, a inclusão social e a sua relevância geopolítica; e, alerta para a excessiva dependência da China, especialmente em tecnologias limpas e automóveis, vista como uma ameaça significativa.
O relatório confere particular realce à necessidade de financiamento comum, com emissão de dívida conjunta pela UE, para financiar projetos de defesa, promovendo uma maior integração e cooperação entre os estados-membros. Esta perspetiva é fundamental para reforçar a autonomia estratégica na defesa e nas indústrias conexas, associadas a uma verdadeira estratégia industrial, a fim de reduzir a dependência de fornecedores externos e estimular a inovação e a competitividade.
O sucesso do relatório Draghi, se adotado pela UE, poderá residir na promoção de reformas estruturais que impulsionem o crescimento económico sustentável, na melhoria da coesão social e na redução das desigualdades regionais, para além de fortalecer a segurança económica e estratégica da UE e fomentar a inovação e competitividade no mercado global.