CARTAS À QUINTA | PARA UM CUIDAR DA FRATERNIDADE

10:30 - 29/09/2024 OPINIÃO
Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

Caríssimos mochos, estimados irmãos,

 

No início de mais um ano letivo, com a vontade e energia necessárias para acolher a oportunidade dos imensos desafios que serão propostos, lembrei-me de vós. Muitos vos olham simplesmente como aves de rapina das mais variadas espécies, de pequeno porte, com incisivos olhos redondos amarelados, patas robustas com garras afiadas, cobertos com bela plumagem.

Consideram-vos natos predadores noturnos, seres misteriosos, astutos, particularmente afetos ao oculto e ao inexplicável. Aqui, na nossa terra, sois chamados de mochos ou corujas, consoante o facto de serdes, respetivamente, machos ou fêmeas. Mas, não por acaso, sois considerados significativamente símbolo da sabedoria e da inteligência, do conhecimento e da grande capacidade de discernimento. Sois também animais superiores, tal é a subtileza da vossa audição e da vossa visão tão apurada e sensível. Podeis nos ensinar, efetivamente, uma outra amplidão de olhar, tão urgente e necessária diante as visões tão estreitas, utilitaristas e frágeis com que nos olhamos e vemos o mundo e os outros.

Precisamos reaprender o espanto, a capacidade de nos extasiarmos perante a capacidade de abrirmos os olhos e vermos a realidade e a profundidade das coisas e não a sua superficialidade e aparência. Precisamos reencontrar a transparência das mesmas, que dilata a alma e alegra o coração, projetando-o numa esperança que não desilude nem falseia, mas ancora na verdade. Neste ano, que lectivamente se inicia, desejo pedir-vos, que ensineis as nossas crianças e jovens e a todos nós a encontrar e a caminhar pelas vias da autêntica sabedoria, onde nos tornemos guias de síntese e de caminho, competentes na arte de iluminar o que somos e vivemos.

Ensinai-nos a ser possuidores duma visão global das coisas, que abarque a sua completude e não simplesmente uma parte da sua realidade, a saber narrar e a maturar o que escutamos e vemos, a sensibilidade pela profundidade e um lúcido discernimento, uma sabedoria, que não seja somente aquisição de conhecimentos, mas experiência do realizado e vivido.

Ajudai-nos a caminhar com os pés firmes no chão, com robustez e segurança, mas a não perdermos o desejo do sonho, da elevação da alma, o amor acolhido e compartilhado como o pão, capaz de alimentar e fortalecer. Saibamos ver com perspicácia, mesmo nas densas noites da viagem da vida, quando surpreendidos pelas tempestades e escuridões, a beleza da luz, da presença d’Aquele que nos revela o sentido do nosso existir, a saber compreender e responder ao que desejamos e nos habita. 

Com a vossa ajuda e presença possamos caminhar este ano, não exilados de nós mesmos, mas com a inteligência que permita vivermos inteiros e completos, a reaprender a olhar o fundamento das coisas como se as mesmas constituíssem um limiar e não simplesmente a sua finalidade. Ensinai-nos a ser sagazes numa sabedoria que ilumine, fortaleça e alimente na busca da verdade, duma inteligência inclinada para o bem, a despertar em cada dia com um novo e purificado olhar.