Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com
“Pela vossa perseverança salvareis as vossas almas”
Vivemos numa época em que quase tudo é provisório. As relações, as ideias, as escolhas, tudo parece sujeito à revisão constante. O que ontem se afirmava com convicção, hoje é relativizado em nome da tolerância, da conveniência ou simplesmente da vontade imersa no tédio. A verdade tornou-se uma questão de gosto e a coerência, uma forma de obstinação. Neste cenário, a perseverança surge como uma virtude esquecida. Falar de constância num tempo de mudanças rápidas soa antiquado; insistir na fidelidade com princípios parece ingenuidade. E, no entanto, é precisamente essa capacidade de permanecer que dá densidade à vida humana.
Perseverar não é teimosia nem rigidez. É um ato de lucidez. É reconhecer que nem tudo se mede pelo prazer imediato ou pelo sucesso visível. É compreender que a maturidade exige continuidade e que o sentido das coisas só se revela a quem não desiste à primeira dificuldade. O relativismo promete leveza, mas muitas vezes entrega vazio. Quando tudo é igualmente válido, nada tem verdadeiro valor. A ausência de critérios não liberta; desorienta. É a perseverança que nos ancora, que nos devolve o sentido de direção, mesmo perante a incerteza. Ser perseverante é, de algum modo, um ato de resistência moral. É afirmar que vale a pena sustentar um compromisso, cuidar de uma relação, manter uma palavra. É acreditar que o tempo não destrói tudo, que há algo em nós capaz de atravessar as estações, de suportar as provas e de florescer de novo.
Num mundo que valoriza o instantâneo, a perseverança é uma forma discreta de coragem. É o gesto de quem escolhe permanecer fiel ao que considera essencial, mesmo quando isso não rende aplausos nem resultados imediatos. É, talvez, o último reduto da liberdade: a de não se deixar levar por todos os ventos. Vivemos, na verdade, imersos em tempos líquidos, como disse Bauman, tempos em que as convicções se diluem, os compromissos se tornam voláteis e as verdades parecem ter data de validade. A perseverança neste cenário é um anacronismo. Mas talvez seja precisamente isso que o nosso tempo mais precisa: pessoas que não desistam à primeira contrariedade, que não troquem o essencial pelo fácil, que não confundam movimento com progresso, que não se resignem à mediocridade e ao passageiro.
Perseverar é uma forma de resistência espiritual. É acreditar que o sentido não se muda conforme o vento, mas se descobre com paciência, na escuta e na entrega. É saber esperar, quando tudo convida à pressa. É continuar a amar, quando o amor se torna árduo. É manter a esperança, quando o mundo insiste no cinismo. Há uma beleza discreta nos que perseveram. Não brilham no imediato, não conquistam aplausos fáceis, mas constroem alicerces duradouros para si e para os outros. São os que permanecem firmes quando o ruído passa, os que sabem que o verdadeiro progresso é interior. Num mundo onde tudo se relativiza, perseverar é uma forma de fé, não apenas em Deus, mas também no bem, na verdade, e na própria humanidade. É escolher o caminho estreito da coerência, sabendo que é ali que o espírito encontra a sua liberdade mais autêntica, a porta para uma felicidade duradoura e frutuosa.