Por José Presa, presidente da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF).
O consumo de álcool está enraizado nos hábitos da população portuguesa, manifestando-se até nas faixas etárias mais jovens. De acordo com dados do Eurostat, Portugal é considerado o país da União Europeia com o consumo de álcool diário mais elevado, havendo uma incidência superior no sexo masculino.
 
No entanto, todos os excessos têm as devidas consequências e é mais importante do que nunca sublinhar a ligação das bebidas alcoólicas com o desenvolvimento das doenças hepáticas crónicas, a quarta maior causa de morte precoce no país e, na sua generalidade, derivada do consumo de álcool. Se pretende cortar o mal pela raiz e prevenir-se, pode aproveitar a oportunidade de começar o ano com melhores hábitos, aderindo à segunda edição da iniciativa “Janeiro Sem Álcool”, da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF).
 
A campanha, que decorre internacionalmente sob o mote “31 Dias Sem Álcool”, objetiva consciencializar a população para os danos causados pelo álcool e as patologias que advêm do seu consumo, como é o caso da cirrose, a fase mais avançada da doença hepática alcoólica. No entanto, é crucial entender que o início destas condições é silencioso e passa pela acumulação de gordura no fígado, um distúrbio conhecido por esteatose hepática ou fígado gordo, e que afeta cerca de 80% dos consumidores, já que o álcool facilita a concentração de ácidos gordos.
 
Esta gordura pode ser detetada com uma simples ecografia à região do abdómen, verificando- se através da visualização do fígado aumentado. Nas fases iniciais da patologia, é possível ser-se assintomático ou apresentar sinais como mal-estar, fadiga, dor na zona superior do abdómen, alterações no apetite e inchaço. No entanto, a evolução para quadros clínicos mais graves está associada a problemas de saúde mais debilitantes:
 
- Deterioração da função cerebral (encefalopatia hepática);
- Hemorragias;
- Pele e olhos com tonalidade amarela (icterícia);
- Acumulação de líquido no interior da barriga (ascite);
- Cancro do fígado (carcinoma hepatocelular).
 
Ainda que as lesões no fígado, no caso da cirrose, sejam permanentes e com a probabilidade de descompensação e falência do órgão, existe uma terapêutica associada e que pode atrasar a progressão desta doença que destrói o fígado e a sua capacidade de filtragem de elementos prejudiciais no sangue.
 
Nos casos iniciais, é possível minimizar os danos deixando de ingerir álcool e adotando uma dieta nutritiva, pobre em gorduras e rica em nutrientes. Por outro lado, nos estádios mais graves, poderá ser recomendada medicação que controle os sintomas. O transplante do fígado é apenas indicado quando o seu funcionamento está gravemente comprometido e as outras formas de tratamento não estão a ser eficazes.
 
Visto que o álcool é um dos elementos na base do desenvolvimento da doença hepática e as suas complicações potencialmente mortíferas, é necessário adotar uma postura reflexiva sobre o consumo deste tipo de bebidas, analisando comportamentos como:
 
- Dificuldade em parar de beber;
- Consumo isolado, fora de situações sociais;
- Indícios físicos de abstinência (ansiedade, tremores, suores excessivos, entre outros);
- Priorização do consumo em relação às restantes atividades do quotidiano;
- Agressividade ao ser confrontado com a dependência.
 
Se enfrenta este problema ou conhece alguém com atitudes aditivas, não hesite em recorrer a ajuda médica. Poderá ser necessário estabelecer um apoio multidisciplinar, que incida igualmente na esfera física e psicológica, englobando desde o hepatologista ao psicólogo clínico.
 
Desafie-se, com a ajuda da APEF, e torne o seu janeiro (e o resto do ano) isento de álcool.