MANUEL NETO DOS SANTOS leva «CÍRCULO DE FOGO» a Messines

11:05 - 19/03/2016 SILVES
Será apresentado o livro Circulo de Fogo de Manuel Neto dos Santos dia 20 de março pelas 17horas no Salão da Junta de Freguesia da Junta de São Bartolomeu de Messines. Integrado nas comemorações do dia mundial da poesia esta é a 18ª obra poética do autor e a sexta editada pela Arandis Editora.

MANUEL NETO DOS SANTOS: «CÍRCULO DE FOGO», ENTRE A POESIA E A FILOSOFIA Por Jorge Telles de Menezes

 Círculo de Fogo, de Manuel Neto dos santos é um livro que nos desvela espelhos da alma de um Poeta com uma aguda percepção da transitoriedade dos destinos humanos, incluído o seu próprio, um trânsito consciente, atento à materialidade do mundo e questionador da sua apercepção pelos sentidos como única via para o conhecimento. Neste livro Poesia e Filosofia encontram-se numa encruzilhada como velhos amigos abraçados no mesmo espanto inicial perante a vida: «Passo pelo mundo em fascínio; boquiaberto de espanto…»

 Não encontraria o Poeta melhor palavra do que a insubstancial alma, seguramente presente em tantas das suas páginas, para personificar a viagem que todos fazemos pela vida: «Vem, minha alma trôpega e anciã…», e esta palavra tão rica de interioridade inexprimível condensa o que o Poeta nos quer comunicar, a sua inquietude e esperança, mas também a sua espontânea adesão à vida enquanto matéria de reflexão: «adiro ao instante…». somos, assim, matéria inextinguível que assoma em sucessivas transfigurações, até um dia sermos talvez Nirvana. Platão e Buda perpassam por esta alma antiga levando-a, quem o sabe, um dia até à Perfeição.

 respiramos neste livro também o ideal de uma sociedade humana perfeita, ou finalmente humanizada, um impulso utópico para uma «pátria que não existe, nem nunca existiu». associado a esse utopismo, surge-nos igualmente um panteísta amor pela Natureza, como naquele «ciclo eterno…» que o Poeta anda a pôr em verso: «…pudesse eu ser como as flores e como os pássaros e todo o meu rumo se faria por dentro da alma». animada, plena de alma, é a Natureza, o homem anela a ser seu igual, por isso escreve o Poeta de forma eruptiva, sapiente da matéria que o constitui, e da vida que o atravessa, e se exprime como um «lúcido olhar trespassando a escuridão, como se existir não fosse uma tragédia mas sim a recusa da morte». se o Poeta dialoga com uma indefinível entidade que designa por alma, num jogo dramático de elevada expressividade, não deixa conjuntamente de indagar sobre o lugar da consciência enquanto macrocosmo da sua demanda: «Vejam como existe uma consciência atenta a tudo o que faço…» aí explana-se o delimitar de balizas entre o real e o imaginário, criando o Poeta um território em que o fenómeno eruptivo do poema afirma a sua soberania, existe por si só. Qual demiurgo, o Poeta investe-se num roubador do fogo divino, e consciente dessa apropriação pela intelecção do processo do pensamento, bem poderia afirmar como o pensador de ser e Tempo, «pensa-se em mim». Livre de vontade o Poeta deambula pelo seu imaginário na expectativa da erupção orgânica do poema saído da «confusão ardente da génese do poema». Na poetológica reflexão do autor o poema alcança um estatuto ontológico, nele existirá a possibilidade de o ser se desocultar.

 O ser manifesta-se na linguagem «amo a linguagem, numa turbulência inusitada, num contínuo fluir de imagens», vendo-se a si como «lugar onde as energias do universo ascendem para a linguagem…», o corpo e a mente como receptores dos códigos provindos do cosmos e da sua decifração humana. O Poeta interroga-se, contudo, filosoficamente, sobre quem é esse decifrador, quem é ele próprio, quem é o homem, afinal. No entendimento da sua mente poética, sintonizada com a evolução científica coeva, qualquer homem tem um tempo finito para reconfigurar a vida, apenas o tempo da sua existência, depois da morte todos os laços com a vida desaparecem, mas o poema sobreviverá como acendalha da própria vida, transcendendo assim a sua condição meramente objectal. O Poeta «caminha através da existência para a essência»… Nós diríamos que ele busca e encontra as essências que iluminam esta sua poesia na sua própria existência…

 

PALAVRAS TÍMIDAS PARA UM HOMEM INTEIRO por António Patrício Pereira

 Esta “coisa” de escrever sobre amigos ou a sua obra é, para mim, invariavelmente um “bico de obra”. Os amigos são amigos que mais posso eu dizer? aceito-os como me chegam no acaso dos dias, sem tirar nem pôr; com os seus defeitos e virtudes. assim de forma honesta e simples. de quando em vez convida-me um amigo para lhe alinhavar umas quantas palavras para apresentar ou prefaciar uma obra sua… Lá vou alinhando umas quantas desculpas (meio esfarrapadas umas outras sentidas na pele que por vezes os dias bem que nos ferram o dente na carne), para justificar o não. E que não se julgue má vontade, não! O que se passa é que nunca sei o que dizer, ou como dizer… Uma vez a negativa é aceite à segunda já sou eu que não tenho coragem para descartar o convite, por esse motivo aqui estou titubeante nas palavras a botar escrita sobre o meu amigo Manuel (Manuel Neto dos santos) e a sua obra “Círculo de Fogo”. Conheço o Manuel há tempo suficiente para lhe saber a maneira e o ser, a vontade e a alma, a inquietação e a paixão. Pelas palavras tem este homem uma paixão imensa, pela cultura um respeito digno. Bastará cinco minutos de conversa sobre as letras e as artes com este algarvio para que os seus olhos brilhem de contentamento… da inquietação faz caminho, por onde leva como trovador dos nossos dias a poesia dos que merecem ser cantados (os seus queridos Ary dos santos, Zeca Afonso, Florbela Espanca… daria uma longa lista a enumeração de tantos a quem o Manuel dá voz, corpo e alma). representa-os em palcos reais e imaginados. dá corpo e vida a uns e dá a sua voz a outros. Canta-os como poucos o fazem… com a verdade de quem sente um carinho sem fim pela palavra. Nesta vida de viagem constante vai ainda o Manuel dando forma à palavra… à sua palavra escrita, à sua lavra.  da escrita faz confissão dos dias, dos seus dias do seu tempo e sentir. derrama memórias, canta as suas raízes culturais que um dia se estenderam até à península vindas do Norte de África… guarda ainda na escrita o cheiro e a cor do gharb al-andalus. Terra que ama como poucos. Vai tecendo com palavras relatos de um sentir de esperanças feito. Um caminho interior que vai levando nas veias... É este tecer que se pode ler neste “Círculo de Fogo” que agora nos é dado. atrevo-me a dizer que, das obras que conheço do Manuel, este é a mais pessoal a mais intimista. Neste seu livro é o homem que se nos revela inteiro em carne viva.  

Cada pedaço de prosa deste livro é um poema; poemas onde o poeta conta a sua história...Não a da sua vida (essa um dia haverá biógrafo para no-la contar), mas a história do seu sentir… Conta-nos, pedaço a pedaço, o sentir a cada passo dado pelos caminhos do corpo e da alma. Há nesta escrita que agora nos é “atirada” para a leitura (não se admirem com a expressão “atirada” pois é isso que o autor nos faz. Confronta-nos de frente sem sofismas ou rodeios com o seu eu), uma condição que nos é imposta… a condição de seguirmos ao seu ritmo, ao seu lado passo a passo com o cromatismo que o autor quer. aqui é quem escreve que marca o ritmo, que repete os passos para que o leitor fique bem ciente da caminhada do escritor. Há uma vontade de transcendente nestes textos que tira ao leitor (ao contrário do que acontece na poesia do autor), a liberdade da forma… ou lê “de fio a pavio” cada pedaço de prosa ou perde um passo da vida interior do autor. Posso dizer, sem me enganar em muito, que Manuel Neto dos santos nos desafia a olhar o Homem pelo seu interior... Pela sua inquietação, que tem sido caminho e mantimento de um respirar. E com isto voltamos ao princípio (eu e os leitores que tiveram a paciência de me acompanhar nestas minhas pobres e desajeitadas palavras). O que ora tem o leitor em mãos é uma obra/retrato que lhe propõem a inquietação desta vida que não se esgota na carne que a veste. Ou seja, é esta a obra inquieta, viva de um homem inquieto e vivo… É esta a obra de uma vida.

O retrato interior de um ser que É.