CÓDIGO DA PRAXE

10:02 - 15/05/2016 OPINIÃO
por Miguel Duarte | Escritor, DJ e Tradutor | jmduarte.md@gmail.com

Dou de barato que as praxes académicas não são todas iguais. Ao fervor militar que a ocasião inspira, há sempre quem fure a parada logo à primeira tasca e enverede por longas exibições de fraternidade sobre pratos de linguiça e ternuras ao litro.

            Mas, em nome da verdade, convenhamos que a norma não é esta. A maioria prospera ao arrepio de uma sociedade que, à mínima comichão, tudo julga à luz da opressão popularizada no Estado Novo.

            Ora, aqui, os dux e seus acólitos são bons herdeiros desta paixão lusitana. Se de pequenino se torce o pepino, envergam-se títulos honorários em substituição de outros que a formalidade ainda nega. Nem que o título seja o de pulha-mor, exercitado em praças e jardins, onde experimentam o gosto pela boçalidade e ensaiam as estratégias de gestão que mais tarde aplicam em firmas, partidos e em casa.

Enquanto aparelho de poder coercivo, percebe-se bem o pitoresco fascínio que suscita o rasto de agressões, humilhações, comas e até mortes que as praxes vão deixando à laia de “brincadeira”. Regurgitados da secção de virologia, estes bullys de biblioteca esmeram-se então quando toca a explicar a sua noção de “integração.” Em época de crise, vão mesmo ao fundo do saco, onde jaz o argumento final, a rebentar de moralidade: “ninguém é obrigado…” Percebe-se logo porque as assessorias deste país têm as suas fileiras preenchidas.

Por isso, há sempre quem defenda isto. Defendem-no os veteranos, que pretendem testar ainda novas práticas humanitárias. Defendem-no as ex-vítimas, porque agora as vítimas são outras. Desfilam os caloiros convertidos, felizes por se verem livres do insustentável peso do amor-próprio.

Como lição histórica, claro, não há melhor metáfora do que uma horda de noviços submetidos à autoridade por esticão duma auto-proclamada elite de batina, cuja enfarpelada credibilidade se cinge, no fundo, ao saber enciclopédico de botecos de aguardente e boutiques de emblemas.

De facto, com uma noção tão sofisticada da ideia de “integração”, é espantoso que não tenha ainda ocorrido ao governo poupar os desfavorecidos deste país ao calvário de empregos e subsídios, e recomendá-los, em vez disso, à sabedoria dos dux, para um curso intensivo de acrobacias coitais e aeróbica de galinheiro. É que, numa sociedade de laureados, imaginem o jeito que não dava saírem à rua com a Ordem de São Beberrão colada a cuspo na lapela.