EN125

19:10 - 06/08/2016 OPINIƃO
por Miguel Duarte | Escritor, DJ e Tradutor | jmduarte.md@gmail.com

Poucas, ou nenhumas, das atrações de que o Algarve está recheado podem, no auge do verão, suplantar as maravilhas que um passeio pela “nossa” EN125 oferece a quem lá anda.

Há de tudo um pouco. Espreite-se por cima do volante e vê-se toda a panóplia de criaturas e comportamentos que a humanidade tem para mostrar. Há carros e motas. Há carroças. Há pessoas dentro de carros e motas e carroças, e ainda pessoas em cima de bicicletas e camiões.

Depois, há toda uma cultura! Deveras, para quem atravessa o Algarve de uma ponta à outra por esta rua fica invariavelmente a sensação de aventureirismo que, por regra, está reservada apenas aos mais intrépidos exploradores.

A culinária está toda lá, dividida por mil e uma capelinhas de credibilidade variável. Sai-se do restaurante e temos logo ali uma drogaria, porque o autoclismo precisa de remendo. E as vacinas do cão? Há o veterinário logo ali ao lado! Vacinas para o dono são na farmácia mais adiante. E mecânicos, já que o carro não pega. Depois temos também carpintarias, gráficas, supermercados, floristas… Com tanta emoção, o melhor é parar no parque aquático para refrescar as ideias.

Como é óbvio, cercado por todo este colorido, não pode deixar de sobressair no automobilista, aqui e ali, uma certa propensão para a tragédia e o folclore. Logo ali dois matulões enfeixam-se um no outro, levados por guinadas assíncronas. Iam distraídos com a inglesa espampanante que se espreguiçava no descapotável ao lado. A inglesa, espavorida de tanta comoção, foge. Desvairada, embate num motociclista que desafiava a sorte numa segunda faixa imaginária. Os dois matulões, saídos cada um do seu alazão, esgrimem argumentos à lei do tabefe. Quem ganhar chega à praia primeiro! E o trânsito parado. Nos dois sentidos. Esperam-se ambulâncias. Debalde. Alguém pôs ali um separador central e o motard já se esvaiu em sangue. Há, portanto, morte, bravata, gritos – e a sagração do mártir na figura do automobilista. Bilhetes para o 1º balcão só na Via do Infante – uma estrada sem piada que uma elite empedernida usa para se manter a leste da vida.

Por cidades, vilas e aldeias, a 125 aninha-se no coração dos algarvios. É, à vista de todos, a maior montra de biodiversidade do país. Não consigo é perceber porque é que se cobra para usar a Via do Infante. A Via do Infante é um tédio. É segura, não tem nem um buraco. É o epitáfio do romance. Não me surpreende que esteja sempre às moscas. Porque a diversão mora toda na 125. E esta é que deveria ser paga! Em nome do aproveitamento turístico e da valorização dos nossos ativos.