Biblioteca Municipal de Silves | «ROSTO DO PAI, FACES DEIFICADAS» INAUGURA A 08 DE OUTUBRO

09:40 - 29/09/2016 SILVES
«Rosto do Pai, faces deificadas» é a exposição de Maria Teresa Cabrita que abre portas no próximo dia 08 de outubro, pelas 16h00, na Biblioteca Municipal de Silves, encerrando no dia 5 de novembro.

A entrada é livre. Mais informações através do telefone 282 440 899 ou do email biblioteca@cm-silves.pt.

 

SOBRE MARIA TERESA CABRITA:

Maria Teresa Cabrita Fernandes Cadete tem o Curso de cerâmica da Escola Artes Decorativas António Arroio e o Curso de Pintura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa.

Fez o Mestrado em História da Arte, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, com o tema “Pintura Mural em Portugal nos finais da Idade Média, princípios do Renascimento”.

Frequentou o Terceiro Ciclo na Universidade da Coruña, no programa: Património Histórico e Cultural de Galícia.

É doutorada pelo Departamento de Historia da Arte, da Universidade de Santiago de Compostela, ctendo defendido uma tese sobre “Análise comparativa da pintura mural do Noroeste Peninsular (Galicia-Norte de Portugal, 1500-1565)”.

É professora de Artes e História da Arte (P.Q.N.D) no Ensino Secundário.

 

SOBRE A EXPOSIÇÃO:

De: Rocha de Sousa

O rosto humano é máscara e janela, ambas fechadas ou abertas, símbolo de sinais meio escondidos que fazem da alma uma entidade colada à mitologia religiosa e aos seus habituais símbolos, deuses, profetas, entidades messiânicas, caminhos afinal pelos quais julgamos espreitar a transcendência. Seja como for, se não há civilização sem o testemunho e o imaginário das artes, também é difícil arrancá-las às mais diversas liturgias das mais diversas religiões, confundidas, abrasadoras, mas em qualquer dos casos envolvendo o homem em apegos indizíveis, em crenças populosas e atentas aos sinais dos céus, quer para a purga dos pecados, quer para as demoradas guerras santas.

Todas as antigas culturas fizeram do azul, por exemplo, uma cor relacionada com a divindade. Os egípcios ligaram-na à verdade, isto é, aos deuses. Nas paredes das suas tumbas e templos é possível observar pinturas de sacerdotes inteiramente revestidos dessa cor. Nos ícones, todos os corpos são representados altos e magros, desprovidos de qualquer volume, e essa aparência, máscara também, emerge da roupagem ampla e escorrida até ao chão, passos insensíveis, a ocultação da espera e do desejo.

A fé no lado transcendental do mundo e dos seres apareceu amplamente, sobretudo na antiguidade, como pelos rostos inventados desta coleção de faces fixas cria também simbologia na rigidez representativa. As gentes embrulhadas entre si, e embora afirmando-se num quotidiano de mobilidades, rezavam em plena imobilidade, como a das imagens, como a destes rostos únicos e simétricos na rigidez. A ignorância sobre a iconografia bizantina (porque a ausência de qualquer gesto pode denotar ação), não chegou para rejeitar o agir atrás dos olhos parados, apesar dos indecisos mitigarem paz no sentido de superar os contrastes das palavras ditas em torno da salvação um dia.

 Adiando análises sobre a complexa morfologia dos corpos, míticos, copiados da nossa peculiar humanidade, envolvidos nas roupas, véus e coroas, compreende-se contudo uma primeira passagem por aqui, por esta simbologia de matéria fútil sobre e a sagração de certas imagem; revendo assim o modo como nos confrontamos, etnias de ontem e de hoje, desencantos entre homens ou mulheres, algo que de súbito se solta da sua natureza simples e quotidiana, resgatando distantes aparências das elites romanas, assumindo o fausto de antigos trajes, linhas bordadas, coroações, efeitos em torno do pescoço, o golpe, a vida, a morte. E outras sinalizações do ser e do aparecer, conspirando negócios e poderes, entre condecorações perenes. Faixas de ouro. Populaça rindo ao longe.

Daqui, desta moda que enchia o Senado de Roma, brotaram os mais simples fatos dos padres do cristianismo primitivo, culto depois consagrado ao quadro de religião do Império, organizada em pirâmide como todos esses modelos, e tendo os seus “funcionários”, na despectiva hierarquia até “Pedro”, modelos bíblicos e apropriadamente sinalizados, roupa na diferença, subindo para vermelhos, desde os neutros párocos aos padres, bispos, arcebispos e aos cardeais, antes das regras, do sumo Pontífice, das farturas entre séculos, sinais quase geométricos a ponderar a segurança muito posterior dos rostos em medalha, desde os sinais mais simples ao trabalho de uma iconografia multiplicadora d0s olhos e das bocas, como se o filho de Deus incutisse nos homens e nas mulheres, não a guerra, mas a simbiose dos retratos

Em ordem à paz. Olhemos então as representações em azulejo com relevo destas figuras mais ou menos representativas do mundo eclesiástico ou da própria história que a Bíblia conta. E é curioso como tudo isso acontece, através dos escribas do Novo Testamento, e como os pintores representaram, através de mais de um milénio, o rosto de Cristo. Nas catacumbas, o ícone adorado circunscrevia-se (em fenómeno cultural) a um rosto de rapaz coroado por cabelos encaracolados como na estatuária grega. O rosto lembrava um homem novo, belo, atlético, pintado sobre uma base simples e anotado como a primeira memória de Cristo. Já não há essa face. A Igreja queria rostos de um Cristo Profeta, eventualmente com a sua aura cintilando o poder vindo de Deus para distinguir o Filho e o papel que lhe recomendara. Podemos, contudo viajar por rostos de um Cristo sol, de um Cristo primitivo, ou de outros geminados, lembrando uma idade para além dos trinta anos e como que a geminação profética de Pai e Filho. Quase ao contrário, a beleza rústica de um cristo escavado na matéria, lembra mais o tão esquecido rapaz grego, mas a forma plástica apela à simplicidade de uma iconografia emblemática e aliás mais convincente do que as centenas dos rostos de Jesus que naufragaram antes de Renascença. Vieram aqui repor um estranho realismo, na Última Ceia, por exemplo, ou no expressionismo inesperado da cena da crucificação. A dor, a beleza de certas versões de Cristo, tudo isso passa por metamorfoses ao longo da evolução da igreja e das escolas de pintura. Mas, no domínio iconográfico de natureza popular, a figura que a História não conseguiu fixar aparece, apesar de tudo, no imaginário coletivo, desde a grandeza do ícone misterioso, ao alto nas igrejas ortodoxas, até ás geometrias simétricas, algumas parecendo legadas às crianças, outras como flores de pétalas em bico ou gatos humanizados ou senhores de aristocracias em caricatura mas donos da sua coroa  pairando.

 

Por CM Silves