Aleppo, na Síria, e Mosul, no Iraque.

14:09 - 22/12/2016 OPINIÃO
diogoduarte@campus.ul.pt

Duas cidades onde as forças militares sírias e iraquianas combatem, com apoio Russo e Norte-Americano, respetivamente, o Daesh (ou Estado Islâmico). Duas cidades devastadas pelo conflito bélico, destruídas pela intervenção militar, e reféns dos extremistas islâmicos. Duas cidades com uma realidade tão próxima, mas tão distantes à luz da comunicação social.

A crescente mediatização do conflito bélico instalado em Aleppo, e o proporcional silêncio mediático acerca de Mosul, levantam legítimas dúvidas sobre a eficácia, escrutínio e posicionamento político dos grandes meios de comunicação. De Aleppo, onde o governo sírio combate o Daesh com apoio da Rússia, chegam-nos as mais tristes histórias e imagens que o conflito militar tem gerado. Da escassez de alimentos, água e saneamento, aos milhares de mortos e feridos, passando pelos episódios de verdadeiro sofrimento e desespero humano, o espaço noticioso do Ocidente, reservou um espaço exclusivo sobre o conflito militar em Aleppo.

Em contraste, a guerra entre o governo iraquiano, apoiado pelos Estados Unidos da América, e o Daesh, somente em situações de excepção é retratada no espaço mediático. Mesmo quando ai é retratada, surge sobre a forma de rasgados elogios pela forma como o governo iraquiano tem retomado a cidade de Mosul.

Estas duas realidades, às quais têm sido, consistentemente, aplicados critérios de escrutínio diferentes, deveram-nos fazer reflectir sobre os interesses geoestratégicos e geopolíticos que ambas as situações encerram.

Com efeito, para compreender a abordagem militar os Estados Unidos da América, devemos, num exercício histórico, recuar no tempo. Ao longo do último século, foram centenas as intervenções militares norte-americanas em todo o mundo. Na maioria destas intervenções, o silêncio ou a reserva informativa foi uma constante. Relembremo-nos do famoso caso da Guerra do Vietname de 1955, onde o grande número de baixas militares contrastava grandemente com o discurso de vitória do, então, Presidente Richard Nixon. Num outro caso, este mais recente, os meios de comunicação demonstraram ser pouco incisivos sobre a invasão do Iraque, em 2003.  Ainda que as razões que fundamentaram a invasão tivessem vindo a demostrar-se desconformes com a realidade, o posicionamento mediático foi pouco abrasivo, resumindo-se ao papel de justificar que “os erros acontecem”.

O conflito militar de Mosul não desalinha destes mesmos princípios. Não obstante da gravidade da situação de Aleppo, o desfoque mediático de Mosul, oculta uma onda de morte e de destruição. Apesar dos bombardeamentos norte-americanos terem já atingido escolas e hospitais de Mosul, a informação continua a eximir-se ao grande público. Pelo contrário, é manifesta a sensibilização para o conflito de Aleppo, que tem levado parte da Comunidade Internacional a reprimir a ofensiva russa.

Repetidamente, e em jeito de propaganda, lançam-se juízos políticos enviesados e discriminatórios. E estes juízos alinham-se com um único factor comum: a actuação unilateral. Também esta não é novidade, tendo mesmo ecos históricos já conhecidos, como é o caso da invasão do Iraque e dos conflitos militares no Afeganistão e no Paquistão.