Um palhaço que é um hamster ou um rato que é algo mais que um rato? «Hamster Clown», uma megaprodução teatral do Teatro do Elétrico que vai estar em Loulé a 16, 17 e 18 de julho, no Cineteatro Louletano.
Pela primeira vez a Sul há um dia (17) com o serviço de audiodescrição, para pessoas cegas ou com problemas graves de visão, através da descrição da peça em direto, mediante a utilização de tecnologia específica para o efeito.
A peça surgiu da junção do encenador Ricardo Neves-Neves com o “palhaço” português Rui Paixão, que já trabalhou com o Cirque du Soleil, mas ao contrário do que se possa pensar, não é teatro infantil. Para além de não ter texto, traz ao palco universos alternativos, como os das drag queens, a identidade de género e algum surrealismo à mistura. O Hamster, nas palavras de Ricardo Neves-Neves, pode não ser afinal tão inofensivo quanto parece:
“Não vemos esta personagem como um animal, mas antes como um homem ou uma mulher, não fechamos o género, e olhamos para ela pensando que, em vez de ter havido uma evolução darwiniana do homem a partir do macaco, houve a partir de um hamster. Penso que qualquer espectador verá ali uma pessoa, com características diferentes e um desvio genético. Depois, a partir desta figura começámos a falar de tudo, do universo de terror, de questões ligadas ao drag queen... aprendi há pouco tempo que drag vem do Shakespeare, Dressed As Girl... e é isso que fazemos aqui, temos um rapaz vestido de rapariga. Depois, em cima disso, o Rui mostrou-me alguns vídeos de uma artista britânica, a Juno Birch, que tem um universo muito divertido e, ao mesmo tempo, um rasgo que queima e é ácido. Esse humor atraiu-nos, essa possibilidade de termos uma coisa azeda em cima do espetáculo. A peça ficou com muito disso, esse verde do podre, do pesadelo, do pântano, uma treva com bactérias. Ao mesmo tempo, é uma coisa meio alienígena, que identificamos mas que não é do nosso planeta”, explica o encenador numa entrevista publicada pelo Teatro São Luiz.
Já para Rui Paixão, que carrega às costas do Hamster o peso aparente da ausência da palavra, o desafio de não haver texto pode traduzir-se numa grande vantagem, em termos artísticos:
“Para mim, o teatro físico não é a substituição da palavra. O que as pessoas vão ver em palco não é um texto que não está a ser dito ou que está a ser mimado. O teatro físico existe como uma escrita radicalmente diferente. Se aqui as imagens são as palavras, é normal que elas sejam diferentes para os diferentes criadores e para os espectadores. E ainda bem. O método que o Ricardo tinha para comunicar comigo eram as palavras e o método que eu tinha para comunicar com ele era o meu corpo em movimento. E encontrarmo-nos neste cruzamento foi o desafio deste processo. Aqui estamos a dar imagens que depois quem vê pode ampliar para vários significados. É como a poesia oriental, em que tudo é dito mais por imagens do que por palavras concretas”.
Com uma cenografia pensada ao pormenor, recorrendo a cores vibrantes, caracterização levada ao exagero, música intensa e efeitos visuais e sonoros complexos, Hamster Clown é uma peça que não é fácil de encontrar todos os dias: “Gosto dessa ideia de ser uma coisa fora do comum, estranha, de não ter medo do teatral, de ir ao teatro ver uma coisa que é excecional, fora do quotidiano, que não vejo se não for a uma sala de espetáculos. É para isso que pago bilhete para ir ao teatro, para ver algo que não veria na rua”, conclui Rui Paixão, o clown que dá vida ao hamster “fora da caixa”.
“Hamster Clown” é uma coprodução do Cineteatro Louletano, Teatro São Luiz (Lisboa) e Centro de Arte de Ovar.
Recorde-se que o Cineteatro - que este ano celebra não só os 91 anos como também os 10 anos da reinauguração após as obras - é uma estrutura cultural no domínio das artes performativas da Câmara Municipal de Loulé, integrado na Rede Azul – Rede de Teatros do Algarve e na Rede 5 Sentidos e que ostenta o selo “Safe and Clean”, atribuído aos equipamentos que zelam pelas regras de higiene e segurança da Direção-Geral de Saúde.