Programa de Recuperação e Resiliência pode vir a ser uma «mão cheia de nada»

10:16 - 09/08/2021 OPINIÃO
Luís Gomes, Professor da Faculdade de Economia do Algarve, faz um balanço positivo do PRR aprovado por Bruxelas para Portugal, mas teme que a sua implementação venha a sofrer entraves devido à burocracia do próprio Estado.

Portugal foi pioneiro na elaboração, e aprovação, do Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) mas a sua implementação pode vir a esbarrar na burocracia e na falta de atualidade dos Programas Diretores Municipais (PDM) que serão uma barreira. O alerta parte do Professor da Faculdade de Economia da Universidade do Algarve, Luís Gomes, que há vários anos estuda o ordenamento do território na região algarvia e no país.

“Os Planos Diretores Municipais que temos hoje em dia estão completamente desatualizados. A lei obriga a que sejam revistos de 10 em 10 anos, mas, por exemplo, aqui no Algarve há casos de PDM que não são mexidos há quase 30 anos. Isto pode ser desastroso para a implementação do PRR, porque até podem existir boas ideias, bons planos de investimento, mas se o território não permitir que esses projetos se instalem na região, o PRR não passará de uma mão cheia de nada”, avisa Luís Gomes.

A primeira tranche, de 2,2 mil milhões de euros, já chegou ao nosso país, mas o Professor da Universidade do Algarve lembra que é preciso adaptar o Estado à atualidade.

“O PRR está bem delineado e é importante para colocar Portugal a par dos restantes parceiros, principalmente nas questões ambientais e tecnológicas, mas isso não basta. O PRR tem que ser concretizado e é aqui que começam os problemas. Se houver um plano para uma empresa tecnológica se instalar no Algarve com recurso a fundos públicos dificilmente sairá do papel porque não será fácil encontrar um município com um PDM capaz de aceitar esse investimento. Mesmo no domínio da saúde, é quase impossível construir um novo hospital se houvesse essa vontade”, adverte.

Luís Gomes é a favor de uma descentralização cada vez maior para que o poder local tenha um papel mais decisivo na própria gestão territorial à semelhança do que ocorre em países como a Espanha e Inglaterra. Desta forma seria assim possível captar o melhor investimento, sobretudo quando há fundos públicos que podem ser aproveitados.

“Os municípios terão um papel fundamental e terão que negociar diretamente com o Governo para que as alterações necessárias aos PDM não fiquem presas nas gavetas dos ministros. Não podemos levar três, quatro, cinco anos a aprovar um novo PDM, porque nessa altura a bazuca já acabou”.

O Programa de Recuperação e Resiliência tem um montante total avaliado em 16,6 mil milhões de euros para fazer face aos efeitos provocados pela pandemia de covid-19. Estão previstos investimentos para tornar o país mais sustentável, as empresas mais digitais e a economia e a sociedade mais fortes e mais resilientes.