Tempos de mudança na Europa

09:30 - 03/04/2022 OPINIÃO
André Magrinho, Professor universitário, doutorado em gestão | andre.magrinho54@gmail.com

Na sequência da invasão da Ucrânia pela Rússia, ainda sem fim à vista, no momento em que escrevo estas breves linhas, 33 dias após o seu início, avizinham-se tempos de mudança na Europa, na sua política de relacionamento económico e estratégico externo, na segurança e defesa, bem como em matéria de transição e segurança energéticas.

Aliás, estes foram os temas centrais nas recentes cimeiras sucessivas da NATO, do G7 e da União Europeia e Conselho Europeu, contando com a participação do presidente dos EUA, Joe Biden, e dos dirigentes europeus, tendo a invasão da Ucrânia como pano de fundo. Realço três aspetos que considero relevantes. Primeiro, o comércio internacional da União Europeia, impulsionado durante as últimas três décadas pelas deslocalizações industriais para a Ásia, sobretudo para a China, e pela dinâmica das “cadeias globais de valor”, orientadas apenas pelo racional puro e duro da rentabilidade económica, vai sofrer alterações bastante substantivas.  

Os aspetos de segurança económica e estratégica, vão ganhar peso e ter uma ponderação importante quanto aos riscos geopolíticos. Os elevadíssimos níveis de dependência da China, em coisas tão simples quanto equipamentos médicos, ou dependências do gás fornecido pela Rússia acima dos 40%, como sucede com a Alemanha, ou mais de 80% nalguns países do norte da Europa, serão trajetórias desaconselháveis. Segundo, a União Europeia que se demitiu, ao longo dos anos, de ter uma segurança e defesa comuns, pelo menos digna desse nome, na convicção de que os EUA seria eternamente o seu “guarda-chuva protetor”, no quadro da NATO, sem grande esforço financeiro, vai mudar de rumo.

Aliás, a aprovação no último Conselho Europeu da “Bússola Estratégica”, definindo as linhas de orientação estratégica em matéria de segurança e defesa para a próxima década, é sintomático disso, do mesmo modo que o é o compromisso assumido de afetar pelo menos 2% do PIB nos orçamentos dos respetivos países para a segurança e defesa.

Terceiro, a transição energética, que a União Europeia está empenhada no âmbito do Pacto Ecológico Europeu (Green Deal), não só vai ter que acelerar, mas também requer um melhor planeamento no conjunto da UE, dando particular importância à segurança energética, investindo nas energias renováveis, algumas delas a caminho da maturidade, como as eólicas e o solar, mas que que têm limitações pelo facto de serem intermitentes.

É fundamente investigar e investir em novos vetores energéticos mais disruptivos como o hidrogénio e a fusão nuclear (não confundir com fissão nuclear), que se espera serem portadores de soluções mais robustas, a prazo, em matéria de produção de energias limpas. Mas, até lá, é necessário gerir de forma inteligente as energias de transição, como o gás natural, que continuará a fazer parte ainda por bastante tempo do mix energético. A este propósito, é de sublinhar o compromisso assumido pela presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen e o presidente dos EUA, Joe Biden, no passado dia 24 de março, em Bruxelas, comprometendo-se a trabalhar em conjunto para apoiar a segurança energética da Europa, reduzindo de forma sustentável a dependência energética em relação à Rússia, investindo na transição para as energias limpas e, fornecendo volumes adicionais de gás natural liquefeito (GNL) para o mercado da UE de, pelo menos, 15 mil milhões de metros cúbicos em 2022. O Porto de Sines pode desempenhar aqui um papel importante como hub para a receção e distribuição de GNL.