PALAVRAS DE FOGO: DESAFIO PARA UM RENASCER | SOMOS LIVRES

09:44 - 05/05/2022 OPINIƃO
Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

“Foi para a liberdade que Cristo nos libertou.” (Gl 5, 1). Contemplo uma fotografia que data de 1975. Estou sentado na calçada da terra que me viu nascer, juntamente com outras crianças, vestido com um bibe de infantário. Desenho no papel disposto no chão uma casa. Ao revisitar-me nessa fotografia reacendo sempre a palavra de uma canção, que enchia a praça nesse dia e que guardo desde aí no meu coração: “Uma gaivota voava, voava/ Asas de vento/ coração de mar/ Como ela, somos livres/ somos livres de voar”.

Foi o primeiro poema que saboreei e depressa aprendi. Palavra que me acompanha a vida toda e me ajuda a desenhar com mais profundidade e precisão os alicerces da casa que sou e que vou edificando. Ser livre é ter asas. É ser alto como o vento, largo e profundo como o mar.

Tantas vezes foi isso o conteúdo dos meus sonhos. Agora sei, ser essa luminosa palavra de Ermelinda Duarte, num belo poema intitulado: “Somos livres”. Palavra ecoada numa manhã que se desejou nova, augúrio de um futuro a reflorescer em liberdade. Sou filho da liberdade. Desse valor fundamental da nossa existência e um dos pilares que sustentam o edifício do nosso universo histórico; abrigo da nossa frágil condição de seres racionais no tempo e fio condutor que contribui para formar a urdidura da sociedade que desejamos sempre mais justa e fraterna.

A liberdade, dimensão constitutiva e inalienável da pessoa, que não se esgota, todavia, na sua autonomia. Infelizmente, o tempo parece deixar a convicção que, a liberdade sem limites, se tornou a expressão principal da autonomia do homem. Tudo o resto é visto, na verdade, como um limite ao seu progresso e valor: Deus, a religião, a exigência ética e moral. Esqueceu-se que a liberdade é caminho que orienta para o bem e que a verdadeira liberdade é um sinal exímio da imagem divina no homem. Esqueceu-se que não há liberdade sem limites. E que é quando se vive em liberdade, mesmo diante dos obstáculos mais hirtos, que nos modelamos e a edificamos.

A liberdade não pode morrer. É urgente abrir portas a novas manhãs. A liberdade precisa ser libertada do mal e do fechamento egoísta onde a vemos arvorar-se em divindade criadora. Não pode mais haver liberdade quando por preconceito ideológico se assiste, ainda hoje, a uma subversão de princípios e de valores preconizados por uma euforia legislativa que com rosto democrático põe em questão o respeito sagrado e a defesa da vida humana desde a sua conceção ao seu fim natural; que adultera e desresponsabiliza o amor humano no que tem de mais sagrado e belo e se põe em questão a família, santuário dessa dignidade e viveiro dessa responsabilidade; não pode haver mais liberdade quando se pretende resolver problemas preocupantes da sociedade e grandes desafios lançados pelas questões fundamentais da nossa existência com soluções pragmáticas não dignificantes e mesmo aviltantes da grandeza da pessoa. Somos uma civilização em crise, porque querendo ser livres aprisionamos a liberdade.

Por isso, faço, hoje, no desejo da verdadeira liberdade, uma prece: “Dai-me a liberdade em Primavera/ Tempo para poder escutar o silêncio/ Ouvir as águas das fontes beijar a terra/ Calai os mascarados de democracia/ Os que gritam povo e semeiam podridão/ Demagogos que vestem de hipocrisia/ Dai-me a luz dessa alvorada profeta e nova/ Poder viver duma fé não amordaçada/Amar e sonhar numa terra mais humana/Dai-me inteira e pura a Liberdade!”