Sem uma ação drástica, os resíduos plásticos poderão superar todos os peixes nos oceanos até 2050

12:39 - 09/07/2022 OPINIÃO
André Magrinho, Professor universitário, doutorado em gestão | andre.magrinho54@gmail.com

A Conferência dos Oceanos das Nações Unidas de 2022, organizada por Portugal e pelo Quénia, que teve lugar em Lisboa, de 27 de junho a 1 de julho, trouxe a Lisboa, muitos dos mais importantes decisores político-institucionais e representantes dos Estados-membros da ONU, e mutas outras partes interessadas, em relação aos assuntos do mar e da proteção e preservação dos Oceanos. Dela saiu a Declaração de Lisboa, intitulada “O nosso oceano, o nosso futuro, a nossa responsabilidade”, um documento-guia, porventura o mais ambicioso jamais produzido sobre os oceanos, indo além do diagnóstico e definindo prioridades, a que correspondem mais de 2 mil compromissos, dos quais cerca de 670 quantificáveis, envolvendo mais de 10 mil milhões de euros.

O Secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, deu o mote logo na sessão de abertura, ao referir que temos uma “emergência do Oceano” e para lhe fazer face é necessário “virar a maré”, porque esse oceano que nos une e conecta está doente. Depois de citar Fernando Pessoa: “Deus quis que a terra fosse toda uma, que o mar unisse, já não separasse", António Guterres, fez um diagnóstico sombrio da situação atual dos oceanos.

Na verdade, o nível do mar está a subir e o aquecimento global está conduzindo as temperaturas dos oceanos a níveis recordes, criando tempestades mais fortes e frequentes; as inundações nas nações insulares são cada vez mais frequentes e intensas, assim como nas principais cidades costeiras do mundo; a crise climática está a acidificar o oceano e a interromper a cadeia alimentar marinha; os recifes de coral estão branqueando e morrendo;  a poluição da terra está criando vastas zonas costeiras mortas e a degradação dos ecossistemas costeiros é cada vez mais preocupante; cerca de 80 por cento das águas residuais são despejadas no mar sem tratamento, acrescendo cerca de 8 milhões de toneladas de resíduos plásticos que entram nos oceanos todos os anos (uma massa de plástico no Pacífico é maior que a França), em áreas cada vez mais vastas e remotas e nas fossas oceânicas mais profundas, destruindo a vida marinha e provocando grandes danos às comunidades que dependem da pesca e do turismo.

E, como referiu António Guterres, “sem uma ação drástica, esse plástico poderia superar todos os peixes nos oceanos até 2050”. A ligação dos oceanos às alterações climáticas ficou bem vincada nos diversos compromissos assumidos, com a constatação que não há uma transição verde sem uma transição azul, plasmada nomeadamente no compromisso assumido por mais de 100 Estados com o objetivo de protegerem 30% das áreas marinhas até 2030, ou ainda na criação da Aliança Mundial contra a acidificação, envolvendo governos e as ONG, com o propósito de evitar o aquecimento dos mares e a sua acidificação. De salientar também, no âmbito da Organização Mundial do Comércio, o propósito de proibir a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, tornando as pescas mais sustentáveis.

O futuro dirá se a segunda Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, realizada em Lisboa, se vai traduzir numa plataforma de ação efetiva em favor da proteção e preservação dos oceanos ou, como muitas vezes sucede nas grandes conferências e fora internacionais, se ficará apenas pelas boas intenções.