Foto A Voz do Algarve | D.R.
Taxa variável continua a dominar crédito habitação: porquê?

09:12 - 15/05/2023 ECONOMIA
Taxas fixa e mista são mais caras «no imediato», aponta o BdP. E há falta de oferta em Portugal, devido aos riscos de cobertura.

A maioria dos portugueses continua a preferir contratar empréstimos habitação de taxa variável, mesmo num momento em que a Euribor está a caminho dos 4%, um patamar atingido em 2008. Mas porque é que as famílias não optam mais pela taxa fixa ou pela taxa mista? Os elevados custos “imediatos” é um dos principais fatores que condicionam a procura, a par da falta de oferta de créditos habitação a taxa fixa ou mista no nosso país, aponta o Banco de Portugal (BdP).

Em dezembro de 2022, nove em cada dez famílias contavam com créditos habitação a taxa variável e indexados à Euribor, que está a escalar mês a após mês à medida que o Banco Central Europeu (BCE) aperta a sua política monetária (já subiu as taxas diretoras em 375 pontos base). “Esta caraterística do mercado de crédito à habitação português traduziu-se numa transmissão rápida do aumento das taxas de juro diretoras do BCE” e, por conseguinte, as prestações da casas suportadas pelas famílias aumentaram (e muito), analisa o regulador português no Relatório de Estabilidade Financeira publicado esta quarta-feira, dia 10 de maio.

Mas porque é que as famílias portuguesas continuam a optar pela taxa variável num momento em que a Euribor está a escalar e o clima financeiro instável? Foi isso mesmo que o BdP procurou saber junto de 10 instituições bancárias, que representaram 94% deste mercado em dezembro de 2022. Entre os fatores que condicionam a procura de empréstimos habitação com taxa fixa ou mista destacam-se:

  • os elevados custos imediatos: geralmente os contratos de taxa de juro fixa/mista têm uma taxa de juro mais elevada e as famílias não se encontram disponíveis para pagar o prémio associado à maior segurança da contratação a taxa fixa, num contexto em que os preços das casas continuam elevados e os rendimentos líquidos são baixos;
  • Literacia financeira dos mutuários: perspetiva de curto prazo e foco na prestação inicial (percecionada como fixa pelos mutuários). Mesmo quando as taxas de juro variáveis estão próximas das taxas fixas (como agora acontece), há sempre a perceção de que a variável pode descer e a fixa não.

Todos estes fatores limitam a procura de empréstimos habitação com um período de fixação da taxa de juro, o que tem levado à predominância dos créditos a taxa variável em Portugal, conclui o regulador liderado por Mário Centeno. Mas com o aumento das taxas de juro variáveis, que gera a subida das prestações da casa, “tem levado a uma maior proporção destes empréstimos [com fixação de taxa] nas novas operações”, aponta.

Taxa fixa e mista: há mais procura, mas oferta é limitada

A verdade é que a proporção de novos empréstimos à habitação com algum tipo de fixação da taxa de juro (fixa ou mista) aumentou nos últimos anos em Portugal, representando cerca de 15% do montante de novos empréstimos em 2022. “A contratação de um crédito habitação com taxa de juro fixa ou mista reduz a incerteza associada à capacidade de serviço da dívida dos mutuários, em particular na atual conjuntura de subida das taxas de juro”, explicaram os bancos que participaram no inquérito do BdP.

Para 2023, a maioria dos bancos acreditam que a procura de crédito habitação com taxa de juro fixa e mista aumentará, enquanto 20% consideram que irá diminuir. E há outra razão para isto acontecer: em muitos casos pode ser a única forma de aceder ao montante de crédito habitação pretendido. Isto porque nos créditos de taxa variável, os bancos têm de calcular a taxa de esforço somando à taxa atual um adicional de 3% para prevenir situações de risco de incumprimento. Esta medida macroprudencial eleva a taxa de esforço para um patamar superior a 35%, impedindo um grande número de operações ou reduzindo o valor que os bancos estão autorizados a emprestar. Este calculo não se aplica às taxas fixas ou mistas, sendo mais fácil obter a aprovação do montante necessário para comprar casa.

A questão é que a oferta de crédito habitação a taxa fixa em Portugal ainda é limitada, apesar de haver mais bancos internacionais no país que, por atuarem em mercados com maior tradição taxa de fixa, têm contribuído para o alargamento desta oferta. Acontece que ainda há um leque de bancos em Portugal que não concederam créditos habitação a taxa fixa (40%) ou mista (30%) em 2022.

Mas, depois de o Governo ter lançado uma medida no Mais Habitação, que visa obrigar os bancos a apresentar ofertas a taxa fixa e mista, “75% das instituições que não concederam crédito com taxa de juro fixa e/ou mista em 2022 planeiam oferecer esta alternativa contratual em 2023”, refere o relatório.

Entre os fatores que condicionam a oferta de créditos habitação com taxa fixa ou mista em Portugal destacam-se:

  • cobertura do risco de taxa de juro: as coberturas "pain vanilla" (com swaps de taxas de juro) não cobrem os riscos de amortização antecipada. E as coberturas "tailor made" (cobrem o risco dos juros e de resgate antecipado) são caras e nem sempre estão disponíveis. Além deste tipo de cobertura tornar os empréstimos mais caros, também condicionam a possibilidade de alterar o tipo de taxa de juro durante a vida do empréstimo (enquanto mudar de taxa variável para fixa é mais fácil);
  • comissão pelo reembolso antecipado do empréstimo de 2%: esta penalização pode ser inferior ao prejuízo de terminar a cobertura de risco de taxa de juro e é mais pertinente em fases de descida das taxas de juro, quando o risco de mercado aumenta;
  • as perdas líquidas que podem afetar os resultados da instituição e o respetivo capital regulamentar.

 

Por: Idealista