Os primeiros vestígios arqueológicos de Santo António de Arenilha, localidade na foz do rio Guadiana que antecedeu a Vila Real de Santo António, foram encontrados numa ermida de Castro Marim, revelou o historiador Fernando Pessanha.
O investigador algarvio disse à agência Lusa que a localização das pedras nobres da ermida de Santo António, edificada na vila de Santo António de Arenilha, foi agora encontrada na ermida homónima de Castro Marim, ao ser decifrada, pelo seu colega historiador Marco Sousa Santos, uma inscrição que as relaciona com o capitão da Alcaidaria-Mor de Santo António de Arenilha, António Leite (1542), que as trouxera do norte de África quando Portugal deixou o Forte de Seinal e Alcácer Ceguer (1550).
Com formação académica em História da Expansão Portuguesa e investigação realizada sobre a presença portuguesa no norte de África, Fernando Pessanha disse que este achado é o resultado de um trabalho iniciado a partir de uma “pista” contida num “breve apontamento” do também historiador e investigador Hugo Cavaco, que, em 2010, “chamava a atenção para uma notícia de umas pedras que tinham vindo do Forte do Seinal para Arenilha”.
Fernando Pessanha seguiu “o rasto biográfico do capitão que trouxe estas pedras” para Santo António de Arenilha com o objetivo de fazer “a reconstituição possível, de acordo com as fontes documentais disponíveis”, das condições em que essas pedras tinham vindo para a ermida na foz do Guadiana.
“E essas pedras, portanto, vieram para cá no contexto da reformulação da estratégia norte-africana de D. João III, que é quando as nossas praças marroquinas começam a ser abandonadas e, ao fim ao cabo, é quando se começa a dar o primeiro processo de descolonização da História de Portugal”, afirmou o também historiador do arquivo municipal de Vila Real de Santo António.
A mesma fonte assinalou que António Leite “tinha sido capitão de Mazagão, tinha sido capitão de Azamor e estava a acumular funções” de alcaide-mor de Arenilha e de capitão do forte do Seinal quando, “em 1550, o rei D. João III manda despejar também o forte do Seinal e Alcácer Ceguer”.
O alcaide-mor de Arenilha ficou então ”responsável por fazer a evacuação da vila e do forte” de Seinal e “não deixou as pedras nobres para serem utilizadas pelos mouros”, uma vez que se tratavam de elementos “nobres de natureza cristã”, justificou.
As pedras nobres acabariam por ser trazidas para Portugal e passar a fazer parte da igreja (da Trindade) e da ermida (de Santo António) de Santo António de Arenilha, observou.
Fernando Pessanha contou que, recentemente, o também historiador Marco Sousa Santos, conhecedor das suas investigações, seguiu o pedido de “uns populares que, em Castro Marim, chamaram a atenção para a singularidade de alguns materiais pétreos” que se encontram na ermida de Santo António local.
“Tiraram fotografias, meteram no grupo de Facebook para ver se alguém conseguia ler a inscrição epigráfica numa das pedras. Foi então que o meu colega e amigo Marco Sousa Santos, historiador de Arte, ao ler a epigrafia, lembrou-se dos trabalhos que eu tinha publicado e associou a inscrição epigráfica àquilo que tinha lido nos meus artigos”, realçou.
O investigador algarvio esclareceu que foi assim identificado o Brazão de Armas do capitão António Leite e lida a epígrafe - que “diz que aquele é o tampo do altar-mor que tinha mandado fazer o capitão António Leite quando estava por capitão no Seinal” -, permitindo localizar as pedras nobres da ermida de Santo António de Arenilha.
“São as únicas evidências materiais que existem sobre a antecessora de Vila Real de Santo António”, salientou, argumentando que o conhecimento existente sobre a vila de Santo António de Arenilha “tinha por base fontes escritas” e, agora, “para além do papel, da multiplicidade de registos escritos, gráficos, há também o registo arqueológico”.
Por: Lusa