Estudar o passado ditatorial é o caminho para se preservar o futuro democrático.
Quem nasceu depois de 1974, não sabe o que é viver distante de uma democracia. Para as novas gerações, o retrato de um país desgastado por um regime ditatorial parece algo distante, só conhecido pelos livros de História ou pelas histórias dos avós.
Não conhecem outra realidade, existindo um inevitável afastamento emocional daqueles que têm hoje de preservar a liberdade de amanhã, já que olhos que não veem, coração que não sente.
Mas como tornar o 25 de Abril mais do que um desenho de cravos na escola? Como explicar o que é a liberdade, porque não há aulas e porque se celebra este dia com tanta emoção?
25 de abril: como se explica a liberdade às crianças?
Chegada a esta data, cravos vermelhos começam a ser coloridos na escola, mas a sensação de ser mais uma atividade atropela a importância deste histórico ponto de viragem.
A resposta está em adaptar a linguagem, contar histórias com o coração e trazer o passado para o presente das crianças.
O que é uma ditadura? Explicação simples para crianças
Numa altura de crise e sem alguém capaz de governar, abriu-se espaço para que António de Oliveira Salazar concentrasse em si os poderes, mudasse as leis do país e instalasse uma ditadura durante 41 anos. O que é isso? Todas as pessoas tinham de fazer o que ordenava e, por isso, não existia liberdade.
Assim, quem mandava em Portugal não permitia que se pensasse de forma diferente; que se lesse qualquer livro, ouvisse qualquer música e visse qualquer filme.
A maioria das pessoas mal sabia ler ou escrever e muitas crianças deixavam de ir à escola a partir do 4.º ano, já que tinham de entrar cedo no mercado de trabalho.
Os vizinhos podiam fazer queixas à PIDE – a polícia severa e intolerante da altura – e as pessoas eram facilmente punidas com multas ou presas. Além disso, existia uma lista com tantas outras proibições, que hoje nos parecem inconcebíveis, entre elas:
• Não se podia votar livremente;
• Não era permitido grupos de pessoas reunirem-se;
• Os casais não podiam beijar-se na rua;
• A coca-cola era proibida;
• A maioria das mulheres não podia andar sozinha na rua à noite, só acompanhada pelo marido ou por algum familiar masculino;
• Era preciso uma autorização para andar de bicicleta.
Por que desenhamos cravos no 25 de Abril?
Na madrugada de 25 de abril de 1974, os militares uniram-se para acabar com a ditadura. Não foi uma guerra. Foi uma revolução pacífica. A música foi o sinal. Na rádio ouviu-se a canção de Paulo de Carvalho e Zeca Afonso, como sinal de que estava a começar a desenhar-se a revolução.
E os cravos? Bom, os cravos nasceram do gesto de Celeste Caeiro, que ofereceu flores aos soldados como agradecimento. Eles colocaram-nas no cano das espingardas, mostrando que não iriam disparar. E assim os cravos vermelhos tornaram-se o símbolo da liberdade. Assim se justifica a origem do nome "Revolução dos Cravos".
“No meu tempo não era assim”: a frase típica dos mais velhos
Importa evidenciar os contrastes por meio de exemplos práticos e quotidianos para que as crianças tentem visualizar-se privadas de vários direitos que beneficiam hoje.
Além das que foram apresentadas a cima, podes dar a conhecer, por exemplo, as inúmeras diferenças na escola, onde passam a maior parte do dia, antes da chegada da democracia a Portugal:
• Rapazes e raparigas não podiam estudar na mesma escola;
• Às alunas não era permitido usar calças nem ter os braços ou joelhos à mostra;
• As professoras podiam fazer uso de uma palmatória para repreender os alunos mal-comportados e fazê-los usar orelhas de burro;
• Os alunos eram obrigados a cantar o hino e rezar antes de iniciar a aula.
Livros que ajudam a contar a história do 25 de Abril
Existem ainda vários livros que auxiliam na explicação da temática do 25 de abril:
• “A Escola e os Cravos” de Luís Lobão Moniz;
• “Avó, onde é que estavas no 25 de abril”, de Ana Markl;
• “Vinte cinco a sete vozes” de Alice Vieira
• “História de uma flôr” de Matilde Rosa Araújo e João Fazenda.
O que é a liberdade?
Liberdade é poderes dizer o que pensas, sonhar com o que quiseres e seres quem és, sem medo. É poderes estudar, votar, rir, discordar, amar e viver com dignidade. É ter o direito de ser vulnerável e não precisar de se encaixar num padrão.
E é por isso que 25 de Abril continua a ser uma data viva: porque os direitos que temos hoje foram conquistados com coragem.
51 anos depois: o que o 25 de Abril nos lembra em 2025?
Com 51 anos de democracia, Portugal já viveu muitas mudanças. Em 1975, nas primeiras eleições livres, participaram 91,5% dos eleitores. Hoje, muitos não vão votar.
Em 2022, mais de 48% dos portugueses não foram às urnas. Um sinal de que, por vezes, esquecemos o quanto custou conquistar este direito.
Além das diferenças a nível demográfico, assistiram-se também alterações ao nível da habitação sendo que o número de casas duplicou e passou ainda a registar-se um aumento de casas vazias.
Ensinar às crianças o valor do 25 de Abril é garantir que a liberdade continua viva — mesmo quando não a vemos, ela está presente em tudo o que somos e fazemos. “Olhos que não veem, coração que não sente” — por isso, mostra, explica, conta. Porque se crescer em liberdade é um privilégio. Entendê-la, é um dever.
Idealista News