Vai votar em Loulé? Cuidado com quem vem no pacote…

10:30 - 08/05/2025 OPINIÃO
Nuno Vaz Correia | Licenciado em Comunicação | nunovazcorreia@gmail.com

Com a aproximação das eleições autárquicas em Loulé, os holofotes voltam-se inevitavelmente para os dois principais candidatos à presidência da câmara: Telmo Pinto, do PS, e Hélder Martins, do PSD. São dois candidatos com experiências diferentes, ambos com visibilidade, ambos com maquinaria partidária por trás. Mas a verdadeira pergunta que se impõe não é apenas “qual deles merece ser eleito?”. A pergunta mais pertinente — e mais incómoda — é: quem os acompanha?

Numas eleições autárquicas, o cidadão é levado a acreditar que está a escolher uma pessoa. Um líder. Mas a realidade é bem mais complexa. Cada candidato traz consigo uma equipa — e, muitas vezes, traz também compromissos ocultos, nomes que não aparecem no cartaz, mas que se posicionam para governar a câmara por dentro, nos gabinetes e corredores, longe da vista do eleitor. É essa teia invisível, que raramente é escrutinada, que define grande parte do futuro de um concelho.

Dentro dos partidos, a constituição das listas e de quem fará parte da “máquina” autárquica é frequentemente um campo de batalha. As escolhas não são apenas políticas — são também pessoais, estratégicas e, por vezes, até económicas. Há pressões dos caciques locais, há imposições das direções distritais, há trocas de favores, há “lugares prometidos” a quem deu um empurrão na hora certa.

Esta realidade não é exclusiva de Loulé, mas manifesta-se aqui com especial nitidez. Quem acompanha de perto a política local sabe que há figuras que gravitam à volta da câmara há décadas, mudando de posição, de pelouro ou até de cor partidária conforme sopra o vento. São rostos que talvez nunca terão destaque numa campanha, mas que surgem assim que a vitória está garantida — como prémio ou como imposição.

E quando a pressão é demasiada, até o mais preparado dos candidatos pode ceder. Cede porque precisa de manter o partido unido. Cede porque há promessas feitas. Cede porque não quer — ou não pode — romper com o status quo.

E o que acontece quando a equipa é escolhida com base em compromissos e não em competência? A resposta está à vista em tantos concelhos do país: vereadores sem experiência a liderarem departamentos complexos, assessores cujo único mérito é a lealdade, decisões tomadas não por estratégia, mas por conveniência. E quem sofre com isso é o munícipe.

Loulé é um concelho com enormes potencialidades, mas também com desafios sérios. Precisa de gente capaz, informada, crítica. Gente que saiba dizer “não” quando for preciso, mesmo ao presidente. Mas o que se vê, demasiadas vezes, é exatamente o oposto: uma câmara dominada por pessoas que apenas querem ficar bem vistas junto do presidente, que não questionam, que não incomodam, que fazem parte da engrenagem sem nunca desafiar o rumo.

É assim que os projetos se arrastam por anos, que as obras são inauguradas incompletas, que as decisões estratégicas são adiadas indefinidamente. Não por falta de vontade do presidente — mas por falta de estrutura à sua volta. Uma má escolha da equipa não se nota na primeira semana. Mas os efeitos acumulam-se com o tempo. E quando se torna evidente, já é tarde demais.

Outro fenómeno digno de atenção são os chamados “independentes”. Pessoas apresentadas como figuras da sociedade civil, como soluções técnicas, como sinais de renovação. Mas será que são mesmo independentes?

Há quem entre nas listas partidárias como “independente” apenas para escapar ao escrutínio ideológico, quando na prática está alinhado com os interesses do partido. Outros são convidados apenas porque emprestam prestígio à lista, mas não têm qualquer peso político real. E alguns são simplesmente uma fachada — um verniz novo para esconder as velhas práticas.

A verdade é que há muito poucas escolhas neutras em política. E cada nome que entra numa lista tem, quase sempre, uma história por trás. É essa história que o eleitor tem o direito de conhecer — e que quase nunca lhe é contada.

No final, o voto de outubro vai muito além de Telmo Pinto ou Hélder Martins. Vai definir que tipo de câmara Loulé terá nos próximos quatro anos: uma autarquia sólida, liderada por uma equipa competente, ou um executivo instável, marcado por compromissos internos, lealdades sem critério e decisões condicionadas.

E há algo mais: em política, muitas vezes, quem manda não é quem aparece. É quem está por trás. É quem fala ao ouvido. É quem impõe condições em troca de apoios. É quem está já, neste momento, a tentar garantir um lugar na futura estrutura municipal, mesmo antes de se conhecer o resultado das eleições.

É por isso que o voto deve ser consciente, informado, exigente. Não basta olhar para o candidato. É preciso perguntar: quem o rodeia? Quem o influencia? Quem está na sombra à espera do poder? Porque em Loulé, como em tantas outras terras, o verdadeiro pacote do voto nem sempre está à vista. E o perigo maior é elegermos um rosto… e sermos governados por outros.