CARTAS À QUINTA | PARA UM CUIDAR DA FRATERNIDADE

09:04 - 08/06/2025 OPINIÃO
Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

Caríssimas Abelhas, estimadas irmãs,

Há um murmúrio no ar que não é vento. É zumbido. É verso. É aviso. Sois vós, estimadas abelhas a dançar no ar como quem escreve cartas invisíveis ao mundo. Cartas que nós, apressados, não lemos mais. Viveis juntas, como nós deveríamos. Cada voo vosso é uma escolha. Cada flor, um gesto de cuidado. E nós, que nos dizemos racionais, livres, sábios, esquecemos tantas vezes de florescer. De contemplar. No silêncio. Esquecemos que o planeta não gira só em torno dos nossos pés. Da nossa velocidade tantas vezes desorientada. A vossa colmeia é um espelho do que todos poderíamos ser: Coletivos, interligados, generosos no serviço. Vós não explorais, colaborais.

Em linguagem cristã, particularmente interpelativa neste tempo, diria: viveis com verdade a sinodalidade. Caminhais juntas. Não roubais da flor: trocais com ela. Mas nós cortamos as árvores que visitais e envenenamos o pólen. Chamamos de "progresso" o que talvez seja apenas pressa de conquistar egoisticamente ou destruir. Vós abelhas sois frágeis e sábias, carregais nos pelos o segredo da vida, cada uma, tão pequena. Todas, vulneráveis, mas indispensáveis. Como nós deveríamos ser: não gigantes, mas necessários. Não dominadores, mas cuidadores. Se vós desapareceis, vai-se junto a poesia das manhãs, o sabor das frutas, o futuro das estações.

E nós, que esquecemos de ouvir o zumbido com a disciplina de um exército e a graça de uma orquestra, teremos que, aprender a escutar o silêncio que fica. Pareceis insetos comuns, voando em busca de néctar, mas, se observadas com cuidado, revelais mais sobre nós do que gostaríamos de admitir. Em vós há ordem, dever, hierarquia. A rainha no centro, as operárias na lida, os zangões com seus papéis passageiros. Cada uma com sua missão, sem perguntas, sem pausa para devaneios. Não parece, por vezes, o nosso mundo? Acordamos, corremos, cumprimos funções, atendemos expectativas. Produzimos. Voamos de flor em flor, entre compromissos, e voltamos ao ninho com o que conseguimos colher. Vós abelhas, não vos queixais. Sois fiéis à colmeia, como muitos são fiéis ao sistema.

Algumas morrem sem jamais saber o gosto do mel que ajudaram a fabricar. Soa familiar? Quantos de nós passamos a vida toda trabalhando por um bem maior que, no fim, talvez nunca tocaremos com os próprios dedos? Mas não é tudo fragilidade e rigidez. Há beleza no vosso voo. Há poesia no zumbido que enche a tarde. E talvez seja essa a lição que nos sussurrais com vossas asas vibrantes: mesmo em meio ao dever, há espaço para a dança. Mesmo que nunca provemos o mel, o simples fato de criá-lo já é uma forma de eternidade. Somos como abelhas, seres de trabalho e sonho, ordem e instinto, mel e ferrão. E se um dia faltarmos, como vós, o mundo sentirá a falta. Talvez mais do que imagina. Faltará um murmúrio que não é vento. A poesia. Um canto de beleza. O necessário e essencial que salva o mundo.