Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com
Caríssimos Corvos, estimados irmãos,
Sois os pássaros mais enigmáticos e emblemáticos do reino animal, considerados animais de uma notável inteligência com raras e persuasivas habilidades cognitivas. Também habitais solene e religiosamente a quinta da nossa Cidade. Reveste-vos brilhantemente o negro das noites e das sombras. A vossa presença traz-nos mistérios e temores, inquietações e medos. Aviva ansiedades e anúncios.
eManifestais o poder do oculto nos muitos segredos que guardais silenciosamente nos vossos olhos carregados de melanina e atentos. É fácil lembrar-vos neste período outonal carregado de melancolia e saudade e pressentir a vossa presença neste inquietante e escuro mês de novembro que inicia. Como não recordar que fostes vós a ensinar os humanos a sepultarem os seus mortos desde o fratricídio de Caim e Abel? Sois na cultura popular contemporânea, aves omnívoras com status superior, muitas vezes considerados símbolo da sabedoria e da inteligência, da proteção, da astúcia e do mistério, mensageiros do além, sendo mesmo retratados como verdadeiros guias espirituais.
Neste tempo, em que recentemente sepultámos uma das vozes mais românticas do País e tantas outras vozes e palavras sinuosas enchem de algazarra as nossas ruas, ferindo a beleza do canto e de outras palavras nas quais nos devíamos revelar, era tão importante que nos ensinásseis a libertação desses pânicos disseminados que nos assaltam e do desamparo em que nos mergulhamos pelos muitos labirintos da angústia e do medo. Alguns, na verdade, acreditam e dizem que representais o pensamento e a memória divina simbolizando a busca pelo conhecimento e a sabedoria.
Neste mês onde agoniza a escuridão e assomam a melancolia e a solidão, vinde ensinar-nos a aprender o poder da vulnerabilidade, a saber rezar os nossos vazios, a sabermos nos desprender das amarras que nos impedem de ver a verdade e o bem, a cultivar uma verdadeira sabedoria pela qual possamos nortear a nossa vida.
Sois considerados por muitos outros como mensageiros do outro mundo, guardiões dos segredos da natureza e verdadeiros mestres de conhecimentos ocultos. Convosco podemos aprender muito sobre a terra e sobre os céus, sobre a morte, mas também sobre o valor do renascimento. Nascemos muitas vezes ao longo da nossa vida sempre que nos abrimos à luz e hospedamos a vida, fazemos reflorescer o amor. Nascemos tantas quantas vezes aceitamos também morrer como o grão de trigo semeado para dar fruto. Vós nos ensinais a importância da proteção como a da transformação.
Na jornada da vida, voando connosco, como companheiros da esperança, com a vossa inteligência e curiosidade inata nos ensinais a valorizar a aprendizagem e a sabermos expandir o nosso conhecimento. Ao construirdes a vossa casa no cimo dos postes, no alto das árvores, nos ensinais profundamente a verticalidade da vida, a ascender o olhar, a alargar o coração, a saber que dentro da nossa vida também precisamos de árvores para vislumbrarmos a aurora para lá da escuridão, a vida para além da morte. Neste tempo, ensinai-nos a ver o que ainda não vemos.