Nesta entrevista, os colaboradores João Ferreira e Viriato Villas-Boas abordam o trabalho desenvolvido aos longo destes últimos anos e explicam como se efetuam adoções responsáveis.
A Voz do Algarve (V.A.) – A ARA é uma Associação com provas dadas de trabalho e que é de conhecimento da grande maioria dos algarvios. Contudo, para quem não segue de perto o vosso trabalho, como se pode definir a Associação? E qual é a dimensão do vosso espaço?
João Ferreira (J.F.) - A ARA é uma Associação sem fins lucrativos que visa resgatar animais que estejam em necessidade de serem recolhidos e faz a sua reabilitação, com o objetivo de encontrar novas famílias para os cães e gatos. Temos aqui 5 hectares, que contém 48 canis e 12 (em breve 14) parques, onde os animais podem passar todo o dia livres. Nessas duas novas áreas, que estão atualmente em construção, queremos ter vários tipos de solo, desde relva, piscina e caixas de areia e também vários brinquedos, que tornem a sua rotina agradável.
V.A. - Quantos animais abriga a ARA?
J.F. - Atualmente temos 118 cães e 53 gatos. Estão 18 cães em famílias de acolhimento temporário e é importante explicar que utilizamos este método de adoção em três casos específicos: animais seniores em final de vida; animais em lista de espera, que não podemos ainda receber pela falta de capacidade e bebés alimentados a biberão ou animais em período de vacinação.
V.A. - Quais são os objetivos da Associação e que trabalho desenvolve para além destes 5 hectares?
Viriato Villas-Boas (V.B) - Os nossos objetivos oficiais são o desenvolvimento da causa animal no Algarve, tendo em vista o envolvimento da comunidade. Existe aqui o compromisso de salvar milhares de vidas, de uma forma séria, como outras IPSS’s. Queremos estruturar e profissionalizar a causa animal, aliando aqui a educação da população. Temos feito um trabalho nas escolas, por exemplo, onde se promovem as adoções, mas também as boas práticas e a forma correta de lidar com os animais. Tal como é objetivo do Governo, deixa de existir uma “objetificação” dos animais e passa a existir o tratamento dos mesmos como “seres humanos”, explicando isto de forma simples, em que os animais passam a ser parte integrante de uma família.
V.A. - A ARA tem ainda as exposições fotográficas de Carlos Filipe, conhecido como fotógrafo de animais…
J.F. – Sim, temos várias sessões já realizadas e, recentemente, puderam ver alguns dos nossos animais em cartazes colocados no Mar Shopping Algarve, de modo a incentivar a adoção e a proteção dos mesmos – as fotografias são do Carlos Filipe. Neste momento temos parcerias com vários shoppings. Temos ainda parcerias com várias escolas de crianças e escolas de animais e «spas para cães». Temos, por exemplo, uma parceria com Zen Dog, em Vilamoura, onde todas as terças-feiras dedicam o dia a animais do nosso espaço e fazem tratamentos desde banhos a tosquias, tudo de forma voluntária. Desta forma, o animal sente-se muito mais confortável depois. Temos também parcerias com os Escuteiros e os Bancos Alimentares.
V.A. - Como é que os animais chegam até às instalações da ARA? Como se desenvolve esse processo?
J.F. - Infelizmente, diria que não necessitamos procurar estes animais. Chegam-nos diariamente vários e-mails e telefonemas através das redes sociais e pessoas que se dirigem às nossas instalações a pedir ajuda para animais nas mais diversas situações. Por norma, damos prioridade a animais que estejam em situação de risco ou que vivam nas ruas. Ainda há muitos animais nas ruas, especialmente em meios rurais.
V.A. – Quais são as etapas até chegarem à parte da adoção?
J.F. - Por norma começamos por pedir às famílias que preencham um inquérito pré-adoção para termos noção do estilo de vida e das rotinas dessa família e, depois, marcamos uma visita. Em seguida, mostramos todos os nossos animais e o espaço da ARA e, de certa forma, conseguimos logo perceber o tipo de animal que é procurado e começamos a fazer uma “triagem” e selecionando alguns animais para manter um contacto mais direto com os interessados na adoção. Essa parte depende muito de cada animal também, porque há alguns que dão mais confiança do que outros. Nós exigimos uma segunda visita, em que a família irá direcionar-se então para o animal escolhido. Tratamos depois dos papeis de adoção e dos termos de responsabilidade. Queremos evitar adoções por impulso, portanto todos os animais saem com microchip em nosso nome e durante três meses vamos seguindo a situação – se existir algum problema, podem regressar. Todos os animais com mais de seis meses de idade saem esterilizados e, se forem ainda menores dessa idade, recebem um voucher para descontos.
V.A. - Depois de serem adotados, fazem o seguimento dos animais? Como é que escolhem uma família para aquele animal específico?
J.F. - Faz parte também do nosso trabalho tentar que as famílias percebam se aquele cão ou aquele gato se encaixa no seu estilo de vida. Deste modo, tentamos direcionar alguns animais, consoante o “tipo” de família que o venha adotar. Temos de perceber, por exemplo, se uma família tem um estilo de vida ativo e tem crianças, talvez um animal mais velho possa não ser o ideal. Essa parte tem corrido muito bem. Fazemos um acompanhamento via telefone, assim como visitas pessoalmente e quem adota os animais acaba por ir partilhando fotos connosco. Segundo a nossa última contagem, já foram adotados mais de 900 animais em quatro anos de trabalho.
V.A. - Acreditam que têm conseguido sensibilizar as pessoas para a adoção, não só de cães bebés, como de seniores?
V.B. - Sim, sem dúvida. Hoje já vemos uma mudança nas mentalidades, em que são adotados muitos mais animais adultos, com problemas físicos e com algum tipo de doença, que outrora seriam logo descartados.
V.A. - Quanto custa manter anualmente as instalações da ARA? Como conseguem fundos?
J.F. - Atualmente pode chegar aos 500 mil euros anuais. Para suportar os custos, diria que um dos pilares mais fortes é o nosso fundador, o Sr. Sid Richardson, mas também temos uma grande ajuda que são as lojas de caridade. Atualmente temos duas lojas, uma situada em Almancil e outra situada em Loulé, que funcionam com voluntários, e em que pegamos em doações de particulares (roupa, brinquedos, livros, artigos de decoração, entre outros) e os colocamos à venda, esse dinheiro reverte para a ARA. Para além disto, temos ainda doações de particulares, que nos conhecem, seguem o nosso trabalho e querem ajudar os animais.
V.B. - O Sid é britânico, mas tinha já ligações ao Algarve devido a empresas que tinha cá. Antes da ARA, o fundador já apoiava a título particular várias causas animais, até que começou a pensar em materializar o seu gosto pelos animais criando ele próprio o seu “espaço” de apoio a cães e gatos. Obviamente que, para a criação da ARA, foi feita uma avaliação da realidade e das carências que existem. Todo o espaço da ARA foi projetado e concessionado pelo Sid, portanto diria que estamos a viver dentro do seu sonho. O Sid é uma pessoa muito inteligente, que conseguiu criar uma equipa de confiança, que o ajudasse na conceção do seu sonho. O fundador pretende erradicar todo o tipo de sofrimento animal no Algarve e, se possível, que sejam adotados.
V.A. – A Associação tem protocolos com clínicas? Existe alguma flexibilidade nesse sentido?
J.F. - Atualmente temos protocolo com três clínicas, uma delas chegamos a ir várias vezes por dia. Podemos contar com essas clínicas diariamente, dirigimo-nos ao local, mas também fazem domicílios aos nossos espaços. Os preços têm um desconto, por sermos uma associação. Todos os nossos animais são esterilizados, vacinados, micro chipados, desparasitados e testados contra as doenças mais comuns. As cirurgias e intervenções que sejam necessárias também são realizadas nestas clínicas, com as quais temos protocolo, e acrescento que são um suporte muito importante para o nosso trabalho.
V.A. - Todos podem ser voluntários na ARA? Que tipo de voluntariado existe?
J.F. - Para além da equipa fixa, nós temos dois tipos de voluntariado: o local, em que as pessoas escolhem o horário e o número de horas que fazem. Depois temos uma parte muito importante, que é o trabalho que desenvolvemos com a plataforma de voluntariado Workaway, em que damos estadia e, em troca, os interessados fazem 5 horas de trabalho voluntariado. As pessoas, que vem de todos os sítios do mundo, ficam alojadas na ARA, uma vez que temos casas móveis neste espaço. É interessante perceber que muitos voluntários acabam por adotar animais e mudam as suas vidas quando regressam aos seus países de origem. Já recebemos mais de mil voluntários em quatro anos. Comprámos recentemente um terreno adjacente e estamos a desenvolver mais espaço para voluntários e parques sociais para os nossos animais.
V.A. - A nível de doações, o que precisa a ARA?
J.F. - Numa associação com cerca de 150 animais, tudo é útil. Desde a alimentação, trelas, coleiras, camas e mantas, precisamos de tudo, porque os cães destroem muitas coisas. Aceitamos também tudo o que seja ligado a produtos de limpeza, artigos para as nossas lojas e doações diretas de dinheiro. Temos o nosso site e o Facebook e o Instagram atualizados. Convidamos todos a visitarem esses espaços, para conhecerem o nosso trabalho e, se houver essa vontade, ajudar com alguma destas coisas que mencionámos acima, para além de termos as portas abertas para receber voluntários.
V.B. - Queria apenas acrescentar que as pessoas se devem sempre lembrar de que os animais são uma mais valia para os Municípios e para a vida dos cidadãos. Temos de os proteger, por todas as questões que aqui fomos falando, mas também porque é uma questão de saúde pública e de coesão territorial não ter cães e gatos abandonados nas ruas. Deixo o repto para que se apoiem com cada vez mais afinco as associações de animais.
Por: Nathalie Dias