Qual o futuro da alfarroba na nossa região? Serão os produtos biológicos e o bioetanol uma aposta sustentável? Isaurindo Coelho Chorondo, responde com uma visão positiva em relação ao futuro.

Desde os 12 anos que tem conhecimento do ramo, altura em que parte do transporte de frutos secos era feito de carroça, como recorda Isaurindo Chorondo, que é hoje gerente da única empresa de transformação da semente de alfarroba em Portugal. O empresário tem apostado em expandir o negócio e a mais recente prova disso é a construção da nova unidade fabril, maior e com mais capacidade, que deverá entrar em funcionamento muito em breve.

 

A Voz do Algarve – Começou muito jovem a trabalhar com o seu pai Joaquim Chorondo. Com que idade exatamente começou a exercer essa atividade?

Isaurindo Chorondo – Quando comecei tinha por volta dos 12 anos, mas não se pode dizer que era trabalhar, era sim colaborar. Há 40 anos, as coisas funcionavam de maneira diferente, os jovens começavam cedo a ajudar os pais, quer na agricultura, quer noutras atividades que tinham. Não havia as condições que hoje os jovens têm. Entrei neste negócio aos 18 anos, depois de acabar o liceu e comecei a trabalhar a tempo inteiro com o meu pai. Tinha mais interesse na vida profissional do que na escolar, porque comecei a ganhar apetência. Hoje, as pessoas procuram aquilo que lhes dá mais proveitos, mas naquela altura procuravam aquilo que lhes dava mais prazer. Na época o meu pai tinha uma pequena transformação de Alfarroba na localidade da Tenoca, em Boliqueime, onde hoje é a sede da empresa. Comprava frutos secos aos agricultores que, posteriormente, eram vendidos aos exportadores. Mais tarde, em 1988, o meu pai, eu e a minha irmã fundámos uma pequena empresa a Chorondo & Filhos, Lda, que se dedica à transformação da alfarroba e também ao comércio de outros frutos secos, principalmente a amêndoa e figo.

 

V.A. – Mais tarde, a aquisição da Industrial Farense, já sob a sua administração, proporcionou um novo folego e uma nova aposta na indústria da semente. Como surgiu esse desafio e como tem sido o seu percurso e desenvolvimento?

I.C. – A entrada da Chorondo e Filhos no capital da Industrial Farense, em 1993, com uma participação, proporcionou à Chorondo uma maior e mais rápida visibilidade neste sector, visto a Industrial Farense já ser uma empresa exportadora e conhecida mundialmente. Também foi muito importante para ambas as empresas esta parceria, porque assim a Industrial Farense tinha assegurado uma grande parte da matéria-prima necessária à sua atividade e a Chorondo também ficava com o escoamento das sementes assegurado. No entanto existiam mais duas unidades de transformação da semente em Faro, nessa altura, o que fazia que a região tivesse que importar semente em quantidades significativas de outros países, principalmente Espanha e Marrocos. Nestes últimos anos a região tem exportado a semente principalmente para Espanha, muitos milhares de toneladas.

 

V.A. – As instalações da Industrial Farense tornaram-se insuficientes para desenvolver a sua atividade, o que levou ao surgimento de uma nova fábrica. Quando surgiu a ideia e que passos foram percorridos até à conclusão das novas instalações?

I.C. – A Industrial Farense é uma das poucas industriais que têm resistido na nossa região. É uma empresa de 1944. E não é difícil perceber o esforço que temos feito para que esta se mantenha a laborar. Tanto da parte dos seus sócios, como da parte dos nossos colaboradores que connosco têm feito o seu melhor para que possamos atingir o nosso grande objetivo, que é a passagem desta unidade quase centenária para as novas instalações. Esta ideia surgiu há cerca de 20 anos quando começamos por nos aperceber que estas instalações não tinham futuro tanto da parte do enquadramento urbano, como dos seus equipamentos.

 

V.A. – Desde 1995 até agora já lá vão 21 anos. Qual foi o motivo da demora neste processo?

I.C. – Como é do conhecimento geral, não existem na região muitos locais para se desenvolver indústrias com estas características da Industrial Farense. Há sim pequenos espaços para pequenas industriais e são demasiado dispendiosos para uma indústria destas características, para além de toda a burocracia que é necessário ultrapassar. No entanto, levamos 20 anos para erguer este projeto, mas neste momento temos uma unidade fabril instalada num espaço com dimensão, assim como equipamentos sofisticados da mais alta tecnologia, como poucas industriais deste sector terão atualmente.

 

V.A. – Qual foi o investimento para as novas instalações? Contou com alguns apoios?

I.C. – O investimento foi de aproximadamente 5 milhões de euros, só na fábrica, Tivemos o apoio do PRODER em cerca de 40%, mas este nunca é líquido porque estes projetos são demorados e demasiados exigentes.

 

V.A. – Qual pensa ser o retorno deste investimento neste novo espaço?

I.C. – O retorno deste investimento será, a longo prazo, tudo depende como se desenvolver a atividade na nova unidade. No entanto estamos otimistas quanto ao futuro.

 

V.A. – Que transformações sofre a alfarroba na sua fábrica? Quantas toneladas são trituradas anualmente?

I.C. – Na Chorondo & Filhos fazemos a primeira transformação ou trituração, ou seja, partir a alfarroba, fazer a separação da semente e dos triturados. Essa semente vai depois para a Industrial Farense, onde é transformada. Neste momento, na Industrial Farense tratamos de cerca de 1000 toneladas de semente, dependendo do mercado.

 

V.A. – Que derivados pode originar a alfarroba?

I.C. – Podemos dividir a alfarroba em duas partes: a polpa ou triturado e a semente. Da parte da polpa ou triturado, o principal consumo é para rações de animais. Outros consumos possíveis podem ser os xaropes e triturado torrado para a farinha utilizada em bolos. Já na parte das sementes, estamos a falar de um mercado mais nobre e que tem outras finalidades. É mais restrito e requer outros cuidados. O principal produto da semente é o emulsionante referenciado como E410, que é utilizado também na indústria farmacêutica, cosméticos, gelados e uma série de outros produtos. Há depois um outro produto da semente, proveniente do seu interior, o gérmen, que se pode considerar uma proteína e que nos últimos anos tem tido mais procura. Outra aposta que estamos a considerar são os produtos biológicos, mas para isso o agricultor tem também que estar atento nesse sentido, porque teremos que utilizar alfarroba com certificação biológica. É preciso inovar. Somos uma empresa familiar e a maioria destas empresas são multinacionais, por isso temos que estar à altura da concorrência, o que muitas vezes não é fácil.

 

V.A. – Que capacidade de transformação de semente de alfarroba apresenta a nova unidade em comparação com a anterior?

I.C. – Neste momento, tendo em conta o equipamento que temos instalado e as condições de espaço disponível, a produção tende a duplicar, mas se necessário podemos ainda triplicar ou quadruplicar. Quando falo em necessidade, falo em mercado. Neste momento, vendemos essencialmente para Espanha, Dinamarca, Inglaterra, Estados Unidos e Japão, que compram principalmente a farinha branca.

 

V.A. – Quantas fábricas desta natureza há em Portugal?

I.C. – Neste momento a Industrial Farense é a única a processar a semente de alfarroba em Portugal. Existem depois outras unidades em Espanha, Itália, Marrocos e ultimamente na Turquia.

 

V.A. – Qual foi o preço médio de venda da alfarroba este ano? E como é que esta chega até si?

I.C. – A alfarroba é comprada ao produtor e aos comerciantes, que fazem um elo de ligação entre a produção e os trituradores. Este ano a alfarroba está à volta de cinco euros/arroba. Nos últimos cinco anos, a alfarroba tem andado entre os cinco e seis euros, o que considero um preço demasiado baixo, pois não é um preço apelativo para o agricultor, nem o motiva a criar novas plantações e que trate os campos. Apesar de a alfarroba ser utilizada na alimentação humana, o que faz oscilar o preço da alfarroba é a quantidade da produção nos diversos países produtores.

 

V.A. – Qual é a sua relação com o pequeno agricultor? Acredita que o veem como uma referência neste setor?

I.C. – Tenho uma boa relação com os agricultores, mas nem todas as pessoas pensam da mesma forma, alguns possivelmente pensam que estamos a ganhar muito dinheiro e que as alfarrobas estão muito baratas. Acredito que a maioria reconhece o esforço que temos feito, para conseguir aguentar todos estes anos de preços baixos e rentabilidade muito reduzida para os agricultores e indústria.

 

V.A. – Atualmente, quantas pessoas trabalham na Industrial Farense? Qual a perspetiva em termos de novos postos de trabalho quando a nova fábrica começar a trabalhar em pleno?

I.C. – Neste momento trabalham 13 pessoas. Com a nova fábrica, o aumento substancial será mais significativo em postos de trabalho indiretos, já que estamos a falar de uma indústria muito mecanizada. Penso que, nos próximos anos, as coisas possam evoluir em ambos os sentidos.

 

V.A. – Como prevê ser o futuro da alfarroba nos próximos anos? Acredita que as novas gerações estão dispostas a apostar nesta área?

I.C. – Acho que sim, as coisas estão a mudar e vejo futuro na alfarroba. Não podemos dizer que será “a galinha dos ovos de ouro”, mas seria muito bom se tudo evoluísse. Se a alfarroba estivesse a 10 euros em vez de cinco, a nossa margem também seria outra, e isso seria conveniente para os agricultores e para nós. Tenho um conhecimento vasto sobre o que é a agricultura, porque me considero uma pessoa do campo, e reconheço que os cinco euros é um valor demasiado baixo. No futuro, acredito que as coisas possam mudar. Se aparecerem os produtos biológicos, surgirá uma melhoria neste setor. Essa melhoria é importante para o Algarve, até em termos paisagísticos. Acredito que a nova fábrica também é responsável por parte desse desenvolvimento. Quanto às novas gerações, penso que possam apostar na alfarroba, mas para isso temos de ser capazes de melhorar os níveis de preços dos últimos anos.

 

V.A. – Como consegue desenvolver todo este trabalho e ainda desempenhar funções no Crédito Agrícola?

I.C. – Sou Administrador da Caixa do Crédito Agrícola do Algarve há 21 anos. Estamos representados no concelho de Faro, São Brás de Alportel, Loulé, Olhão, Monchique, Portimão, Lagos e Vila do Bispo. Além disso, também sou vice-presidente do NERA (Associação Empresarial da Região do Algarve), faço parte da direção da AIDA (Associação Interprofissional para o Desenvolvimento da Produção e Valorização da Alfarroba) e do Conselho Fiscal do Agrupamento de Alfarroba e Amêndoa. Além disso faço parte dos órgãos sociais da Associação Mondial CAROB GROUP, com sede em Tarragona, Espanha. Tudo isto requer algum esforço, mas para mim o esforço faz parte da minha vida.

 

Por: Nathalie Dias