Joaquim Bispo, escritor diletante, http://vislumbresdamusa.blogspot.com/
«A febre, os suores. O mais penoso é a tosse.»
- Não serão febres de África, doutor?
«”Santa mama preta da minha ama sudanesa”! Tuberculose! Ah, o fulgurante Manifesto! Paris. “A furiosa vassoura da loucura arrancou-nos de nós mesmos e enxotou-nos pelas ruas”. Dórdio, Amadeu, Manuel Jardim. O Diogo. Como o pobre me conheceu... À minha cintilante genialidade futurista. O porteiro do museu Carnavalet a enxotar-me, e eu aos urros, aos brados, em língua acabada de inventar. Só porque me sentei na cadeira de Voltaire. Tempos gloriosos. “Um orgulho imenso intumescia os nossos peitos. Sentíamo-nos os únicos, naquela hora, despertos e eretos, como faróis soberbos ou como sentinelas avançadas, diante do exército de estrelas inimigas, que olhavam furtivas dos seus acampamentos celestes.” E, para quê? A perfeita cópia da Olímpia foi considerada uma afronta revolucionária, por ser de Manet.»
- Augusto, meu irmão, não deixes os meus quadros ficarem por aí, à mercê de qualquer professor, cicerone ou antiquário. Destrói-os todos. Promete!
«Claro que preferiam Ingres. Ou, mesmo, Cabanel. Com a Academia nas mãos do Veloso Salgado… O embaixador cortar-me a pensão... Como se eu fosse monárquico. Lisboa, de novo. A minha espantosa postura. As roupas pretas, o cabelo longo. Lançar as pernas para a frente, em desafio à pequenez lisboeta. O Congresso Futurista. Minha saudosa Cervejaria Jansen! As sessões futuristas do Teatro República. O Almada - que formidável apresentação! Os meus desenhos na Orpheu. E os títulos! Uns acham-me Hamlet; outros, espantalho. Lisboa é demasiado pequena. Daquela vez que quis arrendar os Jerónimos para pintar uma tela enorme, eh! Gosto de a afrontar, de provocar polémicas e falatórios. Sou o “artista que o génio da época produziu”.»
- Tragam-me os meus escritos. Quero fazer um post-scriptum.
«Um gesto, mais um gesto, o último. Que seja único e sublime. Isso! Dois traços a abarcar cada página de canto a canto. E, a finalizar, no frontispício: Errata. E uma assinatura bem explícita: Santa-Rita Pintor, que é o que sempre fui.»
- Companheiros, foi uma gloriosa vernissage!