Hoje há dia memorial para quase tudo. Talvez um sintoma da sociedade que construímos onde campeia, cada vez mais, a indiferença e o esquecimento. E, por isso, se precise de recordar e de motivar. Talvez não tenhamos consciência, mas em cada mês somos persistentemente bombardeados por muitas e as mais variadas propostas celebrativas.
Dou comigo a pensar se estas propostas serão, na verdade, acolhidas e valorizadas pela nossa gente. Se as mesmas constituem um verdadeiro momento celebrativo, ocupam lugar e ganham peso no nosso íntimo, sabendo que para a maior parte a preocupação diária consiste simplesmente na satisfação básica do que se julga necessário e importante. Só neste mês, o quadro celebrativo é imenso e significativamente diversificado, iniciando com o Dia do trabalhador e findando com o Dia do pescador.
Durante este período há celebrações de dias mundiais: da língua portuguesa, do riso, da segurança social, da fibromialgia, das telecomunicações e da sociedade de informação, da Internet, do atum, da senha, do trânsito e da cortesia ao volante, da higiene das mãos, da asma, da pastelaria, da reciclagem, da vacina contra a sida, do médico de família, da diversidade cultural e para o diálogo e o desenvolvimento.
Celebram-se também dias internacionais: da liberdade de imprensa, do bombeiro, da parteira, do enfermeiro, da família, do viver juntos em paz, da luta contra a homofobia, transfobia e a bifobia, dos museus, do brincar.
A estes e já não são poucos, se ajuntam os dias nacionais: das pessoas com deficiência intelectual, da luta contra a obesidade, do advogado. E outros, simplesmente considerados Dias: da Guarda Nacional Republicana, da Mãe, da Europa, dia Europeu do mar, do autor português, do folclore português, dos soldados da paz das Nações Unidas, dos Irmãos, da biodiversidade biológica, do abraço. De todas estas propostas, que dariam, certamente, cada uma delas, motivo a um oportuno artigo, avivo nesta partilha o Dia do Abraço.
Porque cada dia vivemos mais sós e num frenesim de ausências e apatias. A cultura contemporânea deixou na verdade de preparar-nos para a solidão. Cada vez mais sozinhos e vazios ainda que habitados por muitas coisas e mesmo por aqueles que amamos. Mas esquecemos isso. Quanto é importante condividir, potenciar, fazer crescer, humanizar, reencontrar.
E quanto a força de um abraço não negado nos reergue, fortalece e cura. A nossa autobiografia é também escrita e fecundada por uma bela e singela história de abraços. Desde que iniciámos a aventura da vida até ao seu findar. Parece que hoje, sem nos darmos conta, fomos impondo uma espécie de barreira de aproximação, não raras vezes fortalecida com a argamassa da vergonha, da indiferença, de cínicos respeitos humanos. E abraçar é acreditar e cultivar fraternidade, exprimir ternura, alicerçar amizade, ensinar a não cair, saber que não bastam palavras para nos dizermos e revelarmos. O abraço também liberta, potencia a esperança, entreabre a fé, é lugar novo para fazermos a aprendizagem de nós mesmos e do amor. Desejemos que os motivos de todas as nossas lutas diárias sejam selados pela força e eloquência de um abraço e reencontremos aí os fundamentos do nosso poder. O meu abraço!