Com uma parceria de cerca de 3 décadas, a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve (DRAPAlg) está diretamente envolvida naquele que é considerado o maior evento a sul do Tejo: a Fatacil. Já no encerramento desta 37.ª edição, Fernando Severino, Diretor da DRAPAlg, falou com «A Voz do Algarve» realçando que esta parceria “está forte e é para durar”, embora tenha consciência da cada vez menor importância atribuída ao setor pecuário.

A Voz do Algarve – Quando começou a participação da Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve (DRAPAlg) na Fatacil?

Fernando Severino – A DRAPAlg, na altura ainda só Direção Regional de Agricultura, participa desde o início, desde a primeira edição, há 37 anos. Começou muito pelo gado e pela parte da pecuária no concelho de Lagoa e só depois se foi alargando para aquilo que é hoje.

V.A. – Nessa primeira fase, a colaboração da DRAPAlg era concretizada unicamente sob a forma de parceria. Quando se estabeleceu o protocolo propriamente dito entre a DRAPAlg e a Câmara Municipal de Lagoa?

F.S. – Há cerca de 30 anos. Este é o nosso protocolo, com autarquias e eventos, mais antigo. É uma parceria que existe desde o início, pois ainda que numa fase inicial não existisse protocolo, essa parceria já existia. O evento em si foi-se alargando e hoje já vai desde a gastronomia até aos produtos regionais, continuando sempre com a parte pecuária e os concursos.

V.A. – Por que motivo surgiu a necessidade de estabelecer um protocolo entre a DRAPAlg e uma feira como a Fatacil?

F.S. – Houve uma altura em que desfilavam aqui todas as direções regionais de agricultura do país, mas houve sempre uma residente que era a do Algarve, até porque esta feira realiza-se no Algarve e em Lagoa. Embora o vinho fosse um elemento forte desde o início, houve sempre uma rotação gastronómica de restaurantes que vinham de diferentes partes do país e das direções regionais que assumiam a parte temática todos os anos. Isso voltou a assistir-se este ano, com Lagoa como Cidade do Vinho, o que nos permite encontrar aqui vinhos de diferentes regiões.

V.A. – A necessidade de divulgar o vinho do Algarve é algo recente ou há 37 anos, quando esta parceria surgiu, já era um elemento determinante?

F.S. – Sempre foi uma preocupação desde o início, contudo a grande reconversão vinícola no Algarve dá-se a partir do ano 2000, quando surgem as novas vinhas que deram este vinho de qualidade. Temos tudo renovado, com novas castas, novas instalações e um panorama completamente diferente. Por isso, não é comparável o vinho de hoje com o de há 20 anos.

V.A. – O que aconteceu no ano 2000 que permitiu essa reconversão vinícola?

F.S. – Foi exatamente a CVR - Comissão Vinícola Regional, à data, em colaboração com a Direção Regional da Agricultura (DRAPAlg) e com o IFADAP - Instituto de Financiamento de Apoio ao Desenvolvimento de Agricultura e Pescas que, juntos, começaram a incentivar a reconversão de vinhas antigas com castas não tão interessantes, por outras mais interessantes. Aos poucos foi-se fazendo, até chegarmos aos cerca de 1500 hectares.

V.A. – É então uma parceria para durar?

F.S. – Está forte e é para durar. As alterações, apesar dos receios, foram um êxito e há que melhorar e trazer mais setor cá para dentro, novos produtos. Há já quem proponha trazer, para o ano, o abacate.

V.A. – Existe capacidade e abertura para incluir esses novos elementos e produtos?

F.S. – Há capacidade e vontade para aumentar. Acontece num período muito crítico do ano, mas vamos continuar a lutar e a trabalhar em conjunto com a Câmara de Lagoa.

V.A. – Como tem evoluído ao longo destes anos o setor pecuário? Existem produtores de gado em número considerável para que estejam num expositor? 

F.S. – Inicialmente essa componente era muito forte, hoje nem tanto. Embora tenha menos peso no Algarve, é sempre importante ressuscitar, principalmente, a parte dos pequenos ruminantes, ou seja, os ovinos (ovelhas e cabras), para trazê-las e fazer os concursos. No caso dos pequenos ruminantes, temos o Concurso da Cabra, que se faz normalmente em Castro Marim, e neste lado do Algarve tivemos o Concurso de Ovelhas Churras no último domingo. Portanto, embora existam poucos produtores, isto permite dinamizar o produto em si e fazer a ligação da pecuária à gastronomia. 

Vaca de raça Algarvia praticamente extinta.

 

V.A. – Qual a  importância da Fatacil para o setor e para a divulgação do mesmo?

F.S. – Todos os produtos regionais tradicionais, como o figo, a amêndoa ou os licores, são divulgados. São dinâmicas que potenciam o setor, mostram o que há e permitem ao urbano conhecer estas coisas, o Algarve rural, que tem uma gastronomia que é das melhores que há, valorizada pelo turismo, que nos coloca como um fator de atratividade. É o evento onde a pecuária tem uma maior dinâmica.

V.A. – Numa frase, como define a Fatacil?

F.S. – É o maior palco da agricultura algarvia e, parcialmente, dos assuntos do mar, com uma ligação à gastronomia através do turismo, que é o principal impulsionador regional.

V.A. – A nova localização do Amar a Terra foi a grande alteração deste ano. Como surgiu essa mudança e qual tem sido a resposta quer do público quer dos expositores à nova localização?

F.S. – A nova localização surge como um desafio da Câmara de Lagoa para renovar a feira. Ficámos um pouco receosos porque há uma certa tradição na antiga localização, mas tem-se verificado exatamente o contrário. Na parte onde ficou localizado o Amar a Terra, que leva mais produtores e que tem um espaço maior de promoção, sente-se um aumento do volume de vendas pois há uma maior promoção dos produtos. Este ano tem sido muito melhor em termos de divulgação e de negócio.

V.A. – Com esta alteração houve um aumento do número de expositores? 

F.S. – Andamos à volta dos 38 ou 40 expositores.

V.A. – Qual foi a necessidade que levou à criação do Amar a Terra? E como surgiu o nome?

F.S. – O nome, que no início não foi levado muito a sério, hoje está no auge. Foi associado à DRAPAlg nos últimos quatro anos, mas antes já existia e já era usado. Hoje encaixa perfeitamente porque o “amar” representa o mar e depois tem também a “terra”, dois elementos que estão diretamente relacionados connosco.

V.A. – Como vê a evolução do setor agropecuário no Algarve?

F.S. – Nós temos que encarar o setor agropecuário como de nicho, mas há uma grande necessidade de aumentá-lo. Com a ocupação de rebanhos, temos um setor muito mais sustentável e precisamos de uma economia de desenvolvimento rural mais dinamizada para o interior, mas o que se tem verificado é a estagnação ou diminuição. No caso das ovelhas e cabras, verifica-se que são cada vez menos os rebanhos mas que estes têm mais cabeças. Portanto, as produções mantêm-se mais ou menos estáveis mas há que dinamizar. Têm aparecido alguns projetos, o que vemos com algum entusiamos, mas sabemos que nunca poderá ser um setor muito importante no Algarve.

V.A. – Qual a adesão dos jovens a este setor?

F.S – Muito reduzida. No setor da pecuária o que há mais é apicultura e a parte da cabra algarvia e da ovelha churra, é por aqui que se situa maioritariamente os investimentos. Aparece um ou outro, mas muito esporadicamente.

V.A. – O que pode ser feito para os incentivar?

F.S. – Temos alguns exemplos muito interessantes, nomeadamente ligados à produção de queijo, que não tem nenhum problema de escoamento. Temos também exemplos de jovens licenciados que andam com rebanhos. A maioria dos nossos jovens agricultores são licenciados e a maior parte nem é em agronomia. Isso tem trazido para a agricultura um valor acrescentado, mas também um grande fator de atração para outros jovens. Hoje nota-se que os jovens se interessam pela agricultura ligada às novas tecnologias e aos novos modos de produção, onde se utilizam menos pesticidas, por exemplo. Os jovens estão mais despertos para essas coisas. Mesmo as crianças da escola primária começam a ter contacto com o mundo rural, com hortas e animais, muito cedo e por isso estão mais despertos. Os professores chama-nos às escolas para falarmos sobre isso porque há uma consciência da importância do mundo rural. Mas é preciso mostrar aos jovens que isto é uma via possível porque são poucos e nós queremos mais.

 

Por Nathalie Dias