Cálculo da taxa de esforço tem em conta os rendimentos coletáveis e não os líquidos, dificultando o acesso à bonificação dos juros.

Há cerca de um mês, o Governo avançou com novas regras para o cálculo da bonificação dos juros, de forma a chegar a mais famílias, e aumentou o valor máximo deste apoio para os 800 euros por ano (ao invés dos 720 euros). Além disso, clarificou quais são os salários das famílias que entram no cálculo da taxa de esforço: os rendimentos coletáveis e não os líquidos. Por este motivo, há agregados familiares que têm taxas de esforço bem elevadas, mas que vêem negado o acesso à bonificação dos juros.

Foi em março que o Governo criou apoios extraordinários para pagar a prestação da casa mediante a publicação do Decreto-Lei n.º 20-B/2023. Foi aqui que surgiu a bonificação dos juros, elegível para famílias com créditos habitação própria e permanente (até 250 mil euros) e com taxas de esforço iguais ou superiores a 35% (entre outros critérios). E aqui para o cálculo da taxa de esforço considerou-se o “rendimento anual, como o total do rendimento para determinação da taxa apurado pela AT na liquidação do IRS do beneficiário referente ao último período de tributação disponível”.

Cerca de seis meses depois foi publicado em Diário da República o Decreto-Lei n.º 91/2023, de 11 de outubro, que vem reforçar a bonificação dos juros no crédito habitação. E também trouxe novidades acerca do cálculo da taxa de esforço, clarificando a questão dos rendimentos da seguinte forma: “Considera-se 'rendimento anual' o rendimento coletável tributado às taxas gerais previstas no artigo 68.º do Código do IRS, acrescido dos rendimentos isentos e englobados para efeitos da determinação da taxa nos termos da legislação fiscal, deduzido do quociente dos rendimentos produzidos em anos anteriores, nos termos do artigo 74.º do Código do IRS, constante da liquidação do IRS do beneficiário referente ao último período de tributação disponível”.

Isto quer dizer que para calcular a taxa de esforço está a ser usado o rendimento coletável e não o líquido de impostos e contribuições para a Segurança Social (recomendado pelo supervisor bancário), dificultando, assim, o acesso à bonificação dos juros.

 

Como é que o cálculo da taxa de esforço afeta o acesso ao apoio?

Esta dificuldade é bem visível no exemplo partilhado pelo Público. Um casal com dois filhos tem um rendimento coletável de 2.726 euros e uma prestação da casa de 817 euros. E, contas feitas com o modelo do Governo, terá uma taxa de esforço de cerca de 30%, estando fora do apoio à bonificação dos juros. Mas se fosse considerado o rendimento líquido do casal, de 2.000 euros, a taxa de esforço seria de 40,85%, cumprindo assim o critério que poderia dar acesso a este apoio ao crédito habitação.

Se tivermos em conta que a taxa de juro neste crédito habitação de taxa variável (Euribor a 6 meses) vai ser revista em dezembro, podendo mesmo a prestação superar os 900 euros, significa que a taxa de esforço da família será de 33% considerando o rendimento coletável, continuando a excluir esta família do apoio. Mas a verdade é que esta nova prestação da casa vai pesar 45% sobre o rendimento líquido desta família.

De notar esta é também a fórmula de cálculo da taxa de esforço é adotada para atribuir o apoio à renda, limitando igualmente o acesso. Mas este cálculo não é aplicado na concessão de outros apoios, como é o caso das novas regras para renegociar o crédito habitação, previstas no Decreto-Lei n.º 80-A/2022, de 25 de novembro. Neste caso, o cálculo da taxa de esforço é mais favorável as famílias, considerando o rendimento anual líquido de impostos e contribuições para a Segurança Social. E é este modelo que é recomendado pelo Banco de Portugal.

 

Por: Idealista