Candidato à Câmara Municipal de Loulé pelo CHEGA
Fernando Santos, ou Fanan como é mais conhecido, tem 63 anos, casado e tem dois filhos. Licenciou-se em 1985, em Arquitetura na Universidade Técnica Escola de Belas Artes, em Lisboa. Fernando Santos é vereador pelo Chega e novamente candidato à Câmara Municipal de Loulé para as próximas eleições autárquicas de 2025.
 
 
V.A: De onde surgiu a alcunha Fanan e como prefere que o tratem nesta candidatura?
F.S: Pode ser por Fanan. A alcunha Fanan já nasceu há tantos anos, talvez há 50 anos, e tem conseguido levar esse nome de guerra, digamos assim, como eu lhe chamo. Esses 50 anos, sem qualquer problema, em qualquer sítio, em qualquer instituição, em qualquer local onde me encontro, esse é o nome de guerra. Há muita gente que não me consegue identificar pelo outro nome. Portanto, foi assim e há-de ser assim até morrer. Não estou à espera de alterar nada disso. Faz parte da minha simplicidade, faz parte da minha maneira de ser.
 
V.A: Mas como candidato, é Fernando Santos?
F.S: Como candidato sou Fernando Santos. Nos cartazes continuo a deixar Fanan porque não faz sentido de outra maneira. Eu penso que é o candidato que deve mostrar, não deve ter problemas, em mostrar aquilo que é. E se eu tenho esse passado, nunca o irei apagar. Aliás, é para mim um privilégio poder transportar esse nome este tempo todo e ser conhecido dessa maneira, mesmo dentro da Câmara, mesmo dentro de qualquer outra instituição onde fui já dirigente, onde já fiz muita coisa.
 
V.A: E quem é o Fernando Santos, ou seja, o Fanan?
F.S: Ora, quem é? Eu costumo dizer que, às vezes, brinco um pouco porque eu escrevo e escrevo com os provérbios e brinco um pouco com aquilo que eu sou. Eu sou uma pessoa resolvida, que fez a vida do antigamente, que andou de bicicleta, que andou na rua, que teve muitos amigos e tem, felizmente, tenho muitos amigos.
E essas pessoas ajudaram a criar uma personalidade que é a minha, que cada um julgará da maneira que quiser, mas que até agora só posso fazer um balanço positivo, porque sou uma pessoa normal, humilde, não tenho ambições políticas, tão pouco. 
Foi um acaso ser político ou ser candidato à Câmara, aliás, fui convidado para isso, não estava à espera. Tenho sido uma pessoa de luta, a minha vida tem sido sempre luta, porque tem que lutar sempre contra tudo, daí ter sido candidato.
Portanto, no fundo, o Fanan é alguém que está sempre disposto a combater, ajudar, a que as coisas funcionem e, essencialmente, que neste caso particular, como candidato, um dos meus grandes objetivos é que as pessoas consigam voltar a ser pessoas, como eu costumo dizer e já escrevi sobre isto, que as pessoas agora não têm espaço para ser pessoas, estão sempre condicionadas com uma quantidade de chefes ou de instituições ou metidas num sistema que não as deixa ser elas próprias. Isso tem sido, aliás, foi esse o grande dilema da minha primeira candidatura, foi ter visto tanto medo na cara das pessoas e tudo o que eu quero é que as pessoas estejam à vontade, que sejam livres, porque ser livre, porque vivemos em democracia, porque tivemos o 25 de Abril, isto não tem nada a ver, porque agora não temos essa liberdade. E o que eu tento é ser livre, portanto ser um ser livre, não tenho ninguém que me prenda, mesmo em termos do meu partido, as condições que coloquei para ser candidato, deixam-me fazer as coisas à minha maneira, eu sou assim, vocês conhecem, vocês convidaram-me, eu quero fazer as coisas à minha maneira, quero ajudar as pessoas, não quero rótulos, não quero nada disso, não sou racista, não sou nada disso, portanto eu quero ser uma pessoa normal que pode tomar conta de uma instituição que tem 3 mil pessoas quase à volta e que muitas delas não estão confortáveis, e eu achei que o meu know-how de vida pessoal pode ser transportado para isto, que é uma coisa que eu penso que falta nas instituições, essencialmente nas instituições públicas, portanto este know-how de pôr as pessoas à vontade é um Fanan, no fundo é isto que eu defendo, esta é a minha primeira prioridade, é que as pessoas possam estar descansadas, as que trabalham lá dentro, as que trabalham cá fora, que possam ser pessoas e que eu possa contribuir para isso com o meu feitio, como eu costumo dizer, não obriguei-me a mudar de feitio porque isso vai dar muito problema a muita gente.
 
V.A: Inicialmente surgiram várias, talvez especulações, de que iria ser candidato a São Brás, a Faro e nunca se pensou em Loulé ou dizia-se que desta vez não era Loulé, o que é que tem a dizer sobre isso?
F.S: Tem duas maneiras de ver isto. Primeiro, porque a política é assim, portanto, a ideia era que eu não viesse a Loulé, penso eu que uma das ideias era que ninguém queria que eu viesse a Loulé, ninguém da oposição, digamos assim.
De outra maneira, é que toda a gente me quer em todo o lado porque acham que eu mereço estar em todo o lado, convidaram-me para São Brás, convidaram-me para Faro e eu disse não. Eu tenho um percurso em Loulé de 40 anos de luta contra a instituição, e pode-se dizer que é verdade, portanto, fui convidado porque lutei 40 anos contra o sistema, o sistema é mau, não pelas pessoas que lá estão dentro, mas porque o sistema precisa de alguém que o dirija. Estar a sair de Loulé para ir para São Brás ou para Faro, seria um desperdício porque é aqui que eu conheço bem.
Mas queriam que eu fosse para Faro, queriam que eu fosse para São Brás, eu disse não. Se me deixarem ir, só vou a Loulé, porque se não me deixarem ir a Loulé, eu não vou a mais lado nenhum, porque não faz sentido. Não fazia sentido a minha aprendizagem, a última que tive agora nesses últimos anos, estar a desperdiçar esta aprendizagem sobre uma instituição que é preciso pôr a funcionar, este é o grande problema.
Porque a própria instituição vai resolver o problema das pessoas, e as pessoas que estão lá dentro vão resolver os problemas das pessoas que estão cá fora, portanto, eu só podia vir a Loulé, não podia vir a mais lado nenhum.
Pronto, posso dizer que o meu pai é de Faro, a minha mãe é de Loulé, o meu avô tinha um forno na Rua da Carreira, e acabei por vir cá parar, se bem que desaconselhado, mas pronto, já cá estou há 40 anos e estou a fazer, tenho muitos amigos aqui, tenho muita gente que conheço, gosto do sistema, gosto do espírito e quero fazer alguma coisa por isto.
 
V.A: Como primeiro vereador eleito pelo Chega no Concelho de Loulé, que balanço faz deste mandato que está na reta final? Quais foram as suas principais conquistas e desafios?
F.S: Para começar, nunca pensei ser eleito. Foi algo que aconteceu, e desempenhei o meu mandato da melhor forma possível. Não é fácil ser vereador do Chega numa Câmara Socialista com maioria absoluta. A minha estratégia passou por perceber como poderia contribuir, com o meu voto e conhecimento, para melhorar o trabalho do executivo.
O desafio era garantir que a minha presença tivesse impacto. Isso exigiu apresentar propostas e intervir nos debates da Câmara, nos pequenos detalhes e nas reuniões, ajudando a corrigir e melhorar o que era possível. Durante o primeiro ano, foi muito difícil ser ouvido, mas agora já me escutam e reconhecem que tenho algo a acrescentar ao Concelho. O meu objetivo nunca foi obter reconhecimento pessoal, mas garantir que as boas ideias sejam implementadas, independentemente de quem as assuma.
Uma das minhas maiores batalhas foi o Plano Diretor Municipal (PDM). Desde a minha primeira reunião de Câmara, a 13 de outubro, alertei para os problemas na sua elaboração. O PDM não podia ser apenas a aplicação da Lei dos Solos sobre o território; era necessário um planeamento estratégico real, definido pela Câmara, e não pela CCDR. Durante um ano, insisti neste ponto, e finalmente fui ouvido. A partir do momento em que todos reconheceram os problemas que apontei, o paradigma mudou.
A Lei diz que o PDM é da responsabilidade da Câmara Municipal. Não podemos apenas cumprir a REN e a RAN sem uma estratégia que beneficie o Concelho. Antes, estava-se a eliminar perímetros urbanos sem critério, desperdiçando milhões de euros em infraestruturas. Lutámos por um PDM pensado para Loulé e não para a CCDR, e esse foi um dos meus maiores contributos.
Continuo a pressionar para que o PDM seja finalizado e publicado. Esta mudança na abordagem foi uma vitória coletiva, que também beneficiou a equipa técnica. Antes, o processo estava fechado e sem estratégia; agora, conseguimos uma abordagem mais aberta e estruturada. Essa foi uma das minhas grandes lutas e um dos maiores ganhos do meu mandato.
Ao longo do mandato, tenho intervindo em diversos temas, sempre que é possível. Optei por não apresentar propostas formais que acabassem chumbadas, preferindo influenciar o executivo para que implemente as boas ideias. A minha filosofia é fazer com que o Concelho beneficie do meu trabalho, independentemente de receber créditos por isso.
 
V.A: Mas as pessoas querem saber para quando estará pronto o PDM?
F.S: Já questionei o Presidente da Câmara sobre isso. O PDM está atualmente numa fase de resposta à CCDR. Estamos a ultimar as respostas às questões levantadas por esta entidade e pelas mais de trinta instituições envolvidas no processo. Infelizmente, este é um país burocratizado, onde se trabalha com “cartas de amor”, requerimentos e ofícios, o que atrasa significativamente os processos.
Acredito que, em termos técnicos, o PDM deveria estar pronto dentro de três a quatro meses. No entanto, não sei se o Presidente da Câmara partilha desta visão, nem se as entidades envolvidas vão responder dentro do prazo.
Seria fundamental que o PDM estivesse concluído antes do final deste mandato. Ainda mais agora, com a nova Lei dos Instrumentos Territoriais, que veio bloquear, e mal, as áreas urbanizáveis. Antes, podíamos construir nestas zonas, mas agora estão bloqueadas e precisamos justificar à CCDR porque devem permanecer urbanizáveis.
Apesar da minha luta na Assembleia da República e do apoio dos Deputados do CHEGA para revogar esta suspensão absurda, o problema persiste. Há uma nova lei em discussão, mas não sabemos se será promulgada. O essencial é garantir que podemos construir onde faz sentido. Não faz sentido perdermos ainda mais opções de construção.
 
V.A: Poderia falar-nos um pouco mais relativamente à Lei dos Solos?
F.S: Posso falar um pouco mais. Não é da Lei dos Solos que se trata, há aqui um equívoco que acabou por embalar para essa designação, porque é algo que toda a gente reconhece. No fundo, o que aconteceu?
O que foi alterado foi a Lei dos Instrumentos de Gestão Territorial, no sentido de facilitar burocraticamente a transformação de solo rústico em solo urbano, para supostamente resolver o problema da habitação. Para mim, isto é uma falácia. Porquê? Porque este processo funciona com unidades de execução, e não conheço nenhuma que leve menos de três anos a ser aprovada. Portanto, isto não vai resolver o problema da habitação agora. Esse é o meu ponto de vista. 
Esta lei tinha uma boa intenção: responder à necessidade urgente de terrenos para construção. Mas não é um problema de todos os concelhos. Em Lisboa e no Porto, pode haver falta de área urbanizável, mas se as zonas disponíveis forem devidamente urbanizadas, há soluções. Em Loulé não faltam áreas urbanizáveis. 
A questão é que o Governo desenhou a lei para áreas muito grandes, porque 70% dessas áreas, uma vez convertidas de rústicas para urbanas, terão que ser destinadas a habitação de custos controlados, mesmo que pertençam a privados. Não sou contra essa ideia, mas a forma como esta mudança foi comunicada criou uma enorme confusão.
Os políticos começaram a chamar-lhe Lei dos Solos, de forma errada, porque a Lei dos Instrumentos de Gestão Territorial não era algo familiar para a maioria das pessoas. E o que aconteceu? Muitos pensaram que poderiam simplesmente comprar terrenos rústicos e construir imediatamente. E as imobiliárias aproveitaram a oportunidade.
Algumas imobiliárias muito poderosas neste país divulgaram esta ideia errada e estão a vender terrenos rústicos a preços exorbitantes, onde não se pode construir e, provavelmente, nunca se poderá. E ninguém diz isto abertamente.
Talvez esteja a dizê-lo agora e amanhã esteja tudo zangado comigo. Mas não quero saber. Esta é a realidade. As pessoas estão a comprar pequenas parcelas de terreno rústico, acreditando que esta lei os transformará em urbanos. Isso não vai acontecer.
Além disso, a Câmara agora tem um problema acrescido. Para conseguir aprovar os terrenos urbanizáveis que já existiam e que agora estão bloqueados por esta lei, terá de contratar uma empresa, fazer um estudo e justificar que esses terrenos, que já eram urbanos, podem continuar a ser urbanos. Ou seja, um processo burocrático completamente desnecessário.
Para que todos percebam: há terrenos urbanizáveis que já estavam em processo de aprovação, com milhares de fogos previstos, que agora estão bloqueados. A Câmara terá que pedir autorização à CCDR para os utilizar, algo que antes era um dado adquirido. E isto apenas porque a nova lei assim o exige.
É a maneira mais simples que encontro para explicar este problema. Agora, a CCDR terá que aprovar, e as empresas especializadas terão que tratar de toda a burocracia. O problema das leis em Portugal é que vêm sempre acompanhadas de consequências imprevistas.
Mas, resumindo: não existe uma Lei dos Solos que permita alterar pequenas parcelas rústicas para urbanas. Isso não existe, nem vai existir.
Portanto, quem está a comprar terrenos rústicos pequenos, acreditando que poderá construir, está a ser enganado. A menos que queiram construir e entregar 70% da propriedade para habitação social. Essa é a realidade que a lei impõe.
 
V.A: E com isto, seguimos com a questão das “urbanizações” de casas de madeira.
F.S: É claro que, com esta ideia de que não há casas e com o aumento da população – porque, se calhar, temos mais de um milhão e meio de pessoas que também precisam de habitação –, a situação complicou-se. Antes, construíam-se cerca de cem mil fogos por ano sem grande problema. Agora, depois da crise, talvez estejamos a construir apenas trinta mil fogos anuais, mas temos muito mais gente a precisar de casa.
O verdadeiro problema aqui não são as pessoas, mas sim o negócio por trás disto. As empresas que vendem casas aproveitaram a situação. Primeiro, diziam que não era preciso licença, agora algumas já admitem que sim. A verdade é que todas essas casas precisam de licença. Devem ser construídas em zonas onde é permitido, com fossas, furos de água, eletricidade – tudo conforme a lei. Mas, na realidade, a maioria são ilegais e violam o ordenamento do território.
Para as câmaras municipais, esta situação é um enorme problema, especialmente no Algarve. Compreendo que as pessoas precisem de habitação e que a câmara não tenha agido a tempo. Mas não é nos últimos um ou dois anos que se resolve esta crise. Nos anos 80, por exemplo, desenhei mais de duzentos fogos de habitação social junto ao tribunal. Na altura, foi possível construir com cooperativas. Hoje, sem alternativas, as pessoas recorrem a estas casas.
O que acontece? Compram as casas, que chegam em camiões de madrugada, montam-nas rapidamente e, no dia seguinte, já estão a ser habitadas. Depois, improvisam fossas e fazem furos clandestinos para ter água. A APA (Agência Portuguesa do Ambiente) não licencia estas infraestruturas, pelo que cada uma dessas casas configura um crime ambiental. Muitas pessoas nem sabem disto e acabam por arriscar.
O problema agrava-se quando algumas pessoas começam a alugar estas casas e a fazer disso um negócio altamente lucrativo. E aqui surge outro entrave: a Constituição protege quem as habita, tornando muito difícil reverter esta situação. A Câmara tem identificadas cerca de 700 casas nestas condições – provavelmente, até são mais. Mas demolir uma delas pode levar três ou quatro anos, porque a decisão tem de passar por um juiz.
Quando esta situação começou, propus que a Câmara colocasse um cartaz à porta dessas empresas, avisando que as casas precisavam de licença. Não o fez. Só agora surgiu um aviso a alertar para essa necessidade. Mas já é tarde.
Claro que há quem soubesse que era ilegal e assumisse o risco. Mas também há quem tenha comprado casas sem essa informação. As empresas que as vendem deviam esclarecer isso desde o início.
Para mim, a única solução legal seria demolir essas casas, porque não há outra forma de regularizar a situação. Sei que isto pode custar-me votos, mas não me interessa. Esta é a única posição que posso ter. Sou arquiteto, e se nada for feito, qualquer dia teremos verdadeiras favelas ao lado de casas de milhões de euros. Já está a acontecer. E ninguém sairá beneficiado, nem quem vive nessas casas, nem o resto da população. Mas há quem esteja a ganhar muito dinheiro com isto.
 
V.A: E o que poderá ser feito pelas famílias que atualmente vivem nessas casas, especialmente aquelas com crianças ou pessoas idosas? Essa é uma grande preocupação…
F.S: Não é fácil. A Câmara tem muitos terrenos, e eu tenho uma ideia que gostaria de ver concretizada rapidamente. Não acho que seja difícil de pôr em prática, mas, claro, levará tempo.
O primeiro passo é estancar a construção de novas casas ilegais. Depois, será necessário, através da ação social e dos serviços camarários, avaliar quem vive nessas casas e em que condições. Quase que teremos de voltar ao conceito de bairro de lata e definir quem tem direito a apoio e quem não tem.
Uma possível solução seria a criação de um espaço provisório num terreno urbanizado pela Câmara, com acesso a água e saneamento, para evitar crimes ambientais. Esse espaço poderia acolher temporariamente algumas dessas famílias enquanto se encontra uma solução definitiva. Mas este será um processo complexo e demorado.
O problema maior é a parte legal. Como se pode resolver esta situação do ponto de vista jurídico? Quanto tempo levará? Não tenho respostas definitivas, mas acredito que há soluções possíveis.
Outro problema grave é a falta de diálogo. As pessoas deixaram de falar umas com as outras. O Presidente da Câmara fala apenas com algumas pessoas, mas não com todas. O medo de represálias levou ao silêncio, e isto é preocupante. 
O mesmo aconteceu com o caso do Centro Oncológico, um processo completamente kafkiano.Toda a gente concorda que o Centro Oncológico é necessário, mas a burocracia paralisou o processo. Em vez de resolverem a situação desde o início, sentando todas as partes à mesa para definir o que se pretende construir, permitiram que se arrastasse como qualquer outro processo burocrático.
Quando se trata de uma obra pública, muitas vezes não há preocupação com aprovações formais, porque supostamente não são necessárias. Mas no fim, quando se percebe que o projeto não cabe dentro das regras existentes, tudo se complica. Foi isso que aconteceu. O processo demorou meses porque não houve um diálogo inicial estruturado.
Este problema reflete uma questão mais ampla: a falta de organização na Câmara. Existem excelentes técnicos e funcionários, mas muitos trabalham sem um fio condutor, sem uma liderança clara. Falta um sistema eficiente, em que os processos sejam acompanhados de perto e onde as pessoas possam comunicar livremente.
Foi por isso que, há 12 anos, quando o Dr. Vítor Aleixo tomou posse, sugeri que alterasse a filosofia do departamento de urbanismo. Pedi a criação de gestores de processo e atas de reunião, para que todas as conversas ficassem registadas e houvesse transparência. Mas isso nunca aconteceu. Hoje, os processos acumulam dezenas de requerimentos e ofícios, sem que haja um rumo claro.
Esta é uma das principais razões da minha candidatura. Quero mudar esta filosofia. Os funcionários da Câmara precisam de sentir-se protegidos e valorizados, independentemente das suas preferências políticas. Não podemos ter núcleos privilegiados que fazem o que querem, enquanto outros vivem sob medo de represálias.
O dinheiro que Loulé tem permite fazer todas as estradas e infraestruturas que forem necessárias. O problema não é financeiro, mas sim organizacional. Precisamos de processos ágeis, de pessoas motivadas e de diálogo entre todos os intervenientes.
Se não houver uma liderança clara e um ambiente de trabalho saudável, nada funcionará. As pessoas precisam de sentir que podem falar e ser ouvidas. E essa é a minha visão para Loulé.
 
V.A: Já que mencionou o tema do Centro Oncológico, sabemos que o acesso aos cuidados de saúde continua a ser uma preocupação para os municípios. Que propostas tem para melhorar os serviços de saúde no concelho de Loulé?
F.S: A Câmara tem investido na área da saúde. Temos um novo centro de saúde e há investimentos em curso para melhorar a infraestrutura existente. Dentro das competências que agora nos são atribuídas nesta área, precisamos de focar-nos seriamente na melhoria dos serviços de saúde.
O essencial é perceber até onde podemos atuar. Temos de dialogar com o Ministério da Saúde para entender até que ponto a Câmara pode intervir. Por exemplo, temos capacidade financeira para contratar médicos, se for permitido por lei. Podemos investir ainda mais, mas é claro que os recursos não são inesgotáveis, e a receita do IMT pode não se manter sempre nos níveis atuais.
Acredito que a Câmara deve estar 100% envolvida na área da saúde, especialmente num concelho naturalmente envelhecido como Loulé. Não estou a desvalorizar o trabalho já feito, que reconheço como positivo, mas penso que é preciso dar um passo além.
A saúde tem de estar mais próxima das pessoas. Devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para garantir que todos tenham acesso a médicos de família. Já defendi esta proposta antes, porque há municípios onde a própria autarquia paga médicos de família para suprir a falta de profissionais no Serviço Nacional de Saúde. Não sei se a lei permite esta solução, mas é algo que merece ser explorado.
Sei que o centro de saúde funciona bem – sou utente ocasional, como muitos outros. E com a nova estrutura que está a ser construída ao lado, temos todas as condições para melhorar e descentralizar os cuidados de saúde. Resta saber qual será a filosofia do próximo governo em relação à descentralização, mas acredito que a Câmara pode desempenhar um papel fundamental nesta área.
 
V.A: Como avalia a atual gestão da Câmara Municipal de Loulé? Quais são, na sua opinião, os principais pontos positivos ou negativos?
F.S: Os pontos negativos estão muito relacionados com o que já referi. Há uma falta de articulação entre os diferentes setores da Câmara. Apesar de ser uma autarquia com muitos recursos financeiros, a gestão poderia ser mais eficiente.
Por um lado, a Câmara utilizou os seus recursos para assumir responsabilidades que, em teoria, caberiam ao Estado, construindo infraestruturas importantes. Não vejo isso como algo negativo. No entanto, ao concentrar-se nessas áreas, acabou por não avançar com projetos essenciais que seriam da sua competência direta, como a construção de lares, creches e habitação acessível. Em 12 anos, esses equipamentos ficaram por fazer, o que considero uma falha na estratégia municipal.
Na área da habitação, por exemplo, defendo que é urgente restabelecer parcerias com cooperativas habitacionais, algo que foi negligenciado nos últimos anos. Com os recursos disponíveis, poderíamos ter feito muito mais. O problema não é a falta de dinheiro, mas sim a burocracia. O atual modelo de concursos públicos, baseados essencialmente no critério do preço, tem levado a situações em que os concursos ficam desertos. Isso significa que as obras não avançam porque os processos são longos e complexos, e ainda há obstáculos como a aprovação do Tribunal de Contas.
Acredito que a Câmara deve encontrar formas de ultrapassar estas dificuldades. Esta é uma das principais críticas que faço ao atual Executivo. No entanto, quero deixar claro que a minha candidatura não se baseia apenas em apontar falhas. O meu objetivo é resolver os problemas existentes, não apenas criticar o que foi feito. Tenho uma abordagem prática e objetiva. Prefiro focar-me na execução e nos resultados concretos, em vez de elaborar documentos extensos que, na prática, acabam por não ter impacto real.
Sou uma pessoa de ação. Filosofia e estratégia são importantes, mas o essencial é garantir que as coisas acontecem.
 
V.A: Quais são as suas principais prioridades para o futuro, caso seja eleito Presidente nas próximas autárquicas?
F.S: A minha prioridade é, sem dúvida, colocar as pessoas no centro da gestão autárquica. Como já disse, as pessoas precisam de voltar a ser pessoas e não serem apenas números em listas de gestão. Acredito que a forma de melhorar o sistema passa por dar às pessoas mais liberdade, autonomia e mais oportunidade de se expressarem. As instituições públicas precisam de uma transformação profunda, especialmente no que diz respeito à sua relação com os cidadãos.
E, claro, uma das minhas bandeiras será continuar a lutar pela melhoria do PDM e pela revisão de todas as políticas urbanísticas do concelho, para que haja mais transparência, justiça e mais desenvolvimento sustentável.
 
V.A: O comércio local e as pequenas e médias empresas enfrentam desafios crescentes. Que medidas defende para impulsionar a economia de Loulé e apoiar os empresários da região?
F.S: Eu tinha proposto na minha primeira candidatura, que o Parque das Cidades devia ser um centro de estágio de alta competição, de alto nível, e nessa estratégia implicava o quê? Uma parceria com privados da parte hoteleira, se possível do Concelho, criar condições para que a parte hoteleira pudesse fazer parte desse desenvolvimento. Loulé cidade não tem hotéis, houve alguém que quis fazer um hotel na Cruz da Assumada, levou 20 anos, acabou por desistir devido à burocracia.
A questão é: como é que os comerciantes de Loulé funcionam sem ter uma base de apoio hoteleiro? Não há hipótese. A primeira coisa é conseguir cativar. Para isso, é preciso sair da cadeira e agir, porque o problema do Presidente da Câmara de Loulé, desde o 25 de Abril, é a forma como ele se comporta em função da opinião pública. Loulé tem duas ruas de opinião pública, e nas duas ruas a crítica é feita.
Quando se está a gerir uma entidade com quase 3 mil pessoas, que acaba por ser um motor da economia do município, não se pode viver em função daquilo que a opinião pública diz. Tem que se viver em função do que Loulé precisa, porque às vezes a opinião pública está centrada em grupos de pessoas muito fortes, que têm influência sobre o Presidente da Câmara.
Eu costumo dizer que o urbanismo não dá votos, e por isso não funciona. Ninguém vai preocupar-se em fazer o urbanismo funcionar e aprovar projetos rapidamente, porque isso pode tornar alguém mais rico e o Presidente da Câmara fica mal visto por isso. Isto não pode ser. O urbanismo deve gerar empregos e melhorar a cidade, mesmo que isso envolva enriquecer algumas pessoas. Temos de ver as coisas de uma perspetiva mais ampla.
Eu quero que o urbanismo funcione, não tenho medo disso. Em relação à parte hoteleira, ela vai sustentar os pequenos comerciantes. Temos também questões de estacionamento, mas, para mim, a questão não é o estacionamento, é o planeamento da cidade. Loulé, Quarteira e Almancil não estão planeados, e, por isso, as soluções são difíceis. Já propus a necessidade de um plano de circulação e estacionamento para Quarteira, por exemplo. Loulé precisa de um planeamento total, e a maneira de funcionar na cidade deve mudar. O objetivo é criar mais estacionamento, mas de forma a que as pessoas não sintam que estão a perder estacionamento. Deve ser um planeamento bem pensado. O problema de Loulé é que não há planos para nada. E os poucos planos que existem não deixam fazer nada.
 
V.A: Está para breve a inauguração do novo troço da circular de Loulé. Qual é a sua opinião sobre este projeto? 
F.S: Para mim, é apenas uma via urbana, não uma autoestrada. A grande questão será como ela vai funcionar e como vai cumprir as regras de segurança. Não vejo grandes problemas, mas, na minha opinião, o que está realmente a ser feito é tentar introduzir ciclovias em vias que não estavam planeadas para isso. As ciclovias parecem bem na teoria, mas eu não vejo muito movimento nas ciclovias, porque as ciclovias não asseguram a ligação entre casa e trabalho, mas não tenho nada contra as ciclovias.
Em relação à circular sul, eu defendo a sua implementação, mas ela deve ser feita de forma ecológica, aproveitando zonas como o Cadoiço, que estão subaproveitadas. A circular foi desenhada em 1993, quando eu estava na Câmara como consultor, e não foi concretizada, mas isso não significa que seja uma tarefa difícil. O maior problema é a falta de um planeamento geral que integre as várias componentes da cidade. A circular sul deve ser uma das peças de um plano maior que englobe o meio ambiente, zonas verdes e a melhoria da cidade.
 
V.A: Como pretende equilibrar o crescimento do turismo com a qualidade de vida dos residentes em Loulé?
F.S: O turismo não é fácil de lidar, pois não temos uma economia diversificada no Algarve. O turismo tem um grande impacto e, em muitas zonas, como em Lisboa, já há habitantes a combater o turismo. O que devemos fazer é equilibrar o turismo com outras atividades. O turismo cria emprego, mas esse emprego é sazonal. A nossa prioridade deve ser prolongar a temporada turística durante o ano inteiro, para não depender apenas do verão; para isso, as campanhas turísticas deveriam ser feitas de forma diferente.
Isso exige uma gestão cuidadosa, pois a pressão sobre as infraestruturas é grande. Por exemplo, em Loulé, tivemos problemas com as infraestruturas, especialmente com as Águas do Algarve, que ficaram fora de serviço por meses. As coisas têm que ser feitas em conjunto, e não podemos passar as responsabilidades para outros.
O meu objetivo é melhorar a gestão das infraestruturas e criar condições para que o turismo se torne mais sustentável, tanto para os residentes quanto para os turistas. A interligação entre a Câmara e os outros organismos deve ser mais eficiente, para que possamos resolver esses problemas rapidamente. O turismo não pode ser combatido, mas deve ser gerido de forma mais equilibrada e responsável.
 
V.A: Quais serão as principais prioridades do Chega para Loulé nas próximas eleições autárquicas?
F.S: As prioridades do Chega não posso falar por eles, mas as minhas prioridades são aquelas que tenho estado a discutir. A minha maior preocupação é garantir que o serviço público funcione de forma eficiente. Não preciso da política para nada, sou candidato porque acredito que posso fazer a diferença. O meu objetivo principal é fazer a Câmara funcionar como uma equipe, onde todos têm voz e podem trabalhar em conjunto. Se não conseguirmos pôr a máquina a funcionar, não podemos fazer nada. O meu objetivo é melhorar o funcionamento da Câmara e garantir que as pessoas dentro dela se sintam bem, podendo trabalhar de forma tranquila e eficiente. Só depois disso, vamos focar-nos no resto, que será fácil se a equipa estiver bem alinhada. A burocracia é um obstáculo enorme. No entanto, se conseguirmos melhorar a gestão interna, podemos fazer muito mais, mais rápido.
 
V.A: Quais são as suas expectativas eleitorais para a sua candidatura ou do partido para as próximas autárquicas?
F.S: Acredito que o partido poderá aumentar a sua representação na Câmara Municipal. A minha primeira candidatura foi difícil, sem rede, e as pessoas votaram em mim sem grandes expectativas. Agora, a situação é diferente, o partido tem mais força e o apoio está mais consolidado. A nossa meta é ganhar a Câmara, não apenas concorrer para vereadores. Queremos fazer coisas concretas e, para isso, precisamos de estar no poder. Estamos à espera de uma boa votação e temos candidatos qualificados, com carisma e capacidade. O objetivo é montar a melhor equipa possível para trabalharmos juntos em prol de Loulé. O que importa não é só chegar à Câmara, mas saber o que fazer depois de lá chegar. O trabalho sério começa aí.
 
V.A: Contamos, então, com candidatos também para as freguesias?
F.S: Sim, este ano temos candidatos para todas as freguesias. Da última vez, não conseguimos apresentar candidatos apenas para a Serra, porque todos os que queríamos colocar nas listas estavam a trabalhar na Câmara e não conseguimos encontrar outras pessoas. Este ano, já há mais candidatos dispostos a assumir responsabilidades, porque, ao contrário da última vez, o medo de represálias diminuiu.
 
V.A: Mas o que quer dizer com ‘medo’? O que exatamente quer dizer com isso?
F.S: Refiro-me ao medo de represálias, pois percebi que as pessoas têm receio de se envolver, especialmente em tempos de campanha. Quando fiz a minha campanha, fui dentro da Câmara e vi o medo nas pessoas que já conhecia há 40 anos. O ambiente dentro da Câmara era muito difícil e percebi que as pessoas não têm liberdade para falar, porque isso pode afetar as suas carreiras. Esse tipo de medo existe e não se pode negar. Pode não ser algo oficial, mas existe de forma informal, e isso tem de ser dito.
 
V.A: Se for eleito, como se vê o FANAN como Presidente da Câmara? 
F.S: Exatamente igual… exatamente igual, não esperem um FANAN diferente deste, porque não vão ter, de maneira nenhuma, nem por razão nenhuma, não preciso de dinheiro, não gosto de dinheiro, não tenho essa ambição, sou casado, estou perfeitamente estabilizado, tenho dois filhos já crescidos, não quero dinheiro para nada, não sou de luxos, o FANAN é exatamente o mesmo. Aliás, se não for esse FANAN que elegerem, não há mais nenhum.
 
Por Nathalie Dias