Por Luís Pina | Licenciado em Acessoria de Administração | aragaopina59@gmail.com

É dos mais famosos, senão o mais internacionalmente conhecido e famoso dos jogos de tabuleiro. De natureza recreativa e/ou competitiva para dois jogadores, nele se combinam as vertentes desportiva, artística e até científica com tal singularidade que a sua prática e metodologias são um exemplo de maior racionalidade, eficiência, gestão do tempo e autocontrolo em várias áreas da nossa vida: trata-se do Xadrez, que na sua forma atual terá surgido na Europa pelo século XV, durante o Renascimento, estando, contudo, as suas origens mais remotas ligadas à Pérsia e à Índia.

No que respeita à sua prática no Algarve, Loulé tem tido um papel de relevo que, se não é mais conhecido merecia sê-lo, como podemos constatar nesta abordagem com Vítor Prado, um dos seus mais notáveis praticantes e impulsionadores.   

 

A Voz do Algarve: Como e quando é que o xadrez aparece em loulé de forma organizada como Clube e / ou Associação?

Vítor Prado: Em Loulé, o Xadrez surgiu através do Clube Desportivo da Marina, (Cerveja Marina), onde um grupo de trabalhadores se constituiu como um clube federado. Contudo, julgo que durou apenas um ano. Depois, alguns desses jogadores transferiram-se para a Sociedade Recreativa Artística Louletana, (mais conhecida pelos Artistas), cuja sede era no edifício onde hoje funciona a Assembleia Municipal. O principal dinamizador foi o Vítor Carapinha.   

 

V.A. Com quantos praticantes regulares ou inscritos conta atualmente?

V.P. O Clube conta atualmente com 30 jogadores federados, na sua maioria seniores. Também existem alguns jovens, mas poucos.

 

V.A. Em que eventos, provas ou torneios aquém, ou mesmo além-fronteiras tem participado?

V.P. A equipa participa nos torneios regionais, nacionais e por equipas tem duas nos campeonatos nacionais, uma na 2ª. Divisão e a equipa B na 3ª. Divisão. Com a pandemia não houve treinos massificados para os escalões de formação. Antes, faziam-se torneios com cerca de 20 miúdos em média, aos domingos de manhã. Em termos do Xadrez online, a equipa do site www.lichess.com, a equipa de Loulé conta com 273 jogadores.  

 

V.A. Muito mais que um mero passatempo ou divertimento o xadrez é um desafio à inteligência, potenciador de qualidades como a destreza mental. É matéria de estudo com reflexo transversal nas disciplinas escolares e mesmo na própria vida. Quer falar-nos um pouco nisso?

V.P. O Xadrez é um misto de arte, desporto e ciência (um Xadrezista depende da sua criatividade e imaginação), de ciência, (pressupõe a aquisição de conhecimento e exige a sua aplicação através de um método para científico), e de desporto, (tem uma dimensão competitiva, de superação do outro e das limitações do próprio Xadrezista).

A principal aptidão que o Xadrez potencia nos seus praticantes é a melhoria do processo de tomada de decisões: ambos os jogadores são colocados na mesma situação inicial e devem utilizar os recursos que lhes são disponibilizados para montar uma estratégia vencedora.  

 

V.A. Há uma infinidade de sites e aplicações que o universo on-line nos oferece sobre a modalidade. Neste sentido o que recomendaria numa primeira abordagem para quem quiser iniciar-se e progredir de forma correta?

V.P. Quanto aos sites mais conhecidos temos o www.lichess.com e www.chess.com, onde chegam normalmente a estar online mais de 150.000 jogadores, havendo torneios 24 horas/dia. Aliás, já há jogadores em diversos fusos horários. Quanto à minha participação, atualmente, limito-me a jogar online, em tempos curtos, entre 2 a 3 minutos para cada jogador, em que as partidas demoram, cada, cerca de 5 a 8 minutos. Ou seja: participo em torneios onde os jogos todos perfazem uma hora.

 

V.L. No que respeita à divulgação do xadrez e suas vantagens considera que estamos no bom caminho ou poderia ser feito mais para o dar a conhecer?

V.P. O Xadrez sempre foi visto como uma modalidade pobre, para pessoas superinteligentes, mas isto é um mito. O Xadrez é um jogo em que cada um pode adaptar o seu ritmo. Pode ser um praticante lúdico, um jogador federado ou até mesmo profissional. Existem diversos torneios com Price Money que permite a muitos jogadores ganharem algum dinheiro.

 

V.A. Voltando a loulé, e para os eventuais interessados, quem devem contactar ou a que sites(s) devem aceder?

V.P. O Clube de Xadrez de Loulé + + é talvez, atualmente, o clube mais dinâmico do Algarve graças a um conjunto de pessoas que dão gratuitamente o seu tempo em prol do desenvolvimento da atividade Xadrezista. Gostaria neste sentido de realçar Vítor Leal, o Tiago Pinho e o Amarilo Lima, entre outros, que mantêm o clube a funcionar.

 

V.A. E quanto ao Vítor Prado?

V.P. Iniciei a prática do Xadrez quase de uma forma autodidática, onde o primeiro contacto que tive com o jogo foi um tabuleiro que estava exposto na montra da antiga Livraria Aleixo, onde eu e um amigo meu de juventude, o Leonel Caetano, aprendemos a colocar as peças. Depois descobrimos que na sede do Louletano havia um tabuleiro, e como nós éramos atletas do clube podíamos frequentar a sede. Lembro que na altura nem as peças sabíamos mexer. Resolvemos então comprar um livro que era o ABC do Xadrez onde aprendi os movimentos e algumas aberturas. A partir daí foi sempre a evoluir; partimos do zero, e nas noites de inverno lá começávamos a jogar, também com novos amigos que foram aparecendo, e tudo num ambiente lúdico. Eis então que soube do surgimento do Xadrez nos Artistas através de um torneio no dia 25 de Abril, no que seria o início da prática um pouco mais a sério e onde já havia jogadores de melhor nível que o meu. Contudo, com o esforço e empenho, lá os fui ultrapassando. Começamos a entrar nos campeonatos regionais e no meu caso, na primeira vez, fui logo vice-campeão regional de juvenis ainda pelos Artistas, em 1981. No ano seguinte, já pelo Louletano, fui campeão do Algarve de Juniores, o que me deu direito de participar no campeonato nacional, onde estavam os melhores a nível nacional, tendo conseguido uma boa classificação graças a várias vitórias. Fui convidado a participar numa simultânea com o único grande mestre português, António Antunes, na qual fui o único jogador que conseguiu empatar o jogo. Participei em vários circuitos de verão, em Xadrez em diversas localidades do Algarve e Andaluzia e em que tínhamos oportunidade de defrontar jogadores, alguns deles profissionais. Torneios do INATEL, Torneios Inter - bancários, onde consegui participar numa fase final, tendo obtido um sétimo lugar entre centenas de jogadores, o que foi ótimo.

A minha participação como dinamizador durou anos, no Artistas, no Louletano e na Casa da Cultura, e então surge o tempo em que os estudos começavam a exigir mais tempo, o que me obrigou a deixar de jogar com regularidade. Mais recentemente, como Presidente da Associação de Pais, criei um projeto de iniciação ao Xadrez para crianças do Pré-Escolar onde visava ensinar procedimentos para a vida através do jogo, tal como saber regras, respeitar os outros, tomar decisões e sacrificar coisas a fim de conseguirmos atingir os nossos objetivos. Saber estar na vitória e na derrota, ser cordial e cumprimentar os adversários; saber que temos tempo para decidir, saber estar em silêncio para nos concentrarmos. Foi um projeto que movimentou ao longo de 4 anos mais de uma centena e meia de crianças, tendo sido bastante enriquecedor tanto para elas como para mim. É também gratificante saber que algumas delas continuam a jogar e acima de tudo a afirmarem-se como bons alunos na sua atividade escolar.