Taxas de juro altas deverão ser temporárias. Inflação global desce lentamente. E há nervosismo com crise financeira, alerta.

Os bancos centrais de todo o mundo começaram a subir as suas taxas de juro de referência para travar a alta inflação que se começou a fazer sentir no início de 2022 e que escalou com a guerra na Ucrânia. Assim foi anunciado o fim da era dos empréstimos mais baratos de sempre. Mas poderá não ser bem assim. O Fundo Monetário Internacional (FMI) acredita que assim que a inflação estiver sob controlo, os bancos centrais deverão trazer de volta as taxas de juro aos níveis pré-pandémicos. No caso na Zona Euro, significa que o Banco Central Europeu (BCE) poderá reduzir a taxa de refinanciamento até chegar a 0%, o nível em que estava em 2019.

Hoje, a inflação já está a dar sinais de descida em vários países do mundo. Também na Zona Euro já está a descer há vários meses, fixando-se em 8,5% em fevereiro. Mas, segundo a presidente do BCE, “projeta‑se que a inflação permaneça demasiado elevada durante demasiado tempo”. Por isso mesmo, o BCE e outros bancos centrais continuam empenhados em subir as taxas de juro diretoras para fazer com que a inflação baixe até aos 2%, o nível em que é assegurado a estabilização de preços.

Sobre este ponto, o FMI acredita que “os recentes aumentos nas taxas de juros reais provavelmente serão temporárias”. Isto porque “quando a inflação estiver novamente controlada, os bancos centrais das economias avançadas deverão aliviar a política monetária e trazer as taxas de juros reais de volta aos níveis pré-pandémicos”, explica no World Economic Outlook de abril.

Isto quer dizer que os bancos centrais irão voltar a ter as taxas de juro próximas de 0% Este é o caso do BCE que em 2019 (antes da pandemia) apresentava as seguintes taxas:

  • Taxa de juro das principais operações de refinanciamento estava nos 0% (hoje está nos 3,5%);
  • Taxa aplicada à facilidade permanente de depósitos encontrava-se em -0,5% (hoje está em 3%);
  • Taxa aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez estava em 0,25% (hoje está em 3,75%);

Importa recordar que, quando o BCE voltar a descer os juros, as taxas Euribor também deverão baixar. Resta saber se também se fixarão - ou não - nos níveis pré-pandemia, em que estavam em terreno negativo. 

De qualquer forma, o FMI reconhece que a descida das taxas de juro de referência pelos bancos centrais dependerá de vários fatores, como a persistência de níveis elevados de dívida pública, que poderá levar a que as taxas de juro desçam, mas para níveis mais altos do que antes da pandemia. Quantos às economias emergentes – como a China, Índia e Brasil – o FMI prevê uma convergência ao longo do tempo com os níveis baixos de juro “natural” das economias avançadas, por força das tendências demográficas e de produtividade.

Como vai evoluir a inflação em 2023? E em 2024?

As reações dos bancos centrais dependem, de resto, da evolução da inflação nas diferentes economias (entre outros fatores económicos). De acordo com as previsões económicas mundiais divulgadas pelo FMI, a inflação global deverá diminuir para 7% em 2023 (4,9% em 2014), assumindo, assim uma queda mais lenta que o previsto. Já inflação subjacente provavelmente irá cair mais lentamente.

Na Zona Euro, a inflação deverá cair para 5,3% este ano e 2,9% em 2024, prevê o FMI. Entre as economias do espaço europeu, o FMI prevê uma taxa de inflação:

  • na Alemanha de 6,2% este ano (3,1% em 2024);
  • em França de 5% este ano (2,5% em 2024);
  • em Portugal de 5,7% este ano (3,1% em 2024);
  • em Itália de 4,5% este ano (2,6% em 2024);
  • em Espanha de 4,3% em 2023 (3,2% em 2024).

Na atualização das previsões económicas mundiais, a instituição liderada por Kristalina Georgieva assinalou que a inflação global está a cair lentamente, o crescimento económico continua historicamente baixo e os riscos financeiros aumentaram. Isto porque o impacto dos choques de 2022 ainda se fazem sentir e, agora, a economia lida com a recente turbulência no sistema bancário.

Com resultado deste contexto económico, o FMI considera que “é provável” que muitas economias registem um crescimento mais lento nos rendimentos em 2023, enquanto se assiste a um aumento do desemprego.

Entre as economias avançadas, o FMI melhorou, contudo, as previsões para a economia dos EUA, para a qual prevê uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,6% este ano e 1,1% em 2024. Já em relação à Zona Euro aponta para um crescimento económico de 0,8% este ano e de 1,4% em 2024. Para o Japão aponta para uma expansão de 1,3% este ano e 1% em 2024.

Entre os mercados emergentes e economias em desenvolvimento, manteve as taxas de crescimento da China de 5,2% este ano e de 4,5% em 2024, enquanto reviu em baixa as da Índia para 5,9% em 2023 e 6,3% em 2024.

FMI reconhece instabilidade no mercado devido a turbulência no setor bancário

Para o FMI, os efeitos colaterais do rápido aumento das taxas de juro estão a surgir, à medida que as vulnerabilidades do setor bancário se tornaram um foco e os receios de contágio aumentaram no setor financeiro, incluindo instituições financeiras não bancárias.

"O sistema financeiro global está a evidenciar tensões consideráveis à medida que o aumento das taxas de juro abala a confiança em várias instituições", alertou Tobias Adrian, o economista-chefe do FMI responsável pelo setor financeiro e bancário, lembrando que “historicamente são esses fortes aumentos das taxas dos bancos centrais que são seguidos por tensões que expõem falhas no sistema bancário”. E foi precisamente isso que esteve por detrás das falências do Silicon Valley e do Signature Bank, nos EUA, e das sérias dificuldades pelas quais passou o Credit Suisse, um banco entretanto comprado pelo suíço UBS. Esta situação está, hoje, a gerar nervosismo nos mercados devido à instabilidade bancária, admitiu o FMI.

A boa notícia é que os decisores políticos “tomaram medidas enérgicas para estabilizar o sistema bancário”. Além disso, “o sistema bancário tem muito mais capital e financiamento para resistir a choques adversos, as entidades fora do balanço foram descontinuadas e os riscos de crédito foram limitados por regulamentos pós-crise [de 2008] mais rigorosos", destaca o FMI.

A instituição recomenda que, “mais do que nunca”, os decisores políticos precisam de comunicar claramente, considerando que a política orçamental deve desempenhar um papel ativo, nomeadamente através de uma consolidação de forma a permitir construir almofadas financeiras.

Por outro lado, defende que, “contida a instabilidade financeira, a política monetária deverá manter-se focada na redução da inflação, mas pronta a ajustar-se rapidamente à evolução financeira” e que os reguladores e supervisores também devem fortalecer a supervisão e gerir ativamente as tensões no mercado para evitar que as fragilidades se agravem.

 

Por: Publituris/Com Lusa