por Irina Martins | Deputada da Assembleia Municipal de Loulé eleita pelo PSD

Cresce entre nós o conceito de cidadania ativa. À medida que a democracia portuguesa amadurece, a política deixa de ser feita entre quatro paredes e de portas fechadas aos cidadãos. Neste momento proliferam, como nunca, as iniciativas espontâneas de cidadania, os movimentos independentes de cidadãos, as petições públicas e tantos outros instrumentos de participação em sociedade. Têm em comum o facto de todos eles mostrarem a vontade dos cidadãos em participar na sociedade, na sua constante construção e melhoramento, mas escolhem uma via separada do espectro partidário, desvinculando-se dos partidos que consideram marcados pela promiscuidade e pelo clientelismo. Infelizmente enquanto existirem políticos "duvidosos", a integridade de toda a classe será posta em causa.  A transparência não se apregoa. Pratica-se. Devemos ser exigentes não só connosco próprios mas também com os outros.

Tomemos por exemplo a Assembleia Municipal de Loulé. Não entrarei na discussão legal relativa à existência de inelegibilidades ou incompatibilidades de funções dos deputados municipais no exercício dos seus mandatos. Pareceres jurídicos existem para todos os gostos e que assentam que nem uma luva nos casos concretos em que os queiramos inserir, até porque a última decisão em caso de dúvidas persistentes, que certamente haverão, caberá aos tribunais competentes para decidir dessa matéria.

Eu coloco a questão do ponto de vista ético e moral, onde a matéria se torna altamente censurável, quando analisada atentamente. Não é linear que um deputado no exercício das suas funções mantenha a isenção e imparcialidade exigidas pelo cargo, quando mantém de forma continuada um contrato ou recebe avenças por parte da Autarquia.

Nunca é demais relembrar que a Assembleia Municipal é o órgão fiscalizador do executivo camarário e que neste momento tem em mãos a aprovação de um orçamento municipal de 104 milhões de euros. Qualquer ilegitimidade, suscitada nesta votação poderá ter consequências desastrosas para o Município, sendo que o superior interesse do concelho tem de ser sempre salvaguardado. Neste mesmo orçamento estão previstas transferências de capital para empresas municipais, das quais fazem parte alguns deputados, em funções não executivas, mas ainda assim não deixam de estar vinculados duplamente, pela Assembleia Municipal e pela Empresa Municipal, não se podendo exigir a esses deputados que sejam bom juiz em causa própria.

São ainda aprovadas verbas para áreas concretas das quais alguns deputados dependem, porque têm avenças ou são funcionários, e à semelhança da questão anterior o facto de se ser jogador e árbitro no mesmo jogo, leva a que questionemos a isenção e transparência do resultado desse mesmo jogo. Não está assegurada uma votação isenta e reta, pois poderá subsistir um receio, ainda que inconsciente, de sofrer represálias, pois está dependente economicamente do órgão que em variadas matérias fiscaliza. A transparência do exercício  do cargo tem de estar assegurada, sem que subsista algum tipo de promiscuidade ética e/ou moral no seu exercício. 

Defender a democracia autárquica passa sem dúvida pela integridade de todos os atores políticos, apenas através da verdade e da seriedade conseguiremos aproximar os cidadãos novamente da política e do processo de tomada de decisões.

Fazer e estar na política é das mais nobres missões que alguém pode abraçar. É dar de si à comunidade em que vivemos, em nome do serviço público. Elevar princípios menos nobres é escurecer o processo democrático, é fazer de deputados municipais marionetas a soldo e preço de mercado. É desvirtuar o que mais precisamos neste momento: uma política mais ética, mais transparente e mais próxima dos cidadãos.

É no Presente que temos de ter a ousadia de denunciar, para que possamos construir um Futuro bem melhor que o nosso Passado.