Por: António Grosso Correia

Escrevo este artigo no dia 21 de Março de 2023, motivado, por um lado, pela tão badalada sentença proferida pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), em que este decidiu emitir um mandado de detenção contra Putin, e, por outro lado, para fundamentar a opinião que titula esta peça.

Ora, tal sentença é, pura e simplesmente, ineficaz, no que a tal mandado se refere, pela simples razão de que aquele tribunal não dispõe de jurisdição sobre os cidadãos russos, como, aliás, também a não dispõe sobre os cidadãos norte americanos, chineses e de outras nacionalidades, dado os respetivos países não terem ratificado o Estatuto de Roma, que instituiu aquele tribunal. (A propósito, imagine-se, os Estados Unidos puseram como condição para proceder àquela ratificação que ficasse salvaguardado que os seus cidadãos não seriam julgados por aquele tribunal!).

Lamento, contudo, aquela ineficácia, porque estou plenamente convicto de que o visado na mencionada sentença bem merece ser detido e julgado – a ter perpetrado os crimes de que se fala, no âmbito da invasão da Ucrânia. Assim como lamento que não sejam julgados outros cidadãos de outros países, como os acima referidos, que tenham praticados crimes idênticos.

Pela mesma razão, da mencionada não ratificação, nenhuma autoridade de qualquer país pode deter Putin por via da aludida sentença.

Portanto, tal decisão, em termos jurídicos, não passa de uma fantasia, que ainda por cima, e no meu modesto juízo, ridiculariza tanto a instituição que a proferiu, como quem tem vindo a defender que o sentenciado pode ser detido, à luz da mesma!

É pena que as referidas potências não tenham ratificado o aludido estatuto, obstaculizando, assim, a plena funcionalidade de um órgão jurisdicional de que a Humanidade tanto necessita.

Aliás, a garantia da nossa liberdade – enquanto povos soberanos – só resultaria do respeito escrupuloso e civilizado, DE TODOS, pelo direito internacional, cujo seu principal instrumento é a Carta das Nações Unidas, que consagra a resolução pacífica dos conflitos: seja através das vias (utilizadas pelas partes em conflito, a convite do Conselho de Segurança) da negociação, da mediação, da conciliação, da arbitragem, do recurso aos tribunais, a entidades ou acordos regionais ou a qualquer outro meio pacífico (Capítulo VI); seja, se tais vias falharem, através de medidas (aplicadas pelos membros das Nações Unidas, também a convite daquele Conselho) de carácter coercivo, consubstanciadas, por exemplo, na interrupção completa ou parcial das relações económicas, dos meios de comunicação ferroviários, marítimos, aéreos, postais, telegráficos, radiofónicos e no rompimento das relações diplomáticas (Capítulo VII). Que país, objecto destas medidas, sobreviveria? Daí a sua eficácia e a desnecessidade de guerra. E só no caso de aquele Conselho considerar inadequadas ou ineficazes aquelas vias e medidas é que serão adoptadas (por ele) outras medidas de grau mais forte, mas ainda assim privilegiadamente dissuasoras, através de acções levadas a efeito por forças aéreas, navais ou terrestres, que poderão compreender demonstrações, bloqueios e outras operações, pelo referido conselho julgadas adequadas à manutenção ou restabelecimento da paz e da segurança internacionais.

Deste modo, do mencionado diploma legal, logo se me afigura legítimo extrair duas conclusões irrefutáveis, assim os países membros das Nações Unidas respeitassem a sua Carta: a primeira é que a sociedade internacional dispõe de meios legais, pacíficos, para resolução dos seus conflitos; a segunda é que nenhum conflito, que coloque em risco a paz e a segurança internacionais, pode ser resolvido à revelia das Nações Unidas. A não ser no caso – excepcional – da legítima defesa, verificados que sejam os seus pressupostos e enquanto o Conselho de Segurança não tomar as medidas necessárias ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais (artº. 51º. da Carta).

A guerra não é solução. A guerra é em si mesma um mal: mata e arruina (salvo os fabricantes e comerciantes de armamento, que vivem à custa do sofrimento, da fome, da miséria e da morte de tantos milhões dos seus iguais!...). A guerra é a derrota da Humanidade – como sabiamente referiu o Papa.