No tempo de D. Dinis, todos os mouros ligados ao controlo militar e administrativo do território lusitano tinham já sido expulsos das terras do Algarve. Mantinham-se, no entanto, as populações há muito arabizadas e mais ligadas ao solo e ao mar da região do que às elites do califado.
Ali Agat, por esses tempos apanhador de medronho na serra de Estoi, que depois vendia nas povoações ribeirinhas, andava certo dia embrenhado na mata arbustiva, atarefado a apanhar os frutos maduros e a encher com eles uma cesta de vime. Os demasiado maduros e os já debicados pelos pássaros iam-lhe enganando a fome. Quando o calor apertou, recolheu-se a uma sombra cerrada e foi roendo o pão de grão de bico que tinha trazido de casa. Depois, deitou-se a dormir debaixo de uma alfarrobeira de copa densa. Quando acordou, manteve-se ainda um pouco, de costas, no chão forrado de folhagem, a saborear o fresco, de olhar perdido no interior da copa da árvore, atravessada aqui e ali pelos raios de sol de princípio da tarde.
Percebeu então, uma alfarroba de brilhos dourados e maior do que as outras. Apanhou-a e logo suspeitou, pelo peso e pelo brilho, que devia ser de ouro. Foi tomado de enorme orgulho e alegria. Possuir uma alfarroba de ouro era algo que nunca se atrevera a desejar. Tomou-lhe o peso, admirou-lhe os reflexos, a curvatura elegante. Durante um bocado, brincou com ela, como uma criança que tem um brinquedo novo. Quando ficou satisfeito, meteu-a no bolso da “jelaba” e apressou-se a voltar para casa, para a mostrar à mulher. Andou, andou toda a tarde, mas a sua aldeia ficava longe e a alfarroba cada vez lhe pesava mais no bolso. A certa altura, sem poder mais, resolveu enfiá-la na loca de uma árvore. Viria buscá-la depois. Pôs-se à procura de uma apropriada e foi então que uma cabra, que por ali andava a pastar, o interpelou:
- Dá-me essa alfarroba, Ali Agat! Essa e muitas outras alfarrobas de ouro estão à minha guarda, desde que o meu pai teve de fugir para Granada.
Continua…