Cíntia Andrade Advogada, Licenciada em Direito e Mestre em Ciências Jurídico-Civilísticas

O Supremo Tribunal Administrativo veio uniformizar a jurisprudência, determinando, através do acórdão n.º 7/2025, de 29 de abril de 2025, que a alienação de um quinhão hereditário (uma quota-parte de uma herança indivisa), não configura “alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis” e que, nesse sentido, o ganho resultante dessa venda não constitui uma mais-valia sujeita a IRS.

 

1.  Enquadramento

1.1 O tribunal foi novamente confrontado com a questão de saber se a alienação onerosa de um quinhão hereditário, que no caso específico se referia à venda de um imóvel que constituía o único bem de uma herança, configurava, ou não, uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis para efeitos de tributação como mais-valia em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS).

1.2 O acórdão agora proferido diz respeito a um recurso de uniformização de jurisprudência, interposto pela Diretora-Geral da Autoridade Tributária, que visa resolver uma oposição de julgados entre duas decisões arbitrais do Centro de Arbitragem Administrativa sobre a mesma questão fundamental de direito: saber se o ganho obtido com a venda de uma quota-parte de uma herança indivisa constitui uma mais-valia sujeita a IRS, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRS.

 

2. Decisões Opostas

2.1 De um lado, a decisão arbitral recorrida havia anulado uma liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2020, por ter entendido que os ganhos resultantes da venda de um quinhão hereditário não estavam sujeitos a IRS. De acordo com o tribunal arbitral, enquanto a herança se mantiver indivisa, o herdeiro detém um direito a uma quota da massa de bens da herança, e não um direito individual (direito de propriedade) sobre cada um dos bens que integram a herança.

2.2 Do outro lado, o tribunal arbitral entendeu que, o herdeiro, ao aceitar a herança e a sua quota-parte no imóvel vendido, adquire um direito real de propriedade sobre o bem, respondendo pelos direitos e deveres que advêm desse direito de propriedade. Assim, a venda de uma quota-parte que um herdeiro tem sobre um imóvel (quinhão hereditário) antes da partilha corresponde a uma alienação onerosa de um direito real (direito de propriedade) sobre um bem imóvel, geradora de uma mais-valia sujeita a IRS.

 

3. Quinhão Hereditário

3.1 O quinhão hereditário representa a parte, fração ou quota a que cada herdeiro tem direito numa herança indivisa, aberta por óbito de terceira pessoa. A herança é indivisa enquanto não existir a partilha dos bens da herança (bens imóveis, bens móveis, dinheiro e outros ativos deixados pelo falecido).

3.2 Numa herança indivisa, cada um dos herdeiros possui um direito sobre o património como um todo, e não sobre bens específicos e individualizados, correspondendo essa parte do património como um todo a um quinhão hereditário.

 

4. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

4.1 O acórdão vem, de forma inequívoca, uniformizar jurisprudência no sentido de que, a alienação, por parte dos herdeiros, de um quinhão hereditário, não configura uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (para os efeitos do disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS), pelo que o ganho resultante dessa transmissão não está sujeita a tributação em sede de IRS na esfera jurídica dos herdeiros como mais-valia.