O bacalhau e o polvo continuam a ser os principais pratos do Natal em Portugal, como confirmaram alguns «chefs», apesar de algumas localidades manterem tradições diferentes, como Freamunde com o capão ou Olhão com o litão.

Virgílio Nogueiro Gomes, investigador em história da Alimentação, considera que, “de um modo geral, têm-se mantido as tradições” gastronómicas no Natal.

“A ‘mensagem de Natal’ é que tem mudado muito. Por outro lado, tem aumentado o número de refeições de Natal servidas em restaurantes, devido à vida agitada, porque todo o grupo familiar tem atividades profissionais”, afirmou, salientando que se está a perder “o próprio conceito de festa de família”.

De acordo com o gastrónomo, “a tradição do bacalhau e do polvo vem do tempo, até finais do século XVI, em que a semana que antecedia o dia de Natal era período de abstinência, que proibia o consumo de carne”.

A imposição religiosa era a de que se comesse peixe, mas existiam "dificuldades de pesca neste período do ano" e o bacalhau e o polvo poderiam ser secos e chegar mais facilmente ao interior do país.

“Depois da Missa do Galo, iniciava-se a ceia com carne”, explicou.

Há terras que mantêm tradições próprias, “muito localizadas”, como o capão em Freamunde, o litão (um peixe da família do tubarão) em Olhão, o borrego no ribatejo e as sandes de carne em vinha de alhos na Madeira.

Para Virgílio Gomes, é difícil explicar a manutenção destas tradições, no “tempo das facilidades, num tempo de muita comunicação e de outros apetites”.

Os ‘chefs’ contactados pela Lusa, mesmo os que são considerados mais inovadores, afirmaram que, no Natal, seguem as tradições familiares.

É o caso de Vítor Claro, do Solar Palmeiras, em Paço de Arcos, Oeiras, que se confessa “apegado a algumas tradições”.

“O Natal é uma delas, não pelo lado religioso, mas pelo lado familiar”, destacou, recordando as festas de infância em família na terra da mãe, perto de Vila de Rei, onde há sempre o bacalhau e o arroz de cabidela.

No ano passado surgiu, pela primeira, vez o peru.

“Não comi. Para mim é daquelas coisas com que não se pode brincar. O capão sim, o galo de cabidela, mas o peru não é nosso”, destacou.

Alexandre Silva, do restaurante “Loco”, em Lisboa, destacou que “o tema ‘gastronomia’ implica muita coisa”, nomeadamente o mais importante, que é “estar à mesa com as pessoas” de quem se gosta.

Também é considerado “um renovador”, mas neste caso segue as tradições familiares, ribatejanas, que incluem o bacalhau na Consoada, a “roupa velha” no almoço do dia 25 e o borrego assado no forno a lenha.

“Não vale a pena mudá-las [as tradições], porque fazem parte da nossa história”, disse.

É a maneira tradicional portuguesa de cozinhar que manda na Casa Inês, no Porto, da ‘chef’ Inês Diniz, que cresceu praticamente no restaurante da mãe, com quem aprendeu a fazer tudo.

“Foi assim que fui habituada, o bacalhau cozido na véspera, as rabanadas a aletria, os sonhos, o bolo-rei, o leite-creme”, disse.

Apesar de nos últimos anos terem aumentado os pedidos para abrirem, Alexandre Silva e Vítor Claro fecham os restaurantes no Natal e realçam que, como estão de folga, deixam os cozinhados para a família.

No entanto, Vítor Claro deixou alguns conselhos: comprar um bom bacalhau, demolhá-lo em água corrente ou mudar a água quatro a cinco vezes por dia e não deixar ferver a água da cozedura.

Batatas cozem-se à parte, porque demoram mais tempo, e ter em conta que as couves e os ovos também têm tempos de cozeduras diferentes, até ficarem no ponto.

 

Por: Lusa