Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com
Caríssimos Corvos, estimados irmãos,
Neste mês de janeiro trago-vos à memória, recordando na fé os vossos ancestrais, que daqui, segundo a tradição velaram e acompanharam em 1173 as relíquias de Vicente a bordo de uma barca para a Cidade de Lisboa a mando do rei Afonso Henriques. Aqui haviam chegado, anos antes, das Espanhas, os restos mortais do corpo de Vicente, um jovem servidor da Igreja de Saragoça, diácono ao serviço do Bispo Valério, que morrera mártir nas perseguições às Igrejas cristãs movidas por Daciano no tempo do Imperador Dioclesiano.
Vicente é uma testemunha da fé dos primeiros tempos da Igreja que, foi proclamado posteriormente a este acontecimento, patrono da nossa Diocese do Algarve. Por causa desse acontecimento e de aqui terem repousado os restos mortais desse jovem mártir, o território, desde esse tempo passou a chamar-se Costa Vicentina onde se situa o Cabo de São Vicente. Como corvos, aves da família dos corvídeos, normalmente caracterizados pela vossa plumagem escura sois interpretados como o sinal místico de mau presságio. Mas aqui, fostes, na verdade, um sinal de proteção e vigilância. Simbolicamente, estais muito relacionados com o mau agouro, a morte, o azar e com outros elementos obscuros e sombrios. Isto porque sois necrófagos, imitais com mestria o tom de alguns animais, incluindo os humanos. Sois predominantemente pretos, cor da noite, das trevas e da morte, do obscuro e do maligno.
Falais do mistério e de realidades enigmáticas. No entanto, também podeis simbolizar, como aqui aconteceu, algumas características positivas, como a sabedoria, a astúcia e a fertilidade. Sois também símbolo de regeneração e mensageiros de boas energias. Ficastes imortalizados em grandes obras de arte e de literatura como atesta a do escritor estadunidense Edgar Allan Poe que, se popularizou como um dos autores mais icônicos do romantismo sombrio. Não raras vezes, costumais ser muito utilizados como amuletos de proteção, principalmente sob a forma de tatuagens. Representais a astúcia, a cura, a sabedoria, a fertilidade e a esperança. Na Mitologia Grega éreis consagrados a Apolo, Deus da luz do Sol, e para eles desempenháveis o papel de mensageiros dos deuses visto que possuíeis funções proféticas.
Provavelmente, a Europa e o cristianismo foram os propulsores da aceção negativa a vós atribuída e, atualmente, espalhada pelo mundo fazendo parte de muitas crenças, religiões, mito e lendas. Nem sempre estais presentes na Quinta, mas quando regressais, nunca é indiferente a vossa presença. Nesta hora de grandes mudanças, onde são temerosas as travessias em alto e desconhecido mar, onde a barca da vida nos transporta, também necessitamos que nos acompanheis protegendo a memória da nossa identidade e da nossa História. Ensinai-nos a vigilância e a de sabermos nos proteger das intempéries e sinuosidades da viagem.