As paróquias de Santa Maria e de São Sebastião de Lagos, do Barão de São Miguel, de Bensafrim e da Luz de Lagos inauguraram no passado domingo, 17 de novembro, em que a Igreja assinalou o VIII Dia Mundial dos Pobres,
a ‘Casa Padre Almeida’ que irá dar suporte à pastoral sóciocaritativa levada a cabo por aquelas comunidades e pretende homenagear o trabalho do antigo pároco, padre Abílio Almeida, naquelas paróquias.
“Depois de mais de dois anos procurando entender a melhor forma de implementar a pastoral sóciocaritativa nas nossas comunidades, eis-nos aqui a inaugurar este espaço. Será a partir daqui que iremos procurar realizar esta missão que é própria de cada batizado e não apenas dos voluntários que se ofereceram para concretizar este projeto”, afirmou o pároco daquelas cinco paróquias na sessão de inauguração e bênção daquele espaço, criado numa antiga loja de roupa no rés-do-chão de um prédio de um bairro da cidade e que foi vendido pelos antigos proprietários, um casal de paroquianos “muito envolvidos” no trabalho paroquial, a um “valor bastante reduzido tendo em conta a finalidade” a que se destinaria.
O padre Nelson Rodrigues explicou que a primeira fase de implementação do projeto incluirá duas linhas de ação: “combater a fome e combater a solidão”. Ao Folha do Domingo, o sacerdote acrescentou que a segunda dimensão será trabalhada “através da conversação com os bombeiros e com a GNR, que têm estas situações detetadas”, para que os voluntários possam visitar as casas de quem vive só.
Esta primeira fase incluirá também a oferta de uma bolsa de estudo no próximo ano letivo a um estudante que termine o secundário e não tenha recursos para seguir para a universidade.
A segunda fase do projeto disponibilizará apoio psicológico e emocional. “Visa o acompanhamento psicológico e espiritual, tendo em conta também as situações espiritualmente vividas por pessoas que andaram metidas noutros ramos da espiritualidade e vivem traumas dessas experiências”, explicou o sacerdote, acrescentando que também incluirá a aquisição de uma carrinha para se fazer a distribuição de comida quente, uma vez por dia, noutro ponto da cidade “onde os sem-abrigo normalmente estão”.
“Não queremos mais uma casa, entre outras tantas que tenham ações de solidariedade. Queremos uma casa aberta a todos e que se esforce por corresponder às necessidades de todos. Isto não significa que todos os que vierem aqui a entrar encontrem a solução rápida para os seus problemas. Mas uma coisa vos garanto: tudo farei para que todos os que aqui entrarem sintam que são escutados e aqueles que os escutam se interessam pelo seu problema e se esforçam por solucioná-lo. Só assim respeitaremos o legado do senhor padre Almeida”, advertiu o pároco na sessão de inauguração, lembrando que “o ser humano não precisa apenas de habitação, saúde ou alimentação”.
Constatando que aquele espaço fica “afastado” das igrejas, mas “no meio do povo”, o padre Nelson Rodrigues realçou que “a caridade implica o movimento de saída”. “Não podemos ficar à espera que o necessitado busque quem o possa ajudar. É dever do cristão sair à procura de quem precisa do seu auxílio”, alertou, pedindo: “que esta casa, localizada no meio das casas, nos lembre o dever de ir à procura e não nos instalemos, por favor, à espera que nos batam à porta”.
“É uma casa que, por acaso, se situa num bairro de classe média. Não buscámos uma casa no meio de um bairro social ou numa periferia. E devemos entender todos isto: a pobreza não pode ser segregada”, prosseguiu, considerando que “amar não é uma decisão facultativa”. “Ela é obrigatória e transversal a todo o ser humano”, completou, acrescentando que “não existe ninguém tão pobre que não tenha nada para dar, nem ninguém tão rico que não tenha nada para receber”.
O sacerdote aludiu ainda à “dimensão reduzida” daquele espaço. “O tamanho da casa deve-nos recordar que estamos desafiados a permanecer sempre em movimento. Não queremos um armazém de bens parados, queremos uma estrutura em movimento. Aliás, sempre que esta casa estiver cheia é sinal que os bens estão a fazer falta a alguém. Não o permitamos. Que tudo aquilo que aqui vier a entrar tenha o devido destino rapidamente e o destino é quem precisa desses bens”, pediu.
O pároco referiu que aquele serviço contará inicialmente com 30 voluntários – incluindo “muita gente que não estava comprometida na Igreja e que se abeirou por causa deste serviço” – que procurarão “trabalhar de mãos dadas” com “autarquias, bombeiros, forças de segurança civis ou militarizadas, IPSS, associações, Igrejas irmãs, empresas, privados e tantos outros”. “Podemos fazer tanto por estas terras de Lagos se todos nos sentirmos irmãos e não concorrentes. E é neste clima de fraternidade e inter-ajuda que tem sentido esta estruturação de um serviço que na verdade já acontecia, mas agora ganha uma nova visibilidade e uma nova dinâmica”, sustentou.
Ao Folha do Domingo, o sacerdote contou que “a dinâmica que existia era um trabalho que o padre Almeida chamava muito a si”. “Não havia equipa de voluntários. Era ele, pessoalmente, a realizar esse trabalho. Ele fazia a angariação dos alimentos e era ele que estava na igreja de Santa Maria a atender pessoalmente cada pobre”, refere, salientando que existia pastoral sóciocaritativa, mas não estava organizada com exceção da que era feita na paróquia da Luz de Lagos. “O que se fez foi reconhecer que os dois párocos atuais não têm o carisma e a disponibilidade que o padre Almeida tinha e que era preciso uma reestruturação”, complementa.
O projeto contará com uma equipa coordenadora, constituída para além do pároco por Paula Centeno na coordenação dos serviços, Isabel Tavares na gestão de recursos, Ana Reis no combate à pobreza e Anita Leal no combate ao isolamento. Paula Centeno manifestou na inauguração o desejo antigo daquele espaço. “Há muito que desejávamos ter este projeto, mas não tínhamos instalações”.
Aquela responsável regozijou-se pela homenagem “muito merecida” prestada ao antigo pároco, que não pôde estar presente por questões de saúde, ter sido feita ainda em vida. “Quem conheceu o padre Almeida testemunhou que ele era a caridade em pessoa. Ele tinha a capacidade de acolher especialmente os que eram excluídos pela sociedade. Tinha uma capacidade de escutar impressionante e de nos sentirmos únicos naquela escuta. Era um mediador de conflitos e procurava que todos saíssemos em paz com o nosso coração”, testemunhou.
A ‘Casa Padre Almeida’ terá um horário de funcionamento, de segunda a sábado, das 11h às 13h e das 18h às 20h.
Folha do Domingo