O cónego Carlos de Aquino referiu no dia 15 de janeiro, na reflexão que apresentou ao clero das dioceses do sul de Portugal sobre o tema «Jubileu, Peregrinações e Indulgências», que estes dois e outros «grandes sinais» do Ano Santo «podem constituir oportunos desafios espirituais» a vida dos cristãos.
O sacerdote da Diocese do Algarve referiu-se à peregrinação como “símbolo e metáfora” do sentido da própria vida e da fé, acrescentando que “cada passo no caminho reflete um progresso espiritual: o desejo da busca de Deus”. “Pôr-se a caminho significa, na verdade, a busca do sentido da própria vida”, referiu, explicando que “peregrinar exige renovação e formação contínuas”.
O orador constatou que “geralmente o horizonte da peregrinação é a um santuário”, “lugar privilegiado de encontro com Deus”. “A peregrinação ao Santuário convida a reencontrarmos o sentido da vida, que é um dom belo e bom, constitui um espaço privilegiado de resposta às grandes questões que se colocam à consciência humana, sendo lugares de libertação do efémero e caduco, do que aflige e não raras vezes também destrói e mata”, referiu.
“O Santuário valoriza sempre a vida e a pessoa, a verdade de Deus que não é uma energia, um espírito, mas uma comunhão de pessoas trindade, revelado em Jesus, perante a sacralização de tantas energias cósmicas e espirituais, da pretensão das sinuosas correntes do espiritismo e de obscuras leituras astrológicas, que hoje pululam na nossa cultura desvalorizando a pessoa na sua identidade mais profunda, o sentido da própria vida, mentindo sobre a verdade de Deus”, acrescentou.
“Perante a cultura do pensamento frágil e fragmentário em que o sentimento se sobrepõe não raras vezes à verdade, num tempo onde ainda campeia muita cultura espiritual intimista e individualista, o Santuário e a peregrinação ao Santuário anunciam-nos uma cultura de verdade feita de respeito e acolhimento pela criação, a vida e a pessoa, a família, o povo, o dom de si, a caridade”, prosseguiu, acrescentando: “diante uma religiosidade tantas vezes assumida e vivenciada sem profundidade e autenticidade, onde se procura encontrar no imediato a solução para as crises e fragilidades numa espécie de supermercado religioso, numa cultura ainda marcadamente new age, o Santuário anuncia com audácia a Palavra que se fez carne e morre para que tenhamos vida em abundância”.
O orador concluiu assim que “o Santuário nunca promove a cultura sinuosa do consumo, a sacralização do self, a absolutização do individualismo, mas convida à capacidade de doação, à solidariedade e à fraternidade, a uma justa imagem sobre a pessoa”.
Por outro lado, realçou que “a peregrinação tem sempre um impulso evangelizador”. “A peregrinação conduz, para lá do encontro consigo mesmo e com Deus, à «tenda do encontro» com a humanidade”, sustentou, acrescentando que se pode considerar três dimensões da peregrinação: “reconhecer-se peregrino, caminhar com propósito e perseverar na fé”.
O orador disse que as peregrinações devem “ser caminho de esperança iluminado pela Palavra de Deus” e “constituir verdadeiros oásis de espiritualidade”. “Se as nossas peregrinações não conduzirem a este objetivo, será muito pouco”, advertiu.
O sacerdote enumerou ainda “alguns traços essenciais” que determinam a espiritualidade da peregrinação.
Referindo-se à “doutrina das indulgências”, lembrou que ela se apoia “na crença de que, mesmo após o perdão dos pecados, ainda pode haver uma necessidade de reparação ou purificação”. “Como depois duma intervenção cirúrgica necessitamos de medicamentos para restabelecimento e harmonia do corpo, assim o exercício espiritual das indulgências remove essa pena impressa pela dor do mal realizado, ensinando sobretudo como é triste e amargo abandonar e desobedecer ao Senhor”, comparou.
“Não se trata de «compra» da salvação, mas de remover das penas temporais do pecado já perdoado. É um convite para nos adentrarmos na união com Deus, refletindo sobre a necessidade de sincera reparação e renovação da vida. A indulgência lembra-nos de que, apesar dos nossos erros, somos chamados à santidade. É um símbolo tangível do amor infinito de Deus, que deseja nossa reconciliação e plenitude espiritual», clarificou, acrescentando que “refletir sobre as indulgências no Ano Jubilar oferece uma oportunidade de crescimento na fé e no entendimento do amor misericordioso e infinito de Deus”.
O sacerdote lembrou haver dois tipos de indulgências: plenária “que remove completamente toda a pena temporal devida pelo pecado” e a parcial “que remove apenas parte dessa pena”.
Disse ainda que as indulgências podem ser obtidas nas peregrinações e visitas a lugares sagrados, nas obras de misericórdia e penitência e que para obter uma indulgência, “existem alguns requisitos gerais”: “a confissão sacramental, a comunhão eucarística”, “a oração pelas intenções do Papa”, “atos de penitência ou boa ação”.
O sacerdote considerou que “a vivência das indulgências promove uma verdadeira conversão interior, motiva o fiel a refletir sobre os seus pecados, a sua fragilidade, mas também no seu chamamento à santidade”. “Convida a vivermos a penitência não apenas como ato individual, mas uma experiência eclesial e comunitária; fomenta a oração e a caridade; aprofunda a nossa relação com Deus e com a Igreja, incentiva a uma maior participação na vida sacramental e na comunhão dos santos”, completou.
Folha do Domingo