Por: Miguel Peres Santos – Mestre em Gestão Cultural pela Universidade do Algarve apdsmiguel@gmail.com – http://facebook.com/miguelapdsantos

Estamos num momento único, talvez ímpar na nossa História, todos tivemos de mudar as nossas rotinas, a nossa forma de viver, a nossa forma de estar e todos temos a obrigação de isolamento social. Entre muitas medidas tomadas para travar a pandemia do novo Coronavírus (COVID-19), uma das primeiras a ser a ser tomada foi obrigar a cultura a parar. Pelo país foram cancelados inúmeros espectáculos, festivais, além de uma diversidade de eventos relacionadas das mais variadas áreas.

A cultura está ao nosso lado a toda a hora e durante os dias de quarentena foram inúmeros os artistas que pelas redes sociais nos tem feito companhia de forma inovadora, pois cultura é a memória, a alma e identidade de um país e do mundo em que vivemos. Foi com o objectivo de divulgar os nossos artistas, que também precisarão muito do nosso apoio, sobretudo depois da pandemia passar, e podem ser apoiados de várias formas, seja indo aos seus espectáculos, ou seja, na aquisição dos seus trabalhos e dos seus serviços. Foi por isso que decidi divulgar regularmente alguns dos projectos e dos trabalhos que considero mais interessantes na música portuguesa, alguns deles, quase todos conhecem, mas muitos deles ainda são desconhecidos do grande público, espero que gostem.

SUGESTÕES DA SEMANA

(1) Emmy Curl, “OPorto” (2019)

O segundo álbum da compositora e intérprete transmontana, foi construído entre o Porto e Copenhaga (residência actual da artista), e é resultado de quatro anos de trabalho feito em nome próprio. Um disco com quinze canções, que apresentam uma dualidade entre a natureza e a tecnologia, o interior e a cidade. Ao ouvirmos este trabalho, encontramos um autêntico desenho da cidade do Porto aos olhos de Catarina Miranda, assim como, as suas vivências, os seus lugares, a sua arquitectura e as suas histórias.

Um elemento chave em todos os trabalhos de Emmy Curl, é a importância da natureza e das suas origens, que podemos verificar em “Lembrar Cura”, que é quase como que um hino ao seu refúgio encantado, ali mesmo à beira da Serra do Alvão e do Rio Corgo, onde rodeada do ar puro, do colorido das flores e do verdejante das montanhas, encontra a sua inspiração maior e onde tudo tem outro sabor, sendo o único sitio onde lhe é possível recarregar baterias.

É de destacar neste álbum, aquela que pode ser considerada uma instalação artística em formato musical, de seu nome “Undressed / Gesto das Palavras”, com a participação de Fabíola e Fábio Raposo. A única palavra para descrever os sete minutos desta “obra de arte”, é “soberbo”. Se todos conhecemos a voz doce de Catarina Miranda, juntem agora uma mistura de sons que nos levam para algo distante, onde a voz encantada de Fabíola, como que uma sereia que nos seduz para algo maior, nos leva para um sonho surreal.

A destacar ainda, canções como “Dança da Lua e do Sol” com a participação de Vicente Palma, ou City Of Choices” e “Ketp me in the Storm” onde a electrónica e a tecnologia voltam a estar presentes.

     (2) Capitão Fausto, “A Invenção do Dia Claro” (2019)

O quarto álbum de originais dos Capitão Fausto, foi considerado um dos melhores discos da música portuguesa editado em 2019. Ao ouvirmos e compararmos com os anteriores, verificamos uma banda que vai amadurecendo e se reinventando a cada novo trabalho.

As músicas simples com muito para dizer, são uma constante, desde as grandes baladas como “Amor, a Nossa Vida”, às músicas mais alegres e ritmadas em canções como “Boa Memória”, “Sempre Bem” ou “Faço as Vontades”, que revelam muito provavelmente a influência da viagem que a banda fez ao Brasil, antes da construção deste trabalho.

Ao mesmo tempo que cheira a Verão, as suas canções são perfeitas para combinar com aqueles dias de chuva dentro de casa, com letras que falam da banalidade dos nossos sentimentos e que demonstram que é possível falar de coisas tristes, simplesmente sorrindo. Em resumo, ao ouvirmos esta obra de arte musical, é possível afirmar que os Capitão Fausto vão deixando a sua marca na música nacional e vieram para ficar.

 (3) Capitães da Areia, “A Viagem dos Capitães da Areia a Bordo da Apolo 70” (2015)

Uma autêntica viagem espacial dividida em 31 faixas (sim leram bem, 31 faixas), é assim que podemos resumir o segundo álbum dos Capitães da Areia.

Ao longo do disco, vamos percebendo que diversão e humor não vão faltar, pois são tantas as peripécias e os encontros com grandes nomes da música portuguesa que vão surgindo no caminho dos Capitães Pedro, António, Tiago e Inês durante toda a sua viagem intergaláctica, que é impossível não contagiar todos os que o oiçam. Num trabalho marcado por algum psicadelismo e por uma certa retro-lectrónica, podemos ouvir canções como “A Filha do Rei”, “O Duelo de Reis”, “Arco das Portas do Mar” ou “No Tempo das Sereias”, que resulta numa pop bem-disposta que nos leva a dançar e sonhar.

 (4) Salvador Sobral, “Paris, Lisboa”

“Paris, Lisboa”, segundo álbum de originais de Salvador Sobral é nas palavras do intérprete um “disco de influências”.

Ao ouvirmos as canções deste disco, somos levados numa viagem sem partida, nem chegada, mesmo sabendo que os seus pontos de união fazem-se entre Paris e Lisboa, cidades de grande importância na construção deste disco.

Além do Português, ouvimos letras em espanhol, francês e inglês, que demonstra bem a liberdade artística do autor que sempre defendeu, que a língua não deve limitar o artista e a transmissão dos seus sentimentos através da música, sentimentos que se estão sempre muito presentes através da sua interpretação única e que tanto o caracteriza, e que neste disco não é excepção.

A destacar e obrigatório ouvir neste trabalho, as canções “Cerca del Mar”, “Benjamim”, ou “Anda estragar-me os planos”.

(5) Ornatos Violeta, “O Monstro Precisa de Amigos” (1999)

Quando falamos no disco “O Monstro Precisa de Amigos”, quase que se dispensa apresentações, sendo talvez um dos mais importantes e melhores álbuns do rock português de sempre.

Estávamos na viragem do milénio, e em Portugal todos falavam deste disco, era raro encontrar alguém que não conhecesse alguma das suas faixas, tendo marcando uma geração. É quase impossível arranjar adjectivos que possam descrever este trabalho, mas talvez “soberbo” seja aquele que é o mais indicado. Quando o ouvimos hoje (e já passaram mais de 20 anos), ele parece algo de novo ao mesmo tempo que se mantem igual, é aquilo que podemos resumidamente dizer que é um clássico.

Neste caso é impossível destacar alguma música do disco, pois é mesmo para ser ouvido por completo, mas também podemos dizer que ainda hoje não há quem não saiba de cor a letra de “Ouvi Dizer” e ainda ninguém esqueceu grandes canções como “Chaga” ou “Capitão Romance”.