Carlos Manso é Licenciado em Gestão de Empresas e Pós-Graduado em Gestão empresarial pela Faculdade de Economia da Universidade do Algarve. Atualmente é Presidente do Conselho de Administração da Infralobo. Nesta entrevista, fala-nos um pouco das diferenças entre o setor público e privado, a gestão da água e a seca, que mais uma vez está na ordem do dia.

A Voz do Algarve (V.A.) – O Carlos Manso nasceu no Algarve, é natural de Olhão, e estudou cá. Fale-nos um pouco das suas origens.

Carlos Manso (C.M.) - É isso mesmo. Tive a oportunidade de nascer neste local maravilhoso que é o Algarve. Foi em Olhão que cresci e dei os primeiros passos na área da gestão, posso dizer que fui Presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária, envolvi-me com a política na cidade e fui tesoureiro da Junta de Freguesia durante 14 anos. Depois, entrei na Universidade do Algarve, na Faculdade de Economia, no Curso de Gestão de Empresas. Sempre gostei muito de gerir e organizar coisas. Quando entrei na Universidade, uma das coisas que me preocupei em fazer, com amigos que ainda hoje tenho, foi criar uma Comissão Universitária de Valorização Profissional, que tinha como objetivo a organização de eventos semanais na Faculdade de Economia, onde tivemos a oportunidade de receber pessoas como o Miguel Frasquilho, que na altura trabalhava no BES e que chegou a Secretário de Estado e a Administrador da TAP, O Teixeira dos Santos, ex-Ministro das Finanças em Portugal ou o Edson Athayde, na área do marketing. Tive sempre envolvido nesta vertente de organizar e melhorar o meio ambiente onde estava.

Depois, tive a felicidade de entrar na auditória, fazia revisão de contas numa empresa regional, a Isabel Paiva Miguel Galvão & Associados, e tive o prazer de conhecer pessoas tecnicamente sólidas e conhecedoras daquilo que eram as realidades empresariais, contabilísticas e de fiscalidade do setor privado. Também me ensinaram muito a nível de profissionalismo e ética no trabalho, o que me permitiu crescer. Estive oito anos nessa empresa e depois, senti que faltava algo mais, apesar de ser feliz. Passei depois pela Visual Forma, com diretor financeiro, onde conheci um dos maiores empresários do Algarve, que é o Luís Ferrinho.

E posso acrescentar que sempre tive o particular gosto pelo setor da água, porque achei que era um setor a precisar de maior desenvolvimento. Temos de analisar as coisas no devido tempo e, naquela altura, eu já sentia que o setor iria ter um papel importante no futuro. Com o Eng. Aquilino Pereira, surgiu a oportunidade de vir para diretor financeiro da Infralobo e não hesitei. Paralelamente, passei na direção da ACASO – IPSS de Olhão, e desenvolvi projetos, como os cuidados continuados de curta, média e longa duração. Sempre tive a preocupação de intervir na sociedade.

Tenho gosto por futebol e karaté.

 

V.A. - Fale-me um pouco do seu percurso profissional na Infralobo.

C.M. - Comecei como Diretor Financeiro, depois tive a oportunidade de passar para Diretor Geral e só depois fui nomeado Presidente do Conselho de Administração.

 

V.A. - Como foi essa ascensão?

C.M. - Eu posso dizer que foi natural. Obviamente posso analisar mal esta questão, mas acho que faria sentido visto que entrei pela “porta” da área financeira, que era a minha área, e já tinha feito auditorias a empresas municipais do setor. Tendo oportunidade de entrar na Infralobo, comecei a envolver-me mais na operação e na gestão estratégica e, a partir daí, foi natural. Convém existir oportunidades de evolução para todos e isso acontece na Infralobo, até para que a empresa possa fazer um caminho sustentado daquilo que é a sua área de intervenção.

 

V.A. - Quando começou, vinha do setor privado. Quais as diferenças entre o público e o privado? A Infralobo é uma empresa público-privada.

C.M. - A primeira diferença que senti quando vim para a Infralobo, há treze anos, foi que o setor estava numa fase mais inicial, a nível de regulação e aquilo que são as grandes preocupações atuais (eficiência, sustentabilidade, alterações climáticas). Tudo isso é-nos hoje familiar, mas anteriormente parecia tudo muito distante. Por isso, a Infralobo é uma empresa diferente hoje em dia, com vontade de evoluir e dar o salto. Esta é uma empresa que tem conseguido competir com aquilo que se faz a nível nacional.

 

V.A. - A nível pessoal, o que o motiva a trabalhar na Infralobo?

C.M. - O que me motiva a trabalhar na Infralobo a nível pessoal é o facto de eu considerar esta uma área muito importante e este é um setor que, a longo prazo, ganhará ainda mais importância. Se eu gosto desta área e deste setor, é aqui que quero desenvolver o meu trabalho. A Infralobo é uma empresa que tem condições únicas para fazermos um excelente trabalho, presta serviços numa área de excelência do Algarve e do concelho de Loulé e é um gosto para mim e, certamente, para os meus colegas, dar o nosso contributo para que as pessoas que estão neste “cantinho” a viver ou passar férias, possam ser felizes.

 

V.A. - A Infralobo é uma parceria público-privada. Como é feita esta gestão? O que se poderia mudar?

C.M. - A Infralobo, sendo uma empresa municipal, muitas das vezes fala-se do nome Infra, mas este é apenas o nome, como existe por exemplo a Infraquinta, a Inframoura e a FAGAR que são empresas que, do ponto de vista jurídico, têm o mesmo enquadramento. São na sua base parcerias público-privadas, só que umas são parcerias público-privadas estritamente públicas, como é o caso da AmbiOlhão e da EMARP- Empresa Municipal de Águas e Resíduos de Portimão e depois temos parcerias público-privadas, em que um dos parceiros é privado, como é o caso da Infralobo.

Gostava de falar do modelo empresarial, onde temos de analisar o conceito de tempo. Há 20 anos ligava-se muito a questão empresarial aos privados e hoje fala-se muito da economia de Estado, em que uma empresa pode ser pública ou Municipal e pode ser eficiente. A diferença desta empresa é o relacionamento que temos, há uma parceria de acionista e temos de ver que uma grande parte das decisões que tomamos, estão dentro daquilo que são as orientações do setor, quer as orientações do ponto de vista político, como a descarbonização da empresa e a implementação de uma estratégia ligada às alterações climáticas. Isso já tem uma visão autárquica, porque o Vítor Aleixo é presidente da direção da Associação adapt.local – Rede de Municípios para a Adaptação Local às Alterações Climáticas e é esse o ritmo que é impresso na Infrablobo, porque se olharmos para a esfera empresarial privada ou pública, andamos em velocidades diferentes e o que nós notamos aqui, nas empresas Municipais, é que temos um equilíbrio entre aquilo que são as nossas obrigações do ponto de vista regulatório do setor e aquilo que são as visões estratégicas do ponto de vista político.

 

V.A. - No passado verão, deflagrou um incêndio, nas Gambelas, em Faro, que se alastrou até Vale do Lobo, entre outras áreas. O que se fez na altura? Atualmente que medidas foram tomadas para minimizar no futuro possíveis incêndios?

C.M. - Tivemos uma reunião com a Proteção Civil e uma série de identidades importantes e que poderão ter um papel importante nesta temática no futuro, como é o caso da Infralobo. Nessa reunião analisámos o incêndio que deflagrou nas Gambelas e se estendeu depois até Vale do Lobo, entre outras zonas, com o objetivo de encontrar mecanismos que minimizem o impacto negativo dos incêndios e tentar que estas entidades estejam melhor preparadas – não querendo dizer com isto que estavam mal preparadas, mas há sempre espaço para melhorar a nossa atuação. Já tivemos situações que foram identificadas e que vamos debater em futuras reuniões. Não querendo intrometer-me naquilo que são as competências dos outros, mas certamente no futuro estaremos melhor preparados na resposta que podemos dar na nossa área de intervenção.

Nós sabemos nas nossas áreas de intervenção quais são os pontos de risco e podemos neutraliza-los quando o perigo estiver lá perto. É importante ressalvar que a Infralobo quer ajudar na situação de viaturas e pessoas. Não estamos diretamente no combate ao incêndio, mas queremos assumir esse papel – destaco ainda que neste incêndio das Gambelas, muitas pessoas e funcionários se juntaram para ajudar. Podemos ainda realizar simulacros, para estarmos melhor preparados, mas do meu ponto de vista, demos uma resposta positiva a este acontecimento, que foi o incêndio que deflagrou nas Gambelas.

 

V.A. - A seca é uma grande preocupação na região do Algarve. Como está a ser gerida esta situação a médio e longo prazo? (futuro)

C.M. - É uma boa forma de colocar a questão, porque a seca não é um problema de agora. Parece que falar em seca, virou “moda”. O Algarve sempre teve período de seca, mas nós agora temos é um perigo preocupante, que vamos ter de olhar com atenção: a gestão da água nos períodos de seca e de escassez. Nós já passámos por algo parecido, em 2005, na altura da barragem de Odelouca. Se analisarmos os consumos de água, mesmo em termos de agricultura, aquilo que eram os consumos de água antes e depois da barragem, apesar da seca, a barragem permitiu alavancar o consumo de água e mesmo a qualidade de vida das pessoas com a sua construção. Agora, o setor deu um salto enorme desde 1993, com a criação do grupo das Águas de Portugal. Foram feitos investimentos avultados a nível de infraestruturas, que permitem que o país tenha 96% em termos médios de cobertura de água e cerca de 93% de saneamento. Contudo, tudo isto foi feito no passado. Temos de olhar para o que fizemos e pensar no que vamos fazer agora para que o problema não se agrave.

 

V.A. - É necessário “controlar” a agricultura, para que seja poupada mais água?

C.M. - Era importante ter um modelo na agricultura em que existisse um observatório que determinasse a quantidade de água que lá é consumida, que é retirada dos furos, onde é utilizada e porquê. E isto não é nada de extraordinário, nem nada contra ninguém. Simplesmente medimos para puder decidir. Nos nossos 9 furos legalizados, temos um sistema que, quando atingimos o limite de água que podemos retirar, ele emite alertas e a bomba deixa de funcionar.

Cada vez mais, estamos todos ligados. A escassez obriga a que o relacionamento com a água seja diferente. Tivemos aqui um evento, organizado pela AMAL, em que a RTA também participou, com investigadores noruegueses, em que eles estão a dar os primeiros passos da eficiência da água, com a colocação de contadores na casa das pessoas, porque eles têm muita água.

 

V.A. - Quanto à questão da água, que projetos têm para o futuro?

C.M. - Queremos fazer um tarifário bi-horário, tal como há na EDP, para podermos gerir os períodos em que os consumidores utilizam a água. Queremos ainda permitir a criação de uma aplicação para que os nossos clientes possam fazer a gestão dos seus sistemas de rega particulares com o nosso sistema de rega. Queremos disponibilizar essa facilidade e tornar os nossos clientes mais eficientes. 

Temos de perceber, primeiro, que o país anda a várias velocidades e que tudo está interligado. Temos os grandes centros urbanos junto ao litoral, em que a água não faturada tem valores muitos baixos, como o caso do Porto, Lisboa e das Infras. Contudo, é preciso perceber também que não é o Município que poupa água, nem as pessoas. Há quatro setores que é preciso avaliar em termos de consumos: cerca de 70% / 75% é da agricultura; 14% / 20% é do setor urbano (Municípios e consumo de casas); indústria com 7% / 10% e o Golfe com 4% / 6%. No setor urbano, onde a Infralobo opera, somos regulados pela ERSAR e temos, na água, no saneamento e nos resíduos, 14 indicadores em cada setor em que todos os anos temos de apresentar contas. E é aí que sabemos e, por isso, que falamos muito, das perdas na rede e na água não faturada, mas estamos a falar num setor que vale de 14% a 20% e que tem dados, que nós damos constante atenção.

 

Por: Nathalie Dias