O amor em quadras de inspiração popular e As vozes do coração. A salvaguarda do tesouro poético teve o seu ponto de partida em Joselina Barreto que, numa aula, surpreendeu o investigador da oralidade, José Ruivinho Brazão, ao apresentar um conjunto de textos cuja criatividade lhe prendeu a atenção: em Albufeira, durante vários anos, a sensibilidade de Joselina soube acolher os textos das mãos de Conceição Elói que, ao ritmo da produção, regularmente a procurava.
A apresentação dos dois livros, com recolha, reflexão e coordenação do professor J. Ruivinho Brazão, cabe a Luísa Monteiro, doutorada em Literaturas Comparadas, pós-doutoramento em "Fernando Pessoa e no texto dramático". Doutorada em Filosofia, Luísa Monteiro pertence aos centros de investigação CHAM (Universidade Nova); CIAC (UAlg) e PRÁXIS – Centro de Filosofia, Política e Cultura (Universidade de Évora/UBI) e cumula ainda pesquisas no âmbito da Etnografia e Genealogia.
Técnica Superior de Comunicação, possui várias obras publicadas e mais de meia centena de encenações. Lecionou 'Dramaturgia' e 'Estética Teatral' na Universidade de Évora e leciona atualmente 'História do Teatro', 'Teorias da Arte Teatral' e 'Teatro e Comunidade' na Escola Superior de Teatro e Cinema, em Lisboa (graus de licenciatura e mestrado).
Conceição Elói desenvolveu uma atividade literária muito dinâmica, expressando-se, durante cerca de 70 anos, sobretudo em quadras e em sonetos, e deixou para a prosa os contos e as crónicas. Não chegou a ver concretizado o sonho de um livro seu, mas Arménio Aleluia Martins, atento à vida cultural de Paderne, viria a dar-lhe cumprimento, ao publicar em livro simples e breve, mas muito rico em informação: Ecos da Minha Voz (Edigarbe, 1983), título em que respeita a vontade que algum dia escutara a Conceição Elói. Este viria a conceder a J. Ruivinho Brazão a liberdade de transcrever para a publicação em curso textos que, eventualmente, viessem a faltar-lhe na sua recolha.
Maria da Conceição de Sousa Elói nasce em Paderne a 31 de agosto 1898 e é, em 1921, com três outras raparigas, todas elas Marias (e com o pseudónimo de flores), uma das fundadoras do primeiro jornal (manuscrito) do povo de Paderne: A Avezinha. Sob o nome de Madressilva, empenha-se na vida quotidiana de Paderne e, apesar de se lhe não conhecerem namorados, dedica uma boa parte da sua obra à reflexão sobre os afetos humanos. Salientou-se em jogos florais, chegando a ser considerada uma das vozes mais interessantes da poesia popular da região.
Tendo em conta a extensão e a qualidade da obra poética, J. Ruivinho Brazão decidiu reuni-la em dois volumes: no primeiro, as quadras; no segundo, os sonetos. Assim, no prefácio da primeira obra, o investigador classifica a poesia de Conceição Elói como de “inspiração popular”, reconhecendo-lhe “uma altura que excede, em toda a dimensão, a vulgar poesia que aparece dizendo-se de popular”. Salienta o professor que, “numa visão superior do mistério do amor, a poeta defende que no amor e no serviço que prestamos é que se decide a verdadeira estatura da pessoa”. O texto poético de Elói “inspira-se, efetivamente, na tradição popular, surge de uma finíssima criatividade de imagem e prende-nos, a todo o momento, com expressões de bom humor e humor crítico bem português.”
O professor releva que o surpreenderam a mesma voz e a mesma sensibilidade no cancioneiro popular tradicional, recolhido em Paderne e Boliqueime, e “na naturalidade e a arte com que a poeta insere os provérbios no seu texto, ao jeito que o próprio só achou nos trovadores da literatura portuguesa nascente, aquando da sua investigação paremiológica. E conclui que “O paremiológico e o poético de tal maneira se harmonizam no texto poético de Elói e, em particular, nas quadras, que, na extrema fluência e na hábil inserção dos enunciados proverbiais, por pouco, escapa ao leitor menos atento o intertexto. O investigador da oralidade identificou só nas quadras de Conceição Elói mais de cem enunciados proverbiais. Assim se casam poesia e provérbio”, acentua.
A APEOralidade conta com o apoio da Câmara Municipal de Albufeira e da Junta de Freguesia de Paderne.