O primeiro encontro foi como um bolso de rebuçados. Ela devia ter mais um ano do que Orlando e vinha de um mundo de arranjo e delicadeza, num vestido de golinha, apertado por um cinto do mesmo tecido. Os cabelos, oh, os cabelos caíam penteados, lisos, a terminar numa volta, sobre os ombros. Os olhos seriam castanhos como os cabelos? Eram suaves e sorriam. E a graça e simpatia que irradiava deslumbraram-no toda a tarde.
Ninguém faz planos para se apaixonar, muito menos um menino de sete ou oito anos. Nas suas orações antes de adormecer, passou a interceder por aquela criatura doce e bela. O máximo de harmonia vislumbrava-o numa atualização da estampa pendurada por cima da sua cama: ambos de mão dada na travessia de uma ponte frágil sobre um rio caudaloso, mas protegidos por um anjo-da-guarda.
Por aqueles dias, Orlando recebeu uns quatro ou cinco rebuçados. Logo decidiu que um seria para lhe oferecer, como prova de bem-querer. Por uma lamentável desatenção das forças celestes, porém, Delfina adoeceu. Orlando, de rebuçado no bolso, não encontrou a estremecida do seu coração nos dois dias seguintes.
No terceiro dia, no regresso à escola, tão alheado ia que, automaticamente, fez o que não queria: desembrulhou o rebuçado e meteu-o na boca. Chegou a sentir-lhe o doce. Espantado, desagradado consigo próprio, retirou-o da boca, como blasfémia. O rebuçado era para ela, estava prometido em intenção.
Resolveu entrar na venda do pai de Delfina e confiar-lhe o rebuçado para que ele lho entregasse. Ganhou coragem e entrou, mas a venda estava vazia. Deixou o rebuçado, embrulhado e um pouco agarrado ao papel, em cima do balcão de mármore e saiu. Cumprira a promessa, tanto quanto conseguira.
Quando voltou a vê-la, já tinha passado uma semana ou duas e o enamoramento, por falta de alimento, murchara. Era o tempo dos rebuçados e dos berlindes. O que parecia importante num dia esquecia-se alegremente no dia seguinte. O futuro é que traria a compreensão do valor de cada coisa. Talvez.